Gris é um jogo independente de aventura e plataforma, publicado pela Devolver Digital e o primeiro concebido pela Nomada Studio, desenvolvedora de jogos sediada em Barcelona e composta por desenvolvedores e artistas formados em ilustração, pintura e design gráfico. Essa inclinação artística é notável em cada traço de Gris, que também se destaca pela narrativa tocante e envolvente. Disponível para PC, na Steam e também para Nintendo Switch, este é um jogo impecavelmente imersivo, que transporta a jogadora para um mundo onírico, simples à primeira vista, mas repleto de elementos com qualidade comparável a muitos jogos AAA.

Podemos definir Gris como uma obra de arte! Com estética minimalista, que surpreende quem torce o nariz para gráficos aparentemente tão simples, o jogo apenas dispensa o excesso de informação visto em tantos títulos atuais e essa primeira impressão sobre a simplicidade logo se perde no momento em que começamos a jogar.
As animações são ricas em detalhes e é de uma beleza única ver a protagonista, que dá nome ao jogo, deslizar pela tela enquanto avança pelo cenário. Inclusive, o vestido de Gris, mais que uma mera funcionalidade, torna-se praticamente um outro personagem ao assumir as formas necessárias para cada situação ou apenas esvoaçando com os movimentos da protagonista.

Este é, definitivamente, um dos pontos que engrandece e traz frescor aos jogos de aventura e plataforma, que costumam ser mais frenéticos, deixando a jogadora com a sensação de estar correndo contra o relógio o tempo todo! Em Gris temos um respiro que nos permite apreciar todo o cuidado com a produção artística e, justamente por ser um jogo com tanto apelo à arte, encanta também por deixar a imaginação da jogadora fluir livremente – recurso reforçado pela ausência de falas e pela quantidade reduzida de textos, se comparada a outros títulos do mesmo gênero.

Ainda falando em arte, a trilha sonora de Gris é igualmente uma obra-prima. De uma sensibilidade ímpar, além de dar ainda mais vida às animações do jogo, as melodias e os efeitos sonoros proporcionam um nível de imersão crescente que acompanha a progressão da narrativa. Se por um lado os gráficos aparentam ser mais contidos, a música simplesmente transborda!
Leia também:
» [GAMES] Celeste: Uma jornada para conhecer e superar a si mesma
» [GAMES] Hellblade – Senua’s Sacrifice: uma experiência única e envolvente
» [GAMES] Distortions: Uma jornada sobre superar o passado e seguir em frente
Gris não possui tantas ações e habilidades, até por ser um jogo de plataforma e pela tendência minimalista. No entanto, a mecânica simples e intuitiva não causa prejuízo e sim apenas destaca o trabalho impecável de seus desenvolvedores e principalmente a narrativa, que é de uma sutileza gritante. O jogo começa com a protagonista desorientada e sem voz, perdida em um mundo sem cor que se desfaz em ruínas. Depois de uma fuga desenfreada por uma terra desolada, jogadora e personagem entendem que o único caminho possível para se encontrar é seguindo em frente.

Ao longo do jogo, Gris coleta memórias, representadas por estrelas luminosas que servem de guia e concedem poder para novas habilidades, usadas ao avançar por este lugar desbotado que lentamente ganha cor, sons e vida. Porém, mais do que encontrar uma saída, o grande objetivo do jogo é ajudá-la a retomar a própria vida, perdida neste limbo de tristeza. Uma das grandes sacadas de Gris é a possibilidade de interpretação dessa dor profunda, que remete à depressão e ao luto, mas que pode ser também sobre aquela tristeza de um dia ruim, quando nada dá certo, às vezes tão intensa que nos impede de enxergar “o copo meio cheio”.

Durante a jornada, Gris interage com outros personagens e aprende a lidar com a confusão de sentimentos tão dolorosos. Ela ganha confiança e mostra que é possível superar aquilo que a desnorteia – senão sozinha, com a ajuda daqueles que encontrou pelo caminho. A sutileza para falar de assuntos tão difíceis é brilhante e consegue fazer uma conexão única com situações que todo mundo já passou, ou vai passar, em algum momento da vida. Essa identificação com narrativa e personagem é certeira, algo que poucos títulos conseguem fazer e que valoriza muito o trabalho de desenvolvedoras independentes.

Por todos estes motivos, Gris definitivamente merece ser aclamado, pois é uma experiência sensorial impecável, com trilha sonora, gráficos e animações tão envolventes quanto a narrativa. Se procura um jogo casual que tem muito a dizer, Gris é a melhor opção; um indie belíssimo sobre resiliência e superação, com momentos de contemplação e serenidade que são um verdadeiro presente para a jogadora – e tão minuciosamente elaborado que está longe de ser apenas mais um jogo em sua coleção.
Edição realizada por Gabriela Prado e revisão por Isabelle Simões.