[MOSTRA SP] Balanço do Dia: Esplendor, O Dia Depois, Visages Villages e A Ex-Mulher

[MOSTRA SP] Balanço do Dia: Esplendor, O Dia Depois, Visages Villages e A Ex-Mulher

O Balanço do Dia do Delirium Nerd na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo conta com filme das consagradas diretoras Naomi Kawase e Agnès Varda, da diretora sueca estreante Katja Wik e do aclamado diretor sul coreano Hong Sang-Soo.

Balanço do Dia
Esplendor, de Naomi Kawase

Misako é uma jovem que trabalha escrevendo textos que são lidos nas audiodescrições de filmes para deficientes visuais. Com um roteiro extremamente delicado e singelo a diretora japonesa Naomi Kawase imprime na tela algumas das sensações das pessoas que precisam lançar mão de outros sentidos para fruir aquilo que é sua maior paixão: o cinema. A câmera se desloca bem próxima aos personagens fazendo com que o quadro esteja quase sempre bastante fechado tentando expressar, através da linguagem cinematográfica, uma experiência sensorial que, de alguma forma, se aproxime ao de seus personagens.

O trabalho de som é bastante interessante, uma vez que cada detalhe é tão audível quanto visível. Dentro do grupo de deficientes visuais que auxiliam o trabalho de Misako, está o rancoroso fotógrafo Nakamori. Uma estranha relação se inicia entre eles, na medida em que novos desafios começam a surgir na carreira de Misako. Vencedor do Prêmio do Júri Ecumênico no Festival de Cannes, Esplendor (Hikari, no original) mostra que nem tudo que é visto pode ser expresso em palavras, assim como nem tudo que é dito pode ser sentido em sua plenitude.

Balanço do Dia
O Dia Depois, de Hong Sang-Soo

O Dia Depois (Geu-hu, no original) aborda de forma interessante e sempre usando da ironia, que é marca registrada do diretor sul coreano Hong Sang-Soo, a relação de assedio no ambiente de trabalho. Com tempos que se sobrepõem na montagem e se deslocam de forma a confundir os personagens, o diretor traça um retrato interessante do ponto de vista de três vértices de uma relação bastante comum nas sociedades patriarcais e, portanto, verticalizadas: o chefe, a empregada/amante e a esposa do chefe. O elemento desestabilizador virá da personagem Areum (interpretada pela ótima Kim Min-hee) que, no seu primeiro dia de trabalho, é confundida pela esposa do chefe com a sua amante/empregada.

Com um roteiro afinadíssimo e uma câmera que flana na mesma medida em que os personagens flertam, Sang-Soo elabora a teia em que a hierarquia opressora do único homem em cena consegue imprimir. Em tempos de inúmeras denúncias de abusos sexuais e assédios na indústria do cinema, O Dia Depois não poderia ter melhor momento de lançamento. Ao lado de A Câmera de Claire e Na Praia à Noite Sozinha, o diretor lança uma trilogia inspirada na sua relação com a atriz Kim Min-hee, presente nas três obras.

Balanço do Dia
Visages, Villages, de Agnès Varda e JR

Visages, Villages (idem, no original) é o novo filme dirigido por Agnès Varda em parceria com o fotógrafo JR. Varda além de cineasta é também artista plástica e fotógrafa e neste trabalho experimenta a linguagem popular das fotografias instantâneas para imprimir nos muros e elementos arquitetônicos de vilas por onde passa, rostos das pessoas que de alguma forma refletem a memória daqueles lugarejos. Neste road movie documental, captura momentos que remetem, inclusive, a sua obra e trajetória dentro da cinematografia francesa.

O curioso episódio do filme que envolve o cineasta francês Jean-Luc Godard traz a baila a forma como o cinema (e as artes de um modo geral) vai apagando as mulheres da sua historiografia. Como não poderia deixar de ser, Varda consegue dar um jeito de, dentro de um documentário que aborda a produção de imagens partindo da memória, levantar temas caros ao feminismo como o silenciamento e a desvalorização do trabalho de mulheres. O filme foi o vencedor do Olho de Ouro de melhor documentário no Festival de Cannes.

Balanço do Dia
A Ex-Mulher, de Katja Wik

O longa-metragem de estreia da sueca Katja Wik traça uma sátira de 3 momentos de relacionamentos heterossexuais. Cada uma destas etapas é vivida por uma atriz diferente, com idades diferentes. Tem-se o frescor da paixão de um casal de recém-namorados. Uma crise de relacionamento em que um jovem casal está fora de sintonia tentando se reaproximar ao mesmo tempo em que precisa dar conta das tarefas que envolvem a rotina cotidiana e a lida com filhos pequenos. E uma mulher de meia idade que não consegue se adaptar à condição de ex-esposa. Todo o ponto de vista é destas três mulheres que não se conhecem, mas que têm muito em comum.

O roteiro e os ótimos diálogos são o ponto alto do filme, que surpreende por não pretender dar nenhuma solução às questões apresentadas, mas simplesmente fazer retratos destas que, na verdade, são todas ex-mulheres (daí o título), uma vez que acabam se deixando de lado para colocar os parceiros em primeiro plano. A Ex-mulher (Exfrun, no original) está na competição de novos diretores da 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Para ver os horários de exibição dos filmes, acesse o site da Mostra.

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Aquariana, mora no Rio de Janeiro, graduada em Ciências Sociais e em Direito, com mestrado em Sociologia e Antropologia pelo PPGSA/UFRJ, curadora do Cineclube Delas, colaboradora do Podcast Feito por Elas, integrante da #partidA e das Elviras - Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema. Obcecada por filmes e livros, ainda consegue ver séries de TV e peças teatrais nas horas vagas.
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