Penelope: a princesa com nariz de porco que desconstrói um conto de fadas

Penelope: a princesa com nariz de porco que desconstrói um conto de fadas

Penelope, escrito por Marilyn Kaye e publicado pela editora Galera Record no Brasil, é uma adaptação do roteiro de Leslie Caveny para o filme homônimo produzido por Reese Witherspoon e estrelado por Christina Ricci. Descrito como um conto de fadas moderno, Penelope conta a história de uma jovem que passou sua vida trancada em casa por ter nascido com um nariz de porco.

Muitos anos antes do nascimento de Penelope, uma maldição foi jogada sobre a família Wilhern. A família Wilhern era uma rica e tradicional família e esperava que seus filhos tivessem atitudes condizentes com a cor azul de seu sangue. Todavia, Ralph Wilhern, tataravô de Penelope, cometeu um grande pecado: apaixonou-se por uma empregada, engravidando-a. Ainda que tivesse transgredido as regras implícitas da nobreza, Ralph não foi corajoso para contrariar sua família, recusando-se a casar com a jovem, que, desolada, jogou-se em um poço. O suicídio despertou a ira da mãe dela, que na verdade era uma bruxa. E como vingança, esta lançou uma maldição sobre a família: a primeira menina Wilhern a nascer teria um focinho de porco, maldição que somente seria quebrada quando fosse aceita por alguém de sangue azul.

Assim, anos depois, nasceu Penelope, a primeira menina da família após a maldição. Embora os Wilhern possuíssem dinheiro, nenhuma cirurgia era capaz de mudar as feições de Penelope, que, por vergonha de seus pais, foi mantida encarcerada dentro de sua própria casa e tida como morta para o resto da sociedade. Em segredo, tentavam arranjar-lhe maridos nobres, príncipes encantados capazes de salvá-la de sua feiura. O problema é que, assim como sua família, os nobres a quem era apresentada tinham horror ao diferente.

Penelope
Penelope na versão cinematográfica, interpretada por Christina Ricci

Chegou, então, o momento da reviravolta. Cansada de ser rejeitada e ofendida, após uma grande desilusão amorosa, Penelope foge de casa e encara o mundo: um lugar ainda mais terrível, mas, ao mesmo tempo, muito mais receptivo.

É comum que os contos de fada sejam subestimados pelas pessoas. Ocorre que eles são histórias presentes na sociedade e de grande relevância para a formação dos indivíduos, não obstante carreguem em si grandes mensagens. Todavia, é preciso desconstrui-los e trazer histórias que não reproduzam pensamentos opressores. “Penelope” consegue fazer isto. O livro traz grandes ensinamento de uma forma leve, e a leitura pode ser realizada por crianças ou adultos.

Como escreve Reese Witherspoon – que produz o filme e que tem trabalhado no empoderamento da mulher na indústria cinematográfica – na introdução à obra:

“Penelope é a história inspiradora de uma menina que ouve o tempo todo, das pessoas mais próximas, que não vale nada. Nascida com cara de porco, devido a uma antiga maldição que não tem nada a ver com ela, Penelope vive escondida na casa dos pais e aprende a esperar – esperar até que seu príncipe apareça para salvá-la, esperar até que esteja bonita o suficiente para sair para o mundo, esperar que sua vida comece.”

“No fim, Penelope se cansa de esperar e toma as rédeas de sua vida. Liberta-se da família e sai para o mundo, para experimentar a vida de acordo com suas próprias vontades, e encontra amizade, aventura e diversão ao longo do caminho. Penelope acaba aprendendo que é bem bacana do jeito que é, e essa segurança e auto aceitação acabam por transformar sua vida.”

[CONTÉM SPOILERS A PARTIR DESTE PONTO]

Penelope é uma personagem que viveu anos apreendida pelo desejo de ser “normal”. Influenciada por seus pais, achava que nunca seria capaz de superar suas angústias sozinha, mas somente com o auxílio de um homem. Um homem à imagem de um príncipe devia ser o salvador. E não é esta a mensagem que tantas vezes é passada para as mulheres? Quantas vezes não se ouve que toda a beleza de uma mulher será descoberta por um grande homem que a fará feliz? Ocorre que Penelope, do mesmo modo que várias mulheres, não consegue encontrar alguém que a aceite por quem realmente é: uma pessoa fora dos padrões exigidos socialmente.

Penelope

Ao invés de lamentar-se depois da desilusão, Penelope resolve finalmente viver sua vida e encarar o mundo com sua face única. O processo de aceitação é demorado. Inicialmente, ela coloca sua aceitação no fascínio do mundo, que a aceita por utilizá-la como entretenimento. Então, compreende que esta aceitação exterior não é suficiente, porque não há nesta relação (entre o indivíduo e o mundo alheio a ele) qualquer empatia verdadeira, mas apenas distração efêmera. O diferente não é de fato aceito ou respeitado: é transformado em espetáculo.

Cansada e ainda não liberta da ideia de beleza que lhe foi imputada – condição, esta, para uma vida digna, conforme foi ensinada –, Penelope deixa-se convencer novamente pela família e retoma os planos iniciais. Não pode se casar com seu grande amor, pois este não pertence à nobreza, então aceita um casamento arranjado, mesmo que a pessoa tanto lhe tenha maltratado anteriormente. Aceita tudo fixada na ideia de que somente poderá ser quem é quando se libertar da maldição com que nasceu, sem entender qual a sua verdadeira prisão. Até que ela compreende a chave da maldição, algo que estava embaixo de seu focinho, mas ela fora incapaz de perceber por ser ensinada a idolatrar o belo, o estereótipo, o padrão. E Penelope entende algo que algumas das pessoas que a amavam – amigos principalmente – já tinham compreendido: ela sempre foi quem tinha nascido para ser.

Penelope não é um conto de fadas sobre como o amor vence tudo. Ainda que tenha um pouco de romance, este nunca foi o foco. Penelope é a heroína de sua história, na qual os príncipes exercem papéis ora secundários, ora de vilões. Penelope fala sobre a desconstrução dos ideais absorvidos e sobre a libertação de regras opressivas estabelecidas pela sociedade. É uma obra inocente e poderosa sobre aceitação e empoderamento.

Por fim, como foi baseado no filme, o livro é muito semelhante à versão cinematográfica, que apresenta a mesma mensagem, embora apresente maior teor cômico – o que existe no livro, mas é mais facilmente identificável no filme.

Penelope


Penelope - resenha - 04

Penelope

Marilyn Kaye

24o páginas

Editora Galera Record

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Mestra em Teoria e História do Direito e redatora de conteúdo jurídico. Escritora de gaveta. Feminista. Sarcástica por natureza. Crítica por educação. Amante de livros, filmes, séries e tudo o que possa ser convertido em uma grande análise e reflexão.
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