Persépolis: mulheres iranianas e resistentes ao fundamentalismo islâmico

Persépolis: mulheres iranianas e resistentes ao fundamentalismo islâmico

A obra Persépolis, publicada em 2010 pela editora Companhia das Letras, de autoria da escritora e ilustradora iraniana Marjane Satrapi, é uma narrativa autobiográfica, escrita em quadrinhos que discorre sobre a trajetória de Marjane desde a infância até os primeiros anos da vida adulta, lançando luz sobre o cenário político, religioso e de opressão a que o povo iraniano está submetido a partir da implantação do regime xiita. Persépolis é a primeira obra iraniana, com um viés histórico e politizado acerca do Irã, feita em quadrinhos.

Com traços singelos e em preto e branco, Marjane descreve com riqueza semiótica a história de opressão que os habitantes da antiga Pérsia (decorre daí o título da obra) deparam-se cotidianamente, sendo as mulheres o alvo principal de um regime patriarcal e fundamentalista. O primeiro capítulo versa sobre o uso obrigatório do véu. Marjane contava apenas dez anos quando, repentinamente, se viu coagida a usá-lo.

Persépolis

Oriunda de uma família de ideias progressistas, com antecedentes de militância política em defesa de direitos civis e políticos de minorias sociais, a pequena que estudava em uma escola de origem francesa e laica, passou, de forma impositiva, a trajar o véu.

Em 1979, ocorreu e Revolução Islâmica e no ano seguinte o véu tornou-se obrigatório nas escolas. “A gente não gostava muito de usar o véu, principalmente porque não entendia o motivo”, explicou a autora, bem como a garotinha que já apresentava um pensamento crítico avançado se comparado às crianças de sua idade, problematizava o porquê de meninas não mais poderem frequentar as mesmas escolas que meninos, separando-se abruptamente de seus amiguinhos. Era um dos prenúncios da imposição cultural e repressão de direitos humanos essenciais como a liberdade e diversidade de pensamento, que começava a dar seus primeiros sinais.

Sob o olhar de uma criança, a autora conseguiu retratar os tempos obscuros de fanatismo religioso, perseguições e massacres com uma peculiar leveza. Marjane era uma garotinha de muita leitura, que sonhava em ser profeta, fantasiava diálogos com Deus e Karl Marx e já participava de manifestações políticas nas ruas.

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A situação no Irã com o passar dos anos agravou-se, o país estava em guerra e permanecer por lá tornou-se muito arriscado, os vizinhos de Marjane tinham acabado de ser mortos em razão da explosão de um míssil, ocasião em que os seus pais vislumbraram como única solução enviá-la aos 14 anos de idade para morar na Áustria. Foram momentos difíceis para Marjane que teve de se adaptar à cultura ocidental e foi levada a amadurecer precocemente em face da responsabilidade de viver sozinha, desprovida da proteção e apoio familiar.

Em muitas situações, Marjane sofreu preconceito de gênero ou esteve na iminência de sofrer sanções físicas pelo simples fato de ter uma consciência emancipada, sentindo-se estrangeira no seu próprio país ou sendo incompreendida e vítima de xenofobia no exterior. Em um dos capítulos, Marjane fora flagrada pelas guardiãs da revolução (nome recebido pelas mulheres que prendiam e fiscalizavam outras mulheres nas ruas que não vestiam adequadamente o véu), usando jaqueta e sapatos ocidentais.

Persépolis

Por fim, além do papel de desconstruir estereótipos por parte da sociedade ocidental com relação à cultura e costumes iranianos, Persépolis desvela o protagonismo das iranianas, que ao contrário do arquétipo de mulher a que comumente somos levados a supor quando pensamos o perfil de mulher onde predomina o Islã, a mulher iraniana não necessariamente é submissa e conservadora, podendo ser aguerrida, politizada e lutar cotidianamente para libertar-se das correntes do patriarcado e fundamentalismo islâmico.

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Sobre a autora

Persépolis

Marjane Satrapi é uma romancista gráfica, ilustradora, cineasta e escritora iraniana. A adaptação animada de sua série de quadrinhos Persépolis, que ela co-dirigiu junto a Vincent Paronnaud, foi indicada para o Oscar.

Confira abaixo o trailer do longa Persépolis:


PersépolisPersépolis

Autora e ilustradora: Marjane Satrapi

Quadrinhos na Cia.

352 páginas

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Escrito por:

18 Textos

Jornalista, pós-graduada em Comunicação, Semiótica e Linguagens Visuais, estudante de Direito, militante femimista, autora do livro A Árvore dos Frutos Proibidos, desenhista, cinéfila e eterna aprendiz na busca do aprender a ser.
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