Paradise Kiss: uma história sobre moda, romance e amadurecimento

Paradise Kiss: uma história sobre moda, romance e amadurecimento

No vasto universo dos mangás, existem várias demografias que as revistas japonesas utilizam para definir o público que pretendem atingir. A categoria Josei tem como alvo principal mulheres adultas, uma vez que aborda questões mais complexas e realistas do cotidiano feminino.

A mangaká Ai Yazawa iniciou sua carreira em 1985 e continua relevante até hoje ao criar histórias que exploram essa temática. Além de Nana, sua obra mais famosa, a autora também deu vida a outro mangá com uma trama tão incrível e significativa quanto a jornada de duas garotas com o mesmo nome.

Publicado entre 1999 e 2003 na revista Zipper e adaptado para anime em 2005, o mangá Paradise Kiss mistura moda, romance e o amadurecimento de uma jovem colegial prestes a se formar.

Edições do mangá físico, publicadas pela editora Panini ente 2021 e 2022 | Foto: Marcella Gonçalves / @m4rzella no Instagram

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Yukari e o padrão de vida “normal” em Paradise Kiss

Yukari Hayasaka é extremamente ansiosa e sofre com a pressão do vestibular. Sua rotina gira em torno dos estudos, e seu principal objetivo é se formar, ingressar na faculdade e conseguir um bom emprego.

Certo dia, a caminho do cursinho, ela se depara com duas pessoas de aparência incomum. Isabella, uma mulher alta e excêntrica, e Arashi, um homem com piercings e alfinetes no rosto, estão em busca de alguém que aceite desfilar com uma peça da Paradise Kiss, sua marca de roupas.

Ao perceberem que Yukari tem a altura e a fisionomia perfeitas para transmitir a imagem que desejam no desfile, tentam chamar sua atenção e correm atrás dela.

Assustada com a abordagem “invasiva”, Yukari classifica a ação como uma tentativa de roubo e até mesmo de uma possível violação sexual, julgando Isabella e Arashi com base em sua aparência.

Cena do capítulo 1 do mangá "Paradise Kiss" onde a abordagem invasiva acontece.
Cena do capítulo 1 onde o evento acontece | Imagem: reprodução

Essa atitude discriminatória surge devido à sua criação e ao convívio com pessoas que a influenciam. Com um pai executivo assalariado e uma mãe conservadora que a pressiona de forma doentia, ela não conhece e nem se interessa por nada que saia de sua zona de conforto.

Adentrando o Ateliê ParaKiss

Após o encontro conturbado, Yukari acaba desmaiando nos braços de Isabella. Isso a leva até o Ateliê onde ocorre a produção de roupas da “ParaKiss”.

Ateliê ParaKiss
Ateliê da ParaKiss | Imagem: reprodução

Ainda meio desnorteada, Yukari tenta se recompor enquanto ouve a verdadeira proposta junto ao resto da equipe. Todos ali são estudantes de moda do terceiro ano no renomado Instituto de Artes Yazawa, e o desfile faz parte de um festival que acontece no final do ano letivo. Nesse evento, os veteranos têm a chance de usar a imaginação e serem reconhecidos pelo seu trabalho e talento.

Inicialmente, a reação de Yukari é semelhante à que teve anteriormente na rua com Arashi e Isabella. Seu julgamento precipitado faz com que ela menospreze o mundo artístico, reduzindo-o a uma simples brincadeira em comparação aos seus estudos. Irritada com a intromissão, embora sinta um leve remorso pelas palavras duras, ela vai embora certa de que nunca mais voltará.

O poder da amizade: Miwako e sua paixão pela moda transformam Yukari

Diferente de outras pessoas, eu vivo no mundo real e não tenho tempo para brincadeira!“, diz Yukari | Imagem: reprodução

O que a impede dessa decisão é a carteirinha que ela deixa cair sem querer no meio do caminho. Miwako, a integrante que mais se apegou amigavelmente a Yukari, a encontra. Apelidando-a de Caroline, a jovem de estatura baixa e cabelo rosa é extremamente gentil, prestativa e uma das principais responsáveis por fazê-la mudar de ideia em relação ao desfile.

Miwako na adaptação para o anime de 2005
Miwako na adaptação para o anime de 2005 | Imagem: reprodução

A paixão de Miwako pela moda, bem como todo o esforço que ela demonstra com palavras, é algo que mexe com Yukari. Quanto mais ela escuta, mais percebe que um vestibular não é capaz de definir o caráter e a índole de alguém.

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George Koizumi: um verdadeiro boy lixo (mas nem tanto)

À medida que Yukari começa a frequentar o Ateliê, novos questionamentos surgem. Por conta da pressão que sofre da família, ela ainda não sabe ao certo o que realmente quer fazer no futuro. Diferentemente dos integrantes da ParaKiss, que estudam o que gostam, Yukari carece de uma vocação específica.

“Eu vinha correndo todos os dias dentro de um túnel escuro… sem nem olhar para os lados… em direção a saída.”

Ela se sente envergonhada por isso. Acha que à sua volta, todos são confiantes, e apenas ela alimenta a insegurança e carrega dúvidas. Esse pensamento só começa a mudar quando um certo jovem orgulhoso e intimidador entra em sua rotina.

George Koizumi comanda a Paradise Kiss. Inteligente, bonito e sempre vestido elegantemente, é difícil resistir ao seu charme. Yukari não demora a cair na conversa dele, o que lhe traz tanto benefícios quanto malefícios.

George e Yukari na adaptação para o anime de 2005.
George e Yukari na adaptação para o anime de 2005 | Imagem: reprodução

Mesmo apaixonada, Yukari sabe que George manipula seus sentimentos para conseguir o que quer. A fascinação por sua beleza, aliada à sua confiança, são os principais gatilhos que a fazem criar uma dependência emocional por ele.

No começo, todas as suas escolhas são baseadas na aprovação de George, mas com o passar dos capítulos, Yukari começa a se impor cada vez mais e passa a agir de acordo com suas próprias vontades. Claro que esse processo lhe custa muita dor de cabeça até realmente dar certo.

Ao abrir mão de uma paixão antiga, Yukari atura diversos momentos em que George se comporta de forma tóxica, mas pelo menos isso contribui para seu crescimento pessoal e profissional.

“Vou amadurecer, nem que seja na base da teimosia… para conseguir pisar na passarela com a cabeça erguida.”

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Vida real e representatividade em Paradise Kiss

O desenvolvimento da protagonista é excepcional do começo ao fim. Mesmo com todas as verdades ditas, em sua maioria, de forma fria e sem rodeios, Yukari leva todas em consideração. É assim que ela consegue construir uma carreira e um futuro brilhante, onde se sente verdadeiramente feliz e satisfeita.

Yukari no anime "Paradise Kiss"
Yukari é uma protagonista que aparenta ser simplória, mas que se mostra muito bem construída até encerrar sua jornada | Imagem: reprodução

A forma como a autora escolheu abordar os dilemas durante a transição da adolescência para a vida adulta é feita de forma sutil e sem filtros.

Além de Yukari, Ai Yazawa faz questão de dar voz aos outros personagens da trama, que também têm seus próprios dilemas para enfrentar. Miwako, por exemplo, vive em um relacionamento tóxico com Arashi, e é interessante entender sua história e ponto de vista sobre o assunto, pois ambos se conhecem desde a infância.

Isabella e George também mantêm laços há muitos anos, e o aspecto mais interessante sobre os dois é que ambos são abertamente membros da comunidade LGBTQIAPN+: enquanto George é bissexual, Isabella é uma mulher trans.

Dada a época em que o mangá estava sendo publicado, a oportunidade de desenvolvê-los sem estereótipos ou de forma implícita era grande. A importância que Yazawa trouxe para o enredo referente à representatividade é um dos muitos pontos que evidenciam a qualidade de suas histórias.

Da esquerda para direita: Isabella, Arashi, Yukari, Miwako e George no mangá "Paradise Kiss"
Da esquerda para direita: Isabella, Arashi, Yukari, Miwako e George | Imagem: reprodução

Paradise Kiss é um mangá curto, completo em apenas 5 volumes, mas que é capaz de mexer com nossos sentimentos. Sua principal lição, e aquela que às vezes somos egoístas demais para entender, é a importância de rompermos nossa bolha para compreendermos realidades diferentes daquela a que estamos acostumadas.

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12 Textos

Graduanda em Jornalismo com síndrome de Lady Bird. Criadora de conteúdo literário no @sohmagio, têm como filosofia de vida as obras da Ai Yazawa. Nas horas vagas, é fã e apreciadora da profundidade nas músicas do My Chemical Romance e da Taylor Swift.
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