Uma mistura despretensiosa que une vibes progressivas com um tempero brasileiro. Assim se define Aiure, trio instrumental brasiliense que em abril deste ano lançou o álbum “Erótica & Bad Vibe”, uma outra definição que o grupo também toma para si. O disco marca uma nova fase da banda, inicialmente consolidada sob a alcunha de Vintage Vantage. A mudança, de acordo com a pianista Gabriela Ila, aconteceu por motivos de identidade. O nome antigo não refletia muito bem o que o trio queria transmitir – e o fato de ser em inglês era um incômodo adicional.
A escolha atual, no entanto, traz a atmosfera difusa e etérea do grupo, que possui como referências um conjunto bem amplo de projetos musicais: King Crimson, Mars Volta, Pink Floyd, Hermeto Pascoal, Aphrodites Child, Kamasi Washington e Vulfpeck são algumas delas. “Aiure vem de ‘alhures’, que significa ‘de outro lugar’. Fizemos questão de escolher um nome único, que nos representasse e que funcionasse em diversas línguas”, explica Gabriela. Com a mudança, novos ares se aproximaram: a maturidade e o senso artístico da banda foram outras coisas que também sofreram transformação.
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O disco novo tem uma sonoridade de sonho. Além do piano e do synth de Gabriela, da guitarra e da viola caipira de Lucas Pacífico e da bateria de Renan Magão, as composições trazem diversas participações. Trompetes, percussões, baixos e guitarras adicionam novas camadas ao trabalho do trio e, segundo a pianista, todos esses encontros surgiram de modo muito natural – e trouxeram ótimos resultados para os shows do grupo. “Tocar com mais uma pessoa no palco foi muito bom, somou muito pra gente”, relata.
Na música “Pedra Souta”, a banda homenageia o colega Pedro Souto, baixista de Brasília que faleceu em maio de 2017. A faixa, que ao vivo soa ainda mais potente, traz um coral de oito pessoas que eram próximas do músico e que também são parte da vida cultural do Distrito Federal. Isso tudo simboliza, para Gabriela, a vontade de estar perto dos amigos o máximo possível. Como afirma uma das poucas canções do disco com vocais, “Impermanência”, “o tempo vai passar e não vai voltar.”
Apesar de Aiure ter nascido este ano, o trio está ativo no cenário independente desde 2012. Ao longo dessa trajetória, dois EPs foram lançados com o nome anterior e, claro, algumas dificuldades foram encontradas – como é a realidade da maior parte das pessoas que caminham à margem das sonoridades homogeneizadas. “Todo dia é um 7×1 diferente, mas vale a pena no final. O principal desafio é nos levarem a sério como banda instrumental. Ainda existe muito produtor que ainda paga menos ou nos coloca pra tocar em horários ruins só porque a banda não tem vocal”, conta Gabriela. Sendo a única mulher do grupo, ela acaba por enfrentar também algumas situações que, segundo ela, fazem parte do grande e velho machismo enraizado na cena musical. “Clássicos como ‘você sabe ligar seu piano?’ ou ‘porque você não toca em pé ali na frente?’ ou ‘se você cantasse, a banda seria muito melhor’ parece que nunca saem de moda”, diz.
Em agosto, Aiure se apresenta na segunda edição do Festival CoMA, que rola em Brasília entre os dias 10 e 12. A programação, que acontece de modo espalhado por centros culturais da cidade, inclui shows de Elza Soares, Flora Matos, Marcelo Jeneci, Linn da Quebrada e muito mais.
Para saber mais, acesse o site oficial do evento: Festival CoMA.