CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 4×04: Milk

CRÍTICA | The Handmaid’s Tale – 4×04: Milk

The Handmaid’s Tale, série produzida pela Hulu com base no livro homônimo de Margaret Atwood, enfim, retornou. Os três primeiros episódios da 4ª temporada responderam algumas das perguntas que, há 2 anos, os fãs carregavam. Mas também abriu novas possibilidades.

“Milk” está longe de ser o episódio mais empolgante da temporada. E talvez muitos já esperassem por isso após as emoções com que se finalizou o terceiro episódio, “The Crossing”. Apesar disso, é um episódio importante, tanto para o que acontece em Gilead quanto para o que acontece com quem está fora.

AVISO: o texto abaixo contém spoilers

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Cena da quarta temporada de The Handmaid’s Tale | Fonte: IMDB

“Milk”: o confronto entre June e Janine em The Handmaid’s Tale

June (Elisabeth Moss) e Janine (Madeline Brewer) são as únicas sobreviventes do grupo de aias em rota de fuga. Contudo, atravessar a linha do trem não lhes garante segurança. 

E por isso, rumam em direção a Chicago, onde a guerra se estende. Para isso, se alojam em um caminhão-tanque com leite, e juntas precisam não apenas sobreviver, mas também resolver suas diferenças.

Os diálogos travados entre as duas refletem boa parte o que, fora de The Handmaid’s Tale, se analisa sobre June. Primeiro, June não segue um plano. Age por impulso na maior parte das vezes. O seu discurso, contudo, conforta, passa segurança e desperta as demais pessoas para a luta. 

O problema de assumir a liderança é que as pessoas, muitas vezes, esperam mais do que se é capaz de entregar. E enquanto June subestimava todas as aias junto a ela, inclusive Janine, era superestimada por elas. Todas passaram por situações difíceis. Todas foram vítimas de violência. E todas tiveram seus filhos arrancados de seus braços, entregues ao regime de Gilead. Apesar disso, June age como um mártir e ignora as ações e a autonomia de suas companheiras. 

Janine confirma, então, se foi June quem as delatou. E veja, a escolha de June é compreensível diante da ameaça de sua filha. No entanto, como Janine aponta, é uma escolha. E o discurso de “você faria o mesmo no meu lugar” não apaga a dor da traição, a dor de um ato que levou outras mulheres à morte.

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Janine (Madeline Brewer) no quarto episódio de The Handmaid’s Tale | Fonte: IMDB

Janine e o debate sobre o aborto em The Handmaid’s Tale

Ao mesmo tempo, o 4º episódio da quarta temporada de The Handmaid’s Tale nos apresenta o passado de Janine. E podemos ver mais, desse modo, dessa mulher. Janine sempre foi apresentada como uma mulher sentimental, prestes a se desligar do fio de sanidade que ainda a mantinha viva. E para quem não se lembra, em temporadas anteriores foi June que a salvou.

A instabilidade emocional que a caracterizava, entretanto, era uma resposta à série de violências a que era submetida. E contrasta, assim, em relação à Janine antes de Gilead. Esta Janine possui um emprego, um filho e também consciência de suas escolhas. E ao se deparar com uma nova gravidez, precisa enfrentar o dilema da escolha que vai além da moralidade: ela quer ou não interromper a gravidez?

The Handmaid’s Tale fala tanto sobre a maternidade, sobre a capacidade reprodutiva como uma benção (e também uma sina), que muitas vezes o poder da escolha fica de lado. E não é por menos. Como falar de escolha quando esta não é uma possibilidade para as mulheres?

Por isso, é importante o arco de Janine pré-Gilead. É necessário que a série traga os mitos que constroem em torno do aborto, sobretudo com a criação de enredos que demonização este ato de liberalidade. Mas também é importante que tragam o outro lado, o procedimento e a mulher como dona de sua própria vida.

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Rita (Amanda Brugel) no quarto episódio de The Handmaid’s Tale | Fonte: IMDB

A vingança de Rita

Do outro lado da fronteira, Serena (Yvonne Strahovski) e Fred (Joseph Fiennes) continuam a preparar sua defesa. Agora, no entanto, há um elemento a mais a conectá-los: Serena está grávida, embora Fred não saiba disso.

A explicação que The Handmaid’s Tale oferece para a fertilidade de Serena é o distanciamento dos agentes nocivos de Gilead. Cabe lembrar que o livro “O Conto da Aia”, de Margaret Atwood, traz bastante o elemento ambiental como um dos fatores de guerra e justificativa de Gilead. E em temporadas anteriores da adaptação, este tema já foi abordado.

Não há garantias, entretanto, de que esta seja, de fato, a razão por trás da gravidez de Serena. A série pode tanto continuar se apoiando nessa tese quanto também apresentar outros elementos. Fato é que Serena quer usar a gravidez a seu favor no julgamento. E não resiste em usar o argumento de “milagre” para tentar convencer sua antiga martha Rita (Amanda Brugel) a testemunhar em sua defesa.

Ritha, por óbvio, se emociona ao saber da novidade. Afinal, é algo inesperado diante de tudo o que era pregado. E por mais que sofra pelo tempo em que foi escravizada, ainda que não sexualmente, não deixou de criar um vínculo com o casal Waterford. Ainda assim, seu movimento final é, de certo modo, uma vingança.

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Fonte: IMDB

Para as mulheres, a dor está em todos os lugares

Ao final do 4º episódio da quarta temporada de The Handmaid’s Tale, June e Janine finalmente encontram um destino, mesmo que não seja aquele esperado. E com isso, mais indícios de que as duas passarão boa parte da temporada sem os mantos vermelhos. A alegria, todavia, não dura muito tempo.

No início da temporada, June comenta, em um diálogo, que homens podem ser ruins em todos os lugares. E é importante que as pessoas tenham em mente que a violência de gênero em The Handmaid’s Tale, assim como em outros regimes da atualidade, não existe apenas dentro, é um mal cultural incorporado dentro dos sistemas, por seu incentivo ou autorização. E estar em uma democracia ou, no caso da série, fora das garras de um sistema totalitário, não anula o fato de que homens se sentem autorizados a violentar mulheres.

Então, é doloroso ver que as duas fogem, sobretudo da violência sexual a que são submetidas, para encontrar apoio onde a violência sexual é uma moeda. A indignação preenche, a cena é desconfortável. E quem assiste apoia June quando ela fraqueja, quando ela tenta, mas não consegue, apesar de saber que esta é a única saída possível. Janine é quem salva o dia, e também conseguimos entender sua atitude, mas a que custo? 


Revisão por Isabelle Simões.

Escrito por:

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Mestra em Teoria e História do Direito e redatora de conteúdo jurídico. Escritora de gaveta. Feminista. Sarcástica por natureza. Crítica por educação. Amante de livros, filmes, séries e tudo o que possa ser convertido em uma grande análise e reflexão.
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