A Editora Mino acabou de anunciar o relançamento do quadrinho “Dora”, de Bianca Pinheiro. Foi a deixa perfeita pra fazer resenha das duas HQs de terror já lançadas pela quadrinista, além de esquentar a ansiedade pelos lançamentos de “Bear #3” e “Mônica – Força”.
Na contramão do mundo, conheci o trabalho de Bianca Pinheiro por “Dora”, então enquanto geralmente o público se surpreende por saber que a autora de “Bear” também faz terror, tive uma surpresa ao descobrir “Bear”.
Mas se você parar pra pensar, são surpresas totalmente sem sentido. A gente se acostumou a lidar com autores que se especializam em um gênero e não exploram outros, mas é claro que eles tem mais de um gosto e uma faceta na vida. Quer dizer, não é como se Bianca Pinheiro tivesse dupla personalidade ou algo do tipo. E a identidade dela está tão presente em “Bear” quanto em “Dora” e “Meu pai é um homem da montanha”.
Dora (Não contém spoiler)
“Minha senhora, sua filha matou 15 pessoas. Perdão. Ela é acusada de matar 15 pessoas”. O detetive de polícia recolhe o depoimento de uma mãe, desesperadamente agarrada à inocência de sua filha, Dora. O enredo segue a história da menina, cada capítulo uma morte em que esteve envolvida. Sob o olhar protetor da mãe em contraponto com a acusação de assassinato conduzida pelo detetive, o clima tenso vai sendo construído de forma quase imperceptível.
O uso do contraste e a impressão preto e branca ajudam a narrativa e a recepção de quem lê. Referência a “Bear” só existe na breve aparição de Dimas numa camisa de Dora, mas as cores passaram longe desse quadrinho. O que foi bem inteligente, obrigada. De alguma forma, lembra xilogravura. O enredo tem um quê de “Carrie, a Estranha”, embora não seja uma referência.
Meu pai é um homem da montanha (Não contém spoiler)
Mais silencioso que “Dora”, esse quadrinho foi feito em parceria com Gregório Bert, tradutor e marido de Bianca. A história acompanha a viagem de uma mulher de semblante apático e triste até a montanha onde seu pai a levava quando criança. Não dá pra contar muito do quadrinho sem dar spoilers, então deixo só essa frase como sinopse mesmo e comentarei mais tecnicamente.
“Meu pai é um homem da montanha” tem um ritmo lento e mais sombrio que “Dora”. A leitura é muito mais visual também. Nesse quadrinho a arte também mudou um pouco, até evoluiu em relação à narrativa. O uso das tonalidades de cinza além do preto e branco de “Dora”, deram muito mais sentido ao fato do cenário ser na natureza, e Bianca pôde explorar muito mais focos de luz em meio à escuridão de uma floresta, além de expandir as linhas do quadrinho em si.
Referências
É engraçado pensar que Bianca Pinheiro não curte muito terror. Ela não gosta de levar susto e fica com dor de cabeça assistindo filmes do gênero. Mas finalmente ela deu match com o terror quando conheceu os quadrinhos de Emily Carroll, artista britânica. O suspense, o clima tenso, sem precisar de sustos ou artifícios do tipo, foi o que chamou a atenção de Bianca e a fez adotar o terror psicológico no seu trabalho. [Obrigada, Emily Carroll!]
Criar esse suspense parte muito do princípio de saber lidar com o desconhecido dentro da narrativa. Também em “Dora”, mas principalmente em “Meu pai é um homem da montanha”, Bianca vai escondendo informações aqui e ali que vão alimentando a curiosidade e aguçando a atenção. Não espere sustos, porque não é o objetivo dela, nem funcionaria tão bem no quadrinho, e Bianca é uma mestre nessa linguagem.
Recomendo fortemente essas duas HQs, recomendo inclusive que se leia mais de uma vez, pra curtir os detalhes da arte. Quem não costuma gostar de terror, pode ser legal experimentar também. Se você domina o inglês, pode começar lendo a referência de Bianca: Emily Carroll tem alguns quadrinhos para ler no site dela.
Dora
Bianca Pinheiro
128 páginas
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Meu pai é um homem da montanha
Bianca Pinheiro e Gregório Bert
Publicação independente
60 páginas
Onde comprar: Lojinha