Alena: quando o terror psicológico encontra o terror social

Alena: quando o terror psicológico encontra o terror social

Para quem é fã de quadrinhos, especialmente do gênero terror humano, o ano já começou bem. Uma das primeiras obras anunciadas pela AVEC Editora para 2017, Alena, publicada originalmente em 2012, já venceu o The Adamson Statue, o mais prestigiado prêmio de quadrinhos da Suécia e agora (finalmente) chega em território brasileiro. Muita espera – e expectativa – se formou por essa chegada e, felizmente, Alena consegue entregar até mais do que o esperado.

Na história, a vida da jovem Alena é um inferno. Desde que ingressou em uma escola de classe alta, ela sofre bullying diariamente das meninas mais populares, destacando-se a líder, Filippa. Sua única e melhor amiga, Josefin, acha que Alena já aguentou demais e se mostra determinada a resolver esse assunto, passando a agir para combater qualquer pessoa que possa querer maltratá-la. Há apenas um problema: Josefin está morta há um ano.

ALENA

Kim W. Andersson, o autor, explicou que Alena segue a mesma linha de horror romântico de seu trabalho anterior, Love Hurts (inédito no Brasil), mas com uma evolução em seu estilo. “Desta vez, no entanto, é uma história muito mais sombria. Depois de fazer minhas histórias em quadrinhos curtas por alguns anos e reunir uma base de fãs formada principalmente por adolescentes, eu queria dar a eles uma história muito boa. Alena é sobre amor jovem e horror, disse.

Dito isso, afinal, sobre o que é Alena?

Como foi dito acima, Kim W. Andersson já escrevia quadrinhos seguindo o mesmo tema mix entre amor e terror (com muito sangue), um tipo de romance gore. Em Alena, este elemento foi intensificado – especialmente o gore – o que resultou em uma história com o fator terror bastante forte, mas, ainda, com o romance típico das narrativas de Andersson presente e essencial para o desenvolvimento da história.

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Isso, porém, já era algo previsível. Ao nos propormos a ler um quadrinho de Andersson, ou mesmo ao vermos a capa de sua nova graphic novel, vemos que se trata de algo com algum – muito – grau de violência. O romance talvez não seja tão evidente, mas mesmo assim, não é algo que causa uma extrema surpresa ao leitor, já que o mesmo foi tão bem incorporado a história, que ele – em todas as suas formas – se mostra essencial ao seu desenvolvimento, sendo aquilo que, inclusive, dá causa aos problemas de Alena em sua nova escola e vida pós-Josefin.

O curioso sobre a relação entre Alena e Josefin, a propósito, é como ao longo da história pós-morte ela é retratada ao leitor como, no mínimo, abusiva. O fantasma de Josefin apresenta-se como extremamente protetivo em relação a Alena, chegando até a querer controlar os relacionamentos amorosos da mesma e exercer chantagens emocionais constantes sobre esta.

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O mais interessante do quadrinho, porém, é a forma como diversos aspectos comuns de nossa sociedade são apresentados em seus respectivos extremos – com raras sutilezas – evidenciando a toxicidade de cada um. Desde o início, por exemplo, são mostradas consequências de uma feminilidade tóxica, com sua imposição resultando em uma garota sentir a necessidade de mudar sua aparência (“de princesinha”) para poder ser respeitada, para tornar-se mais forte, traço historicamente – e ocidentalmente – dissociado do sexo e gênero feminino. E mais, a rivalidade feminina cultural é amplamente aproveitada na graphic novel, mas de uma maneira tão extrema e gráfica, que torna-se evidente como esse ódio cultural e socialmente construído pode ser destrutivo. Feminilidade tóxica esta, que está diretamente relacionada à heteronormatividade incansavelmente mostrada no quadrinho, sendo ela a fonte primordial da história e causadora absoluta dos conflitos entre as personagens da mesma.

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Além de, obviamente, Alena e Josefin, a personagem que mais chama atenção é a vilã principal, Filippa. Fonte inesgotável de bullying contra Alena, ela é mostrada como um retrato perfeito, mas até um pouco caricato, da elite conservadora mundial, especialmente a norte-ocidental, reforçando ideologias heteronormativas, nacionalistas, elitistas e de supremacia branca.

Crítica à supremacia branca que, mesmo não tendo sido proposital, é curioso de ver em um quadrinho que não possui sequer um personagem não-branco. A proposta do quadrinho de apresentar a toxicidade social presente entre nós, portanto, torna-se incompleta ao ser apresentado apenas o ponto de vista branco ocidental, mesmo que a questão da sexualidade (imposição heteronormativa) seja uma constante.

 

Não devemos nos enganar, entretanto, de que apenas Filippa é a vilã da história. Como foi dito pelo próprio Andersson, suas histórias, mesmo sendo de terror, tratam de amadurecimento e, portanto, de humanos; seres, naturalmente – ao contrário da maioria das narrativas conhecidas – dicotômicos, ou seja, tanto bons quanto maus. E é assim que é Alena.

Concluindo, Alena consegue abarcar aspectos sérios da sociedade mundial atual, sem perder seu DNA de terror, e, muito menos, sem prejudicar o desenvolvimento da história, conseguindo apresentar uma narrativa convincente e capaz de entreter ao leitor.

ALENA

Isso é feito através de quadros dinâmicos e diálogos rápidos, sendo estes unidos por gráficos e ilustrações de traços fortes e extremamente realistas, conseguindo passar ao leitor a história de uma forma direta e verossímil. A edição trazida ao Brasil, por sua vez, dá um show estético, dando ainda mais prazer na leitura do quadrinho.

Vale (muito) a leitura!


ALENAAlena

Kim W. Andersson

120 páginas

AVEC Editora

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Esta obra foi cedida pela editora para resenha.

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