Tiger Lily: amadurecimento e força feminina na obra de Jodi Lynn Anderson

Tiger Lily: amadurecimento e força feminina na obra de Jodi Lynn Anderson

A história de Peter Pan, criada por J. M. Barrie, cheia de magia e aventuras, apresenta inúmeros personagens fascinantes que lutam contra o mal e sintetizam as inseguranças que todo ser humano carrega ao caminhar ao encontro do envelhecimento. Peter, Wendy e Os Meninos Perdidos dão asas à imaginação e introduzem a leitora ou espectadora das adaptações filmográficas à Terra do Nunca – e é lá que sereias, fadas e indígenas vivem. Os Comedores de Céu são uma tribo, da qual Tiger Lily, uma indiazinha muito destemida, faz parte, e é sobre ela que a autora norte-americana Jodi Lynn Anderson escreve no romance young adult Tiger Lily. A personagem, que existe na obra de Barrie, mas acaba sendo invisibilizada por conta dos personagens principais, aqui ganha destaque e é trabalhada de forma que a força dela própria, menina indígena, é celebrada.

Tiger Lily é a protagonista cheia de vida da obra de mesmo nome. Muito ativa em sua tribo, ela enfrenta inúmeras aventuras e é muito respeitada por todos. Tiger Lily nunca havia abalado-se perante um acontecimento, até que um navio naufraga na ilha da Terra do Nunca e, com ele, um marinheiro inglês que desperta a sua curiosidade pelo mundo de fora, pouco conhecido. Ela precisará lutar contra os princípios do próprio povo para tentar salvar o homem; além disto, Peter Pan, o menino aventureiro e líder d’Os Meninos Perdidos começa a despertar algo de estranho no coração de Tiger Lily, contrariando tudo o que antes ela imaginara para si.

Tiger Lily

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Todos os aspectos do livro são interessantíssimos, começando pela narração feita pela fada Sininho. Ela guia as leitoras pela caracterização dos espaços da narrativa, demonstrando, além do teor fantástico, a realidade que habita a vida de cada um, para que possamos fazer um paralelo com o nosso cotidiano. Outro ponto forte na narradora é seu carinho e atenção para com Tiger Lily; há sempre uma cumplicidade pairando pelo ar, o que torna tudo mais prazeroso – Sininho é a melhor amiga que toda garota gostaria de ter e, mesmo apaixonando-se por Peter Pan também, pois sente, literalmente, as palpitações de Tiger Lily, não há rivalidade entre as duas. É interessante saber o que a fada pensa através de sua voz ativa, pois na maioria das adaptações, ela não fala. Fora isso, todos os personagens são muito bem construídos e possuem histórias interessantes, como a própria Tiger Lily, seu cuidador e pajé da tribo, Tic Tac, e Seiva de Pinheiro, o cativante amigo de Lily.

A paixão que floresce entre Lily e Peter Pan serve para que ela amadureça e tire um pouco do peso das responsabilidades de precisar sempre mostrar-se forte; decepções amorosas fazem parte da vida da maioria das adolescentes e com ela não é diferente: Tiger Lily descobre o amor e, junto com ele, suas doçuras e azedumes.

Tiger Lily
Na imagem: A autora Jodi Lynn Anderson (reprodução)

A obra ainda possui pautas feministas discutidas em grande quantidade, como a força e a representatividade feminina em seus locais sociais, além de abordar sobre abuso sexual. As mulheres da obra são reais e justamente por isso algumas delas acabam falhando e, em certos momentos, reforçam atitudes machistas, como obrigar as garotas da tribo a arranjarem casamentos para suprirem e repassarem uma tradição que visa um mero status social; Tiger Lily questiona justamente este fator e acaba sendo vista como uma “rebelde sem causa” por algumas de suas companheiras.

O fato dela posicionar-se contra algo que fere a integridade da mulher indígena, no contexto da obra, faz com que sua voz ecoe muito mais importante ao longo da narrativa. Tic Tac é uma personagem LGBTQ que transita entre o gênero masculino e feminino, e o livro também explora sua dor e luta para se autoafirmar como o líder da tribo, que em muitas ocasiões não olha para ele com tanta compaixão (e tudo piora quando o hóspede inglês leva o preconceito de seu mundo para aquele cenário).

Tiger Lily

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A escrita lírica de Jodi é muito cativante ao narrar os episódios acontecidos na vida dos personagens e também ao criar um mundo delicioso de ser explorado, tornando-o muito palpável. Além disso, a forma como aborda temas delicados, por se tratar de um livro para jovens, é justa e sutil, mas ainda assim extremamente importante, uma vez que suscita debates posteriores ao decorrer da leitura. Tiger Lily é uma personagem invisibilizada no mainstream e ter o foco neste livro é fundamental, uma vez que ela representa duplamente o que há de importante na literatura feminista: a força da mulher e do povo indígena.

Jodi Lynn Anderson, com Tiger Lily, ganhou o prêmio Atlantic Wire YA.


Tiger LilyTiger Lily

Autora: Jodi Lynn Anderson

313 páginas

Tradutora: Cláudia Mello Belhassof

Editora Morro Branco

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Escrito por:

117 Textos

Formada em Letras, pós-graduada em Produção Editorial, tradutora, revisora textual e fã incondicional de Neil Gaiman – e, parafraseando o que o próprio autor escreveu em O Oceano no Fim do Caminho, “vive nos livros mais do que em qualquer outro lugar”.
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