CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 2×05: Seeds

CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 2×05: Seeds

Minha culpa, minha culpa, minha culpa“. Com essa repetição, chegou ao fim o quarto episódio de The Handmaid’s Tale. Nele, uma Offred recém “resgatada” passa pelo processo de convencimento de que talvez não haja uma fuga. Resignada, ela enfrenta as culpas de ter algo que não lhe pertence. Mas será que ela perdeu todas as esperanças de fato?

Seeds, o quinto episódio da 2ª temporada, remete à união pelo casamento. Refere-se às sementes plantadas através do ritual – o que se poderá colher de uma relação, e analisa a instituição dentro do sistema de Gilead. Também aborda a forma como as pessoas se unem do lado de fora, mesmo quando escravizadas. O episódio fala das sementes que carregamos, aquelas que podem gerar frutos, ou que podem não vingar.

Leia as resenhas anteriores:
>> [SÉRIES] The Handmaid’s Tale – 2ª temporada: Primeiras impressões
>> [SÉRIES] The Handmaid’s Tale – 2×03: Baggage
>> [SÉRIES] The Handmaid’s Tale – 2×04: Other Women

Isolar para dominar

O bebê de Offred (Elisabeth Moss) continua a determinar seus dias. O caos do debate de quem é a mãe daquela criança já não está mais instaurado, embora a questão ainda esteja presente. E a gravidez permanece sob observação. Afinal, o filho de um comandante precisa crescer saudável para responder às expectativas.

Crescer saudável, no entanto, demanda que o ambiente seja o adequado. O adequado, por óbvio, não é definido pela gestante, mas por aqueles que pretendem possuir seu corpo. E se um motorista pode significar mais algum contratempo na dominação sobre uma aia, ele precisa ser enviado para longe.

A relação entre Offred e Nick (Max Minghella) há muito não passa despercebida. Tanto o comandante Fred Waterford (Joseph Fiennes) quanto sua esposa Serena Joy (Yvonne Strahovski) notam os olhares e as conversas entre seus dois subordinados. Contudo, optam por não interferir desde que seus interesses sejam mantidos. Isto é, que Offred conceda um filho a eles.

O pensamento de que Offred possa ter aliados, ou mais, que desfrute de algo minimamente próximo de sentimentos, por si coloca em risco a dominação sobre ela. Quanto mais isolada, mais sozinha, mais resignada, mais obediente ela será. E, para tanto, é preciso enviar Nick para longe. A ausência de sentimentos é aliada da alienação.

Offred

Meninas coagidas ao casamento

Assim, surge uma inesperada promoção ao motorista, de um trabalho em Washington. Com a promoção, Nick também recebe uma econoesposa. É interessante que a série finalmente tenha inserido a lógica de matrimônio em Gilead, abordada no livro em tempo anterior ao equivalente ao término da primeira temporada. E o interessante está no ponto de revelar como meninas ainda muito novas são preparadas para serem entregues a maridos desconhecidos.

Nick se assusta ao se deparar com a jovialidade de sua noiva, uma menina de apenas 15 anos chamada Eden (Sydney Sweeney). Ela representa o espaço concedido a esse homem para plantar seu jardim, isto é, começar seus projetos dentro do regime. Nick, contudo, não encara com indiferença essa situação. O desconforto é visível em sua face.

Offred

O prazer como amenização de uma dor maior

E é surpreendente que o desconforto não seja tão visível na face da noiva. O medo está lá, mas é mascarado pela doutrina recebida. Aquela menina não foi ensinada de que poderia viver algo diferente. Ela apenas foi ensinada a aceitar seu marido, deitar-se com ele independentemente de seus desejos.

Serena Joy demonstra um pouco de empatia ao tentar lhe dizer que mulheres também podem sentir prazer. A sociedade ensina que a luxúria é um pecado, como se a dor fosse parte essencial do ato sexual para as mulheres. Simultaneamente, prega a obrigação de autorizar o ato conforme os desejos masculinos. Mas as mulheres não precisam sentir dor. Mulheres podem aproveitar tanto quanto homens. Não é que seja uma situação ideal, uma vez que a jovem não teve liberdade de escolher seu parceiro. Mas a intenção de Serena Joy é compreensível. Ela não deseja que aquela menina sofra ainda mais com a realidade brutal. Só não se pode dizer que sentir prazer por estímulos físicos num ato sexual sem liberdade de escolha anule toda a dor de passar por essa experiência. Continua sendo uma violência, deixando marcas mais ocultas.

Offred

Uma vida dentro do inferno

Enquanto isso, outro casamento ocorre nas colônias. Uma celebração inesperada e também perigosa. Janine (Madeline Brewer) encontra com Emily (Alexis Bledel) no sofrimento do trabalho forçado nas colônias. É o inferno, segundo Emily, para a qual a escravidão é impedimento de vivenciar quaisquer outros sentimentos. Para Janine e outras mulheres, contudo, os outros sentimentos são a única forma de sobreviver em um lugar de opressão.

Assim, quando Janine vê que duas mulheres, mesmo diante da violência de Gilead, se apaixonaram e criaram laços, ela sugere a celebração de um casamento. Uma das mulheres encontra-se à beira da morte. E a celebração é, para Janine, uma forma de dar um pouco de alegria a uma pessoa que perece por um sistema. Emily não aprova, pois a união é uma afronta a tudo o que Gilead prega. Desse modo, promover aquilo é colocar em risco todas as mulheres ali presentes. O ato de celebrar é por si uma revolta. Mas Janine não se ressente. Ela precisa viver mesmo quando não a deixam viver.

Offred

Quando viver é uma luta e uma afronta

O final não apresenta cenas de violência, é tocante de uma forma sutil. Dentro de Gilead, Offred quase sofre um aborto. Durante um tempo, ela sofre calada. Talvez tenha medo das consequências, uma vez que somente não foi punida pela gravidez. Talvez até mesmo deseje. Mas, como ela fala, aquele ser é forte. Ele sobrevive aos infortúnios, à violência, à dor dela, ao mundo.

Fora de GiIead, nas colônias, Janine enterra uma companheira. Mais do que isso, enterra mais uma mulher. E ao longo da cena, uma paisagem marcada por inúmeras cruzes. É a imensidão de mulheres assassinadas pela violência de uma sociedade. São inúmeras mulheres mortas porque ousaram viver.

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Mestra em Teoria e História do Direito e redatora de conteúdo jurídico. Escritora de gaveta. Feminista. Sarcástica por natureza. Crítica por educação. Amante de livros, filmes, séries e tudo o que possa ser convertido em uma grande análise e reflexão.
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