Excelentíssimos: os senhores do poder que controlam e ferem nossos direitos

Excelentíssimos: os senhores do poder que controlam e ferem nossos direitos

No mesmo momento em que o Brasil enfrenta uma crise identitária e democrática gravíssima, estreou nos cinemas o forte e chocante documentário Excelentíssimos, de Douglas Duarte. O documentário, gravado dentro do Congresso Nacional, em Brasília, durante o segundo mandato de Dilma que terminou em seu impeachment, apresenta um retrato íntimo e explícito dos fatos mais marcantes desse histórico período.

Douglas chegou ao Congresso com o objetivo de documentar o funcionamento do poder legislativo federal. Mas, conforme o governo de Dilma avançava, um novo cenário passou a se formar no Congresso e uma nova perspectiva se apresentou diante das câmeras do documentarista e sua equipe.

Excelentíssimos

A mudança de perspectiva no roteiro do filme aconteceu em dezembro de 2015, justamente quando o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, aceitou a tramitação do processo de impeachment da presidenta. Para contextualizar essa mudança de perspectiva e introduzir um olhar mais pessoal ao documentário, Douglas optou por incluir ao filme elementos (registrados em momentos como a campanha de Dilma e Aécio, comícios de Lula,  áudios de telefonemas e outros) que pudessem corroborar com seu ponto de vista e, ao mesmo tempo, garantir fidelidade sobre o que ocorreu dentro do Congresso durante o processo, quem foram seus principais articuladores e o que acontecia no entorno desse cenário. 

Durante os meses em que esteve no Congresso, Douglas escolheu acompanhar os opositores da presidenta, registrando e conversando com os personagens que foram determinantes para que o impeachment tomasse a direção que tomou. Seguindo de perto alguns partidos como o PSDB e PMDB,  além das bancadas religiosa e da bala, teve a chance de captar a força política desses partidos e o que está em jogo na política brasileira.

Alguns nomes conhecidos e outros ascendendo neste cenário – tais como: Renan Calheiros (MDB), Aécio Neves (PSDB), Eduardo Cunha (PMDB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Carlos Marun (MDB), Kim Kataguiri (MBL), Rogério Chequer (Movimento Vem pra Rua), Sérgio Moro (Juiz Federal da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba – atualmente indicado a Ministro da Justiça), Hélio Bicudo (jurista e político), Miguel Reale Júnior (jurista e político), Janaína Paschoal (jurista e política filiada ao PSL – eleita recentemente deputada estadual), Jovair Arantes (PDT), Romero Jucá (MDB), Michel Temer (PMDB) e Dilma Rousseff (PT) e outros – fazem desse filme-documentário um espetáculo de horrores que causa grande indignação àqueles que ainda acreditam na força da democracia e na Constituição brasileira.

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Entre condenados por corrupção e os que legislam em nome de crenças individuais – Deus, a família, a segurança, a moral… -, decidem o futuro do país em apenas alguns meses, como se o que estivesse em jogo fosse a final de um campeonato de futebol. É nessa atmosfera de final de campeonato, como num Fla-Flu, que uma Câmara dos Deputados majoritariamente masculina decide que a primeira presidenta mulher de nossa história seja impedida de continuar seu mandato, fruto de uma eleição legítima e democrática. Para entendermos a motivação desses senhores, devemos retornar um pouco na história.

O processo teve início em 02/12/2015 e foi acolhido pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (atualmente preso, condenado pela Operação Lava Jato). A denúncia de crime de responsabilidade foi apresentada por Hélio Bicudo (procurador da justiça aposentado) e pelos advogados Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. Dilma foi denunciada por desrespeito às leis orçamentária e de improbidade administrativa, além de suspeitas de seu envolvimento em atos de corrupção envolvendo a Petrobras.

Muito foi contestado por juristas a respeito das acusações. Foi dito que as ditas “pedaladas fiscais” não caracterizavam improbidade administrativa, além de não existir nenhuma prova de envolvimento da presidenta em crime doloso que pudesse justificar o impeachment. O relatório da comissão, organizada para apurar e julgar o pedido do processo de impeachment, foi favorável: 38 deputados aprovaram o relatório e 27 foram contrários.

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou o relatório devido a 367 favoráveis contra 137 contrários. Depois disso, o parecer da Câmara foi enviado para o Senado, que também se organizou em forma de comissão especial de admissibilidade. O produto dessa comissão foi um relatório também aprovado por 15 votos contra 5 contrários. 

Excelentíssimos

Ainda tramitaram algumas votações no Senado para a abertura do processo de afastamento da presidenta. Neste momento, o vice Michel Temer assume a presidência interinamente e, em 31/08, Dilma acaba perdendo o cargo de Presidenta da República, três meses após a tramitação do processo iniciado no Senado.

Durante os 152 minutos do documentário Excelentíssimos, assistimos os maiores representantes da cultura patriarcal de nosso país reunidos, cada qual com sua moral, ética e valores permeados de preconceitos, racismo, violência, machismo, religiosismo e conceitos bem elásticos sobre certo e errado. Juntos, determinaram o futuro de uma presidenta eleita democraticamente e, dessa forma, alavancaram acertos e contratos que beneficiariam (e de fato beneficiaram) grande parte dos nomes que protagonizaram o impeachment. Elementos condenados ou investigados por crimes contra a nação, como desvios de dinheiro público, enriquecimento ilícito e outros, foram os grandes mestres desse tenebroso GOLPE contra nossa democracia.

Apesar das diferenças políticas partidárias que cada uma de nós mulheres temos, é impossível assistir Excelentíssimos sem se incomodar com a misoginia instituída naquele espaço com tamanha naturalidade. Além, é claro, da total falta de escrúpulos desses senhores no que se refere ao curso daquilo que deveriam proteger: a Constituição Brasileira, a democracia e sua população. Um filme que, evidentemente, tem o propósito de defender o ponto de vista de seu diretor e acaba descortinando ainda mais os sistemas criados em torno do poder e o quanto estamos reféns de indivíduos tão corruptos.

Excelentíssimos

“Claro que num filme sou sempre eu que estou ligando os pontos, mas quero que isso fique patente. Então, é a minha voz. Aquele computador em que aparece as telas são os pontos que eu estou pensando, os pedaços de texto que eu estou selecionando. Então, ao mesmo tempo que esse filme tem uma cara informativa, é muito pessoal. O que não significa que seja só opinião e adjetivo, mas é muito pessoal. A ligação é de fatos, mas a ligação dos fatos é minha. E eu preferi ser franco e aberto nessa relação”.

(Douglas Duarte, em entrevista concedida ao Cine Festivais após a exibição da estreia de Excelentíssimos, no 51º Festival de Brasília).

Recomendamos Excelentíssimos não somente pela questão histórica que o envolve, mas também pela qualidade de sua narrativa e a capacidade de captar com as lentes o que cada um desses personagens têm em seu olhar. Não podemos esquecer nunca que a maior arma de um povo, além do voto, é o saber através da educação e da informação. A busca pelas verdades dos fatos deve ser constante e múltipla. Como mulheres e mães é nosso direito e dever a defesa constante da equidade de gêneros dentro das instituições governamentais do poder para que, com mais representatividade, defendamos nossos direitos.

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Mulher, mãe, profissional e devoradora de filmes. Graduada em Psicologia pela Universidade Metodista de São Paulo, trabalhando com Gestão de Patrocínios e Parceiras. Geniosa por natureza e determinada por opção.
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