Fernanda Young – Foge-me ao Controle é o novo filme da diretora Susanna Lira, distribuído pela Synapse Distribution. O filme chega aos cinemas dia 29 de agosto, quatro dias após a marca de cinco anos da morte da amada escritora, roteirista, poeta e artista, Fernanda Young. A obra já percorreu diversos festivais, sendo premiado com a Melhor Montagem, no Festival É Tudo Verdade e o prêmio da crítica no Festival de Paraty.
Forever Fernanda Young
Fernanda Young, artista multitalentosa, marcou a cultura brasileira em diversas frentes durante as duas primeiras décadas dos anos 2000. Escritora, roteirista, poeta, fez música, artes plásticas, foi atriz e apresentadora. Com 15 livros publicados, 4 roteiros de longa-metragens e dezenas de roteiros dedicados à programação da TV, afinal, não há nada mais brasileiro do que a TV, Fernanda deixou esse mundo para trás em agosto de 2019, com apenas 49 anos.
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Dos seus trabalhos mais celebrados estão os anos trabalhando ao lado do parceiro de vida e de roteiros, Alexandre Machado, na série Os Normais (2001 – 2003), que também rendeu dois filmes longa-metragens, derivados. Assim como seu trabalho de apresentadora à frente do programa Saia Justa, da GNT. Ademais, dos créditos mais recentes estão a série da Globoplay, Shippados (2019) e o livro lançado postumamente, “Pós-F: Para Além do Masculino e do Feminino”.
Contudo, mesmo com tantos trabalhos variados, Fernanda Young se entendia primordialmente como uma escritora, tendo publicado prosa e poesia. Seus trabalhos literários contam com uma sensibilidade única que se tornou marca da autora e moldou a voz tão pessoal que permeia seus escritos. Disléxica, asmática, mas carregando toda a coragem do punk que fez sua arte entrar para a história.
Fernanda Young – Foge-me ao Controle
Sendo assim, é nesses termos que o documentário encara Fernanda Young. Na descrição do longa presente no site do Festival É Tudo Verdade, lê-se apenas: “Ensaio poético sobre a vida da escritora, apresentadora e roteirista Fernanda Young.” E é o que Susanna Lira alcança com o seu filme.
O documentário centraliza a figura de Young a partir da mesma, utilizando suas obras para narrar a vida da autora. Juntamente com entrevistas, performances e imagens de arquivo pessoal que estendem a ideia de performance. Entende-se que para uma artista como Fernanda, a performance ocupava um lugar de constância.
Com uma mente brilhante como a de Fernanda Young, ninguém seria melhor para contar a sua história do que a própria. Nesse processo que o documentário abre, Young descreve a sua escrita como “não-linear”, atribuindo essa descrição à própria subjetividade. O filme não só respeita como faz uso dessa não-linearidade.
Muito mais do que tratar sobre quem era a artista por meio dos acontecimentos de sua vida, como um documentário ou cinebiografia tradicionais fariam, o longa remonta a Fernanda Young por temas. Família, amor, melancolia, feminilidade… como ela via esses temas e como eles reverberavam na sua arte.
Nos momentos narrados em que falta a voz da autora, Maria Ribeiro, atriz e escritora, empresta a sua, enquanto lê trechos de obras de Fernanda. A narração também conta a participação de uma das filhas de Fernanda Young, Estela May, no momento dedicado a falar sobre a parceria artística e amorosa entre sua mãe e seu pai. O filme é composto por vozes femininas.
“Você sabe o que é ser uma garota?”
A ideia por trás do documentário e as ideias discutidas por Fernanda são estruturadas a partir da montagem do filme. Montagem essa que funciona como colagens que formam as imagens, ideias, as possibilidades que fizeram Fernanda Young. Essas imagens variam de tema, época, ou mídia. Nos mostrando que na arte de Young estavam/estão sentimentos muito primordiais para nós. Tão primordiais que estão registrados nesses mais diversos meios, espaços geográficos e temporais.
“A coragem não exclui o medo”, é algo que a própria Fernanda dita em uma entrevista presente no documentário. Tal afirmação ressoa também no próprio filme, que representa um lugar de experimentação e força do audiovisual brasileiro, enquanto celebra um ícone da cultura do Brasil do século XXI. O filme nos lembra também que Fernanda morreu em um momento triste para o nosso país, no qual a artista descreve dizendo poder sentir o cheiro da fumaça da queima das bruxas.
Sendo assim, esse “ensaio poético” sobre uma das nossas vozes artísticas mais fortes do milênio, reforça a necessidade de mantermos vivas essas vozes e sua arte. Transformando arte em inspiração para gerar arte ainda. Peço licença para criar uma tangente e citar aqui Ailton Krenak, “O mundo da arte se tornou o último refúgio para aqueles que querem compartilhar generosidade.“
Fernanda Young foi a mais generosa de todas. Afinal,
“Você sabe o que é ser uma garota? Você sabe o que é ser uma garota nesse mundo?” – Fernanda Young
Referência: