League of Legends: a manutenção dos estereótipos de gênero nos jogos eletrônicos

League of Legends: a manutenção dos estereótipos de gênero nos jogos eletrônicos

Lançado em 2009, League of Legends ou LOL é um dos jogos eletrônicos mais populares e de fácil acesso em diversos países, contando com cerca de 100 milhões ativos mensalmente no mundo todo, segundo a empresa Riot Games, responsável pelo jogo. Misturando a velocidade e intensidade de um RTS (estratégia em tempo real) com elementos de RPG, o game coloca duas equipes com poderosos campeões em disputa por diferentes campos de batalha e modos de jogo.

Contando com um elenco de campeões em frequente expansão, League of Legends é certamente um dos jogos online atuais que mais produz conteúdos adicionais para expandir a história e jogabilidade. O agitado cenário competitivo também é responsável por fomentar a popularidade e as constantes atualizações pelas quais o game passa.

Ainda que a Riot Games tenha uma proposta de desafiar as convenções e focar as melhorias no game com base nas experiências de seus usuários, percebe-se que a maior variabilidade em termos de personagens, especificamente as femininas, começaram a acontecer apenas mais recentemente. Até 2014, a maneira como a empresa retratou a feminilidade esteve frequentemente associada a formas tradicionais de representação da figura feminina.

Com base no artigo ‘’Um Estudo em Representações Gráficas nos Jogos Eletrônicos na Perspectiva de Gênero’’: Os Tipos de Feminilidade em League of Legends, de Letícia Rodrigues e Marinês Ribeiro dos Santos, personagens podem ser compreendidos como uma corporalização digital da pessoa que interage com grande parte dos jogos contemporâneos, representando, portanto, as pessoas que jogam e tornam possível a materialização das fantasias por meio do ato de jogar. Noutra perspectiva, permitem uma liberação de certos valores e conceitos morais que regulam a vida social.

A multiplicidades de narrativas, bem como os diversos contextos trazidos pelos jogos deveriam resultar em inúmeras possibilidades de personagens diferentes, tanto em aspectos psicológicos como físicos. No entanto, é justamente nesse ponto que se encontra um dos principais problemas presentes nos jogos atuais: a ausência de representatividade, seja ela feminina, LGBT ou étnico racial.

Tomando como parâmetro os 117 personagens de League of Legends lançados até janeiro de 2014, percebe-se que a grande maioria são homens. Das 40 personagens identificadas como femininas, 65% apresentava algum grau de nudez ou roupas extremamente justas. Não é possível observar padrões semelhantes com relação aos personagens masculinos, isto é, esse mesmo fato não ocorre na mesma proporção quando se comparam campeãs e campeões.

Essa perspectiva remete a uma ideia de representação da mulher como ‘’panorama’’ proposta por John Berger, na qual a figura feminina é constantemente representada de maneira a tornar-se aprazível a interlocutores específicos, favorecendo um tipo de olhar masculino e heterossexual. Além disso, segundo dados divulgados pela Riot Games em 2012, menos de 10% dos jogadores de LOL seriam mulheres, informação que permanece desatualizada.

Esse fato sugere a reflexão acerca de uma problemática recorrente quando o assunto é indústria de jogos, a realidade de que a grande maioria dos games produzidos são pensados, em sua grande maioria, para o público masculino e heterossexual.

Isso aparece, principalmente, no modo como as campeãs são vendidas ao público: colocadas em determinadas poses no intuito de destacar seus seios e glúteos. Por vezes, são também ilustradas de maneira sinuosa, tendo suas cinturas diminuídas e suas curvas ressaltadas.

Esse tipo de escolhas de poses diferenciadas quando se tratam de personagens mulheres, contribui muito para sexualizar suas figuras, isto é, as tornam objetos sexuais do olhar alheio. Outro ponto a ser destacado é o fato de que a grande maioria das campeãs de League of Legends são humanas, contrapondo-se a variedade de quase 50% nos personagens masculinos.

A partir desse ponto, nota-se a existência de uma maior liberdade nos processos criativos de campeões do que campeãs, possivelmente decorrente da preocupação em criar personagens femininas atraentes. Observa-se também a distinção étnico racial, uma vez que as personagens são majoritariamente brancas e pouquíssimo também se fala sobre as possíveis relações LGBT que envolvem os campeões.

Felizmente, LOL é um game em constante evolução e que sofre atualizações frequentes nos servidores. Após 2014, novos personagens e melhorias surgiram para amenizar essa problemática. Personagens fora dos padrões como Illaoi e Taliyah foram lançadas, contrariando a lógica vigente no desenvolvimento das heroínas até então. Algumas artes referentes à campeãs foram redesenhadas e republicadas em novas versões.

Outras representações, como Kalista e Rek’sai, surgiram para romper com esse regime de representação subordinado ao olhar masculino, permitindo uma leitura diferente da feminilidade, dissociada da objetificação.

No entanto, é preciso reconhecer que essa linha de representação configura-se como uma ruptura recente, decorrente de discussões e problemáticas realizadas pelos movimentos feministas ao longo desses últimos anos.

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Essas formas de representar o feminino não só reforçam estereótipos de gênero como também incentivam pedagogias acerca de quais posições de sujeito as mulheres envolvidas com a comunidade como um todo assumem. A ausência de representatividade dificulta o desenvolvimento de um vínculo da jogadora com o jogo, pelo próprio fato de que, se não há identificação com o produto cultural, ele dificilmente será adquirido.

A indústria de jogos só será capaz de atrair públicos mais heterogêneos e abrangentes caso invista na diversificação de personagens, isto é, caso passe a criar caracteres ficcionais mais próximos dos reais.

Uma maneira de melhorar esse panorama é abrir oportunidades para que mulheres estejam cada vez mais presentes no desenvolvimento de jogos, como faz o projeto Girls Make Games.  Essa discussão se faz presente também para os grupos minoritários já mencionados, as comunidades LGBT e negra.  

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Hardcore gamer, punk e antissocial. Fã de RPG's de fantasia, ficção científica e quadrinhos independentes. Passa as horas vagas e as não vagas com seus consoles e PC.
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