Look back: um primor dos quadrinhos ao streaming

Look back: um primor dos quadrinhos ao streaming

Tatsuki Fujimoto (1992 – ) é um mangaká que vem chamando a atenção desde 2016, com seu primeiro mangá de sucesso, Fire Punch. Anos depois, sua obra shounen Chainsaw Man (2018) fez ainda mais sucesso e chegou a ser adaptado em 2022 para anime. De lá para cá, o autor já consolidou espaço e respeito notáveis entre os colegas da área e o público.

Comparando com os mangás citados acima, Look back (2021) se distancia um tanto em temática e gênero. Não é shounen, nem uma distopia recheada de aventuras e violência gráfica. Antes, trata-se de uma espécie de coming of age dramático concentrado em duas personagens mulheres em uma história rápida – mas que vai te fazer pensar nela por um bom tempo.

Ano passado, Look back ganhou uma adaptação em anime e chegou ao Brasil diretamente pelo serviço de streaming Prime Video. O longa, dirigido por Kiyotaka Oshiyama (1982), tem apenas 58 minutos e possui o mérito de expandir o que já havia de bonito no mangá e ainda adicionar nuances artísticas autorais. Mas antes de adentrarmos o filme, vamos falar um pouco sobre a obra de Fujimoto.

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Cena do mangá Look back (2021)
Look back (2021)

O mangá de 2021

O quadrinho japonês tem como protagonista Fujino, uma menina aspirante a mangaká com uma autoconfiança até então inabalável. As primeiras dúvidas sobre seu talento surgem quando outra estudante de sua escola – Kyomoto – começa a chamar a atenção com desenhos tecnicamente muito superiores. 

Kyomoto, por sua vez, é extremamente reclusa e tímida ao ponto de seguir os estudos exclusivamente em casa. A única pista de sua existência entre os alunos são os próprios desenhos que passa a publicar no jornalzinho da escola. Logo na estreia de Kyomoto, Fujino passa a se sentir ameaçada e alimenta durante anos um sentimento de rivalidade contra a sua inimiga invisível.

Essa rivalidade cessa quando Fujino finalmente encontra Kyomoto pela primeira vez e percebe que essa é sua fã. Ali, uma amizade se inicia e as duas tornam-se parceiras de trabalho. Acompanhamos o desenvolvimento de ambas e suas passagens para a vida adulta, até que uma tragédia acontece e a história assume um tom sombrio. 

Look back, afinal, é um mangá sobre fazer mangás. De uma maneira mais ampla, também é sobre ser uma jovem artista, com todas as inseguranças e erros que cercam essa fase. Nesse sentido, a estética de Fujimoto é muito apropriada em representar suas personagens em traços por vezes imprecisos e com um certo exagero no uso de hachuras. Soa como uma metalinguagem que vai da temática à forma. 

Cena do mangá Look back (2021)
Look back (2021)

Fujimoto e sua habilidade de surpreender o leitor

Ao mesmo tempo, Fujimoto demonstra uma habilidade incrível em criar ambientações cheias de detalhes. Em certos pontos do mangá, é necessária uma pausa para apreciar os cenários e as composições muito bem elaboradas. 

Sobre a narrativa, é difícil descrever sem entregar spoilers que podem prejudicar a experiência de quem ainda não leu. O que dá para dizer é que certos acontecimentos são tão abruptos quanto um passo em falso, nos fazendo sair de uma história com tirinhas bem humoradas para as lágrimas em questão de minutos. 

Essa mudança radical parece proposital, pois Fujimoto não se alonga muito em diálogos ou momentos específicos até a metade da história. A passagem do tempo e o desenrolar dos acontecimentos são representados principalmente pela mudança dos cenários e da aparência das próprias personagens. Coisa que, aliás, o autor faz com maestria.

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O filme de 2024

A adaptação animada de Look back é, primeiro de tudo, muito fácil de gostar. Ele tem a capacidade de agradar tanto os fãs mais preciosistas do mangá – que vão adorar saber que o filme segue a história à risca, sem nenhuma mudança significativa – quanto o público que simplesmente quer assistir a uma história bonita e bem contada. 

O estilo de desenho de Fujimoto também é mantido até certa medida, mimetizando a aura de imaturidade que ronda a juventude de Fujino e Kyomoto. Por outro lado, o uso das cores vibrantes e movimentos dinâmicos em momentos chave, tornam a adaptação mais leve e até menos abrupta que seu “original”.

Cena do anime Look back (2024)
Look back (2024)

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Essa suavidade também se manifesta no desenrolar dos acontecimentos. Mesmo que o momento de choque do mangá se mantenha na adaptação, o filme parece preparar melhor o público através de uma cadência dramática mais nítida. Em outras palavras, é mais fácil perceber quando as coisas estão prestes a mudar. 

Essa característica do longa, inclusive, torna a protagonista Fujino, muito mais “gostável” que no mangá. Embora ela permaneça arrogante e controladora nos dois formatos, sua versão no longa – com a presença de cores, música e a já citada suavidade – é mais humanizada e seu arco de amadurecimento, mais crível e emocionante.

Para encher os olhos e emocionar 

Um dos aspectos mais interessantes de Look back é sua capacidade de explorar o crescimento como uma dinâmica de caminhos possíveis: duas meninas tão diferentes, com talentos distintos, podem se unir por um propósito comum ou seguir caminhos opostos. Qual é a opção correta? 

A história, ainda bem, não fornece uma resposta. Antes, se apropria da arte como um portal para as possibilidades. Seja ela inspirada por um ideal mesquinho ou por uma pessoa especial.

Cena do anime Look back (2024)
Look back (2024)

Look back, do mangá ao anime, não deixa nada a desejar para quem gosta de personagens femininas interessantes e imperfeitas. Também é uma ótima opção para quem gosta de um drama inspirado e que consegue, como poucas obras, sondar o intrincado entrelaçamento entre competição e cumplicidade. 

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Criança dos anos 2000, filha do cerrado mato-grossense, historiadora, pesquisadora da cultura e aspirante a crítica.
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