Qualquer garota nascida nos anos 80 e 90 sabe muito bem o que significa o trecho “if you wannabe my lover, you gotta get with my friends” (“Se você quiser ser meu namorado, precisa se dar bem com meus amigos“). O icônico hit “Wannabe” das Spice Girls evocava a amizade feminina acima de relacionamentos, e já despontava o girl power característico do grupo, que fez a cabeça das meninas na época de seu lançamento.
Victoria Adams (hoje, Beckham), Melanie Brown, Melanie Chisholm, Geri Halliwell e Emma Bunton despontaram em 1996 com o pop chiclete de “Wannabe“, uma canção que foi escrita em apenas vinte minutos após improvisações do grupo no estúdio. E não poderiam imaginar que chegariam tão longe: após a estreia, o single ficou no topo das paradas britânicas por sete semanas seguidas e chegou ao primeiro lugar em 37 países. No fim de 1997, as Spice Girls já haviam vendido mais de 7 milhões de cópias de “Wannabe” no mundo todo. Números impressionantes para as cinco garotas estreantes.
Embora o rótulo feminista e o termo girl power já fosse reivindicado pelo movimento riot grrrl, as Spice Girls levaram a ideia do empoderamento feminino para o mainstream com o girl power em meados da década de 90. Não se pode negar que essa mensagem propagada pelas britânicas plantou a semente do empoderamento na mente de muitas naquela época, fossem meninas ou adolescentes.
De repente, o feminismo tão rechaçado e visto como um movimento morto na época era legal, divertido e extremamente comercial. Garotas comuns estavam na mídia dizendo que tudo bem ser ousada e desbocada, e tomar espaço no alto de um par de botas de saltos gigantescos, mini-saias e vestidos colados. O empoderamento vinha através da liberdade de escolha, principalmente a liberdade sexual. O girl power deu a uma geração de meninas a sensação de que elas podiam tudo num mundo em que, constantemente, somos lembradas de que ainda podemos muito pouco.
As Spice Girls eram legais e seguras de si, cada qual com uma personalidade e um estilo diferente para que fãs se identificassem com cada uma delas. Com o lançamento do primeiro single, o mundo passou a conhecê-las como Scary, Ginger, Posh, Sporty e Baby – apelidos dados por alguém da revista Top of The Pops. Em um artigo da Billboard do ano passado, a jornalista Jennifer Armstrong definiu essas identidades como problemáticas: Scary não seria apropriado para a única mulher negra do grupo; Posh, Ginger e Baby seriam estereótipos de feminilidade.
Em uma entrevista de 1996, Ginger e Posh brincaram que Margaret Thatcher foi pioneira da ideologia girl power – a primeira Spice Girl. É uma afirmação um tanto controversa, considerando o governo da chamada Dama de Ferro, e até mesmo o contexto em que o grupo teve destaque, o Cool Britannia. O movimento de valorização da cultura britânica surgiu com a saída de Thatcher do posto de primeira-ministra, com uma proposta de revitalização do espírito inglês em um período em que a sociedade sofria com desemprego e a baixa moral após os desmandos de Thatcher.
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Na comemoração de 20 anos de lançamento, a ONU divulgou vídeo da campanha #WhatIReallyReallyWant em homenagem às Spice Girls, em que meninas de diversas nacionalidade dublam a música e mostram o que realmente querem: igualdade salarial e de educação, fim do casamento infantil e da violência contra a mulher. O vídeo foi recebido de forma positiva e elogiado pelas Spice Mel C e Emma Bunton.
O feminismo das Spice Girls foi contestado diversas vezes, até mesmo por militantes feministas da época. Até hoje, duas décadas após o surgimento do grupo, se questiona se a faceta feminista das garotas era real ou apenas um trabalho de marketing – muito bem sucedido, se for o caso. Independente da resposta, a semente do empoderamento feminino foi plantada e germinou em uma geração de mulheres que hoje têm as Spice Girls como uma das primeiras referências na mídia de mulheres tomando o espaço que é seu de direito, e cujo legado permanece até hoje.