Cinco Graças: extremismo religioso e a opressão sofrida pelas mulheres

Cinco Graças: extremismo religioso e a opressão sofrida pelas mulheres

Cinco Graças (Mustang) foi lançado em janeiro deste ano e concorreu na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar, contudo, acabou perdendo para o filme húngaro “O Filho de Saul”. Dirigido pela turca Deniz Gamze Ergüven, o longa é uma parceria entre França e Turquia. O filme retrata a história de cinco irmãs órfãs: Sonay, Selma, Ece, Nur e Lale, que moram em um em vilarejo distante de Istambul (a maior cidade da Turquia) junto com a avó, pois seus pais sofreram um acidente e faleceram.

Cinco Graças começa mostrando elas comemorando o início das férias com alguns garotos na praia, uma atitude que para o ambiente que elas vivem pode ser considerado um desrespeito ou uma conduta inapropriada para mulheres. O acontecido chega aos ouvidos da avó, que é criticada por todos no vilarejo por dar muita liberdade às netas, e assim que as meninas chegam em casa são castigadas pela avó, uma a uma.

Quando descobrem que foi  uma vizinha quem contou tudo de forma deturpada e resolvem tirar satisfação com ela, causam a avó um grande constrangimento. Sem saber como controlar as netas, a avó resolve trazer o tio Erol para ajudar e a partir daí começam os problemas para as cinco jovens. A história é contada sob o ponto de vista de Lale, a irmã mais nova.

Cinco Graças
Lale

A partir da chegada do tio Erol é tirado delas acesso à computadores, celulares, entre outras coisas e costumes conservadores começam a ser impostos às cinco jovens para que aprendam a ser boas esposas: ensinam as meninas a fazer comida, limpar a casa, costura, passam a usar vestidos longos, com mangas longas e sem decotes para que não exponham seus corpos. As meninas vivem presas em casa, tirando alguns momentos que elas conseguem escapar pela janela.

Cinco Graças

Em certo momento do filme, a situação fica ainda mais extrema. O tio Erol resolve gradear todas as janelas da casa e colocar grades nos muros para que as meninas não consigam fugir, além de começar a busca por maridos para cada uma. Todas são muito jovens, mas devem se submeter ao casamento arranjado. Essa não é uma realidade só do oriente médio ou países asiáticos, mas em muitos países ocidentais, inclusive no Brasil.

Cinco Graças mostra que existem casos em que esse tipo de casamento pode até dar certo – como com Sonay, por exemplo -, mas em sua maioria vemos as consequências negativas que isso pode causar; já que estão casando por obrigação com um homem que não conhecem, somente porque convém às famílias.

Cinco Graças

Durante o filme vemos como esse extremismo religioso mesclado na cultura vai minando a natureza alegre, livre e por vezes ingênua das meninas. Elas são jovens e estão descobrindo o mundo, seus corpos, lidando com sentimentos como amor, desejo, sexualidade, ou seja, situações que qualquer menina ou menino da idade delas lida nesse período. Elas tentam buscar algo que as distancie um pouco desse mundo opressor que lhes foi imposto e muito disso vem de atitudes de Lale.

Cinco Graças é um filme delicado. Sentimos pena, raiva e angústia enquanto assistimos. Foi muito bem pensado a narrativa do filme ser levada sob o ponto de vista da Lale (Güneş Şensoy), pois, apesar da força que a personagem tem, ela possui a ingenuidade de uma criança que não entende bem, no começo, a proporção daquela situação vivida por elas. Contudo, aos poucos ela compreende como são as coisas e nota que o mesmo acontecerá com ela, se não lutar para que a sua vida seja diferente.

Cinco Graças

O mundo ainda é extremamente hostil com as mulheres. Em alguns pontos do globo, essa hostilidade é elevada à uma escala absurda. Machismo, extremismo religioso, ignorância são fatores que ainda determinam a falta de igualdade entre os gêneros. Mulheres ainda são tratadas como inferiores, que devem apenas servir aos homens e satisfazê-los. Além de terem que agradecer por um “bom marido”, são cobradas pelo “dever” da maternidade, da obrigatoriedade da gestação de crianças. É uma realidade triste e muito presente, em pleno século XXI. Cinco Graças mostra um pouco disso. Claro, não podemos generalizar a religião muçulmana, como muitos fazem, porque o filme retrata o lado extremo dela. Assim como qualquer religião, existem dois lados, e o filme nos faz pensar  no quanto as mulheres ainda precisam lutar para que possam ter direitos iguais perante os homens.

Não podemos deixar de destacar a primorosa direção de Deniz Gamze Ergüven e o elenco incrível. Todas a meninas são muito talentosas e têm uma química incrível nas cenas. Güneş Şensoy, a Lale, é uma grata surpresa e esperamos vê-la em mais filmes futuramente.

Escrito por:

Formada em Rádio e TV, maratonista e viciada em séries, eterna amante de um bom filme, escreve desde quando só conseguia usar desenhos para contar suas histórias, apaixonada por “Titanic” e uma quase bailarina que aprendeu muita coreografia em clipe da MTV. Sonha em morar no Canadá, escrever um livro, ter filhos, ser doula e conseguir colocar suas séries em dia.
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