As animações japonesas nos trazem histórias únicas com identidades visuais cheias de cores e vida. Assim, usufruímos, ao assistir, momentos decisivos, assustadores e de amadurecimento (como já vimos em Naruto, Dragon Ball e Fullmetal Alchemist) dentro desses mundos. E são diversos os gêneros, dentre eles, temos o shoujo, que nos apresenta histórias voltadas para o público adolescente que ama romance. Somando a isso, também encontramos o slice of life, que explora momentos decisivos na vida de seus personagense através de abordagens mais agradáveis que fogem da dureza da “vida real”, semelhante ao come out age. São esses gêneros que as duas obras mencionadas a seguir se inserem.
“Horimiya” e “Words Bubble up like soda pop” seriam apenas duas histórias para adolescentes?
Se com Horimiya, anime de 13 episódios, poderíamos reconhecer algo semelhante à Malhação ou uma versão totalmente Family friendly de Skins, por contar as etapas em que um casal se apaixona e, em plano de fundo, apresenta as desventuras de seus amigos e família; em Words Bubble up like soda pop (Netflix) encaramos um filme quase que indie, em que a nossa personalidade de 13 anos, viciada no Tumblr, adoraria assistir em uma abordagem cheia de cores pastéis, vivas e de sonoridade estrategicamente silenciosa.
Apesar do estilo e estrutura das histórias serem diferentes, pois uma se encontra dividida em episódios e a outra trata-se de um filme, ambas trazem em seus desenvolvimentos personagens que buscam não serem zombados por terceiros e, de maneira inconsciente, a própria aceitação. Apesar do óbvio público-alvo – o jovem -, as duas histórias, lançadas em 2021, ultrapassam suas barreiras e os mais diversos públicos podem e vão se identificar.
As inseguranças dos protagonistas de “Horimiya e “Words Bubble up like soda pop”
Sendo seus nomes o título de Horimiya, ambos são retratos da adolescência dentro do Ensino Médio. Enquanto Miya é popular na escola, com muitos amigos, estilosa e uma das melhores alunas da classe, Hori é o oposto: silencioso, invisível e praticamente inexiste na escola, só notam sua presença quando é para comentar o quão taciturno ele é. Em uma estrutura clássica – para não dizer clichê – ambos são opostos, mas que carregam consigo um segredo individual.
Miya, fora da escola, não é glamorosa ou com tanta presença. Na verdade, ela é comum até demais. Em casa, ela assume o papel de dona de casa e babá do irmão mais novo, uma vez que a mãe trabalha o dia todo fora de casa e o pai é ausente devido às viagens a trabalho. E totalmente oposto à personalidade cultivada na escola, Hori é cheio de tatuagens e piercings que ele esconde no colégio com o uniforme e cabelo solto.
Ambos possuem essa “dupla identidade” por um medo descomunal de julgamentos: como ela pode ser uma estrela na escola, se em casa ela é tão simples e apagada? Ele, todavia, seria uma boa influência ou boa companhia? Afinal, moralmente, tatuagens e piercings carregam um natural estigma desaprovante, ainda mais no Japão, que consegue ser bem conservador em alguns aspectos sociais.
Um encontro fora da escola, construído pelo destino, faz com eles se encontrem e realmente se (re)conheçam. A partir daí, o laço se molda em uma amizade que naturalmente desenvolve-se em amor.
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Words Bubble up like Soda Pop possui protagonistas similares a HoriMiya: ela, Smile, é uma estrela da internet, super-popular e adorada; mesmo por trás de tanto carisma, Smile usa uma máscara para esconder seus dentes acavalados com aparelhos, o que é meio irônico, pois foi seu sorriso que contribuiu para a sua popularidade. Já Cherry é totalmente oposto de Smile. Ele é introspectivo, silencioso e não consegue se comunicar se não for por meio de haiku, poema de origem japonesa com versos limitados.
Enquanto os protagonistas de Horimiya moram no meio urbano, os de Words Bubble up moram em um vilarejo com uma aura campista bem acolhedora. A digital influencer e o poeta se conhecem em um incidente que desencadeia alguns outros encontros que contribuem para que eles desenvolvam uma amizade e construam sentimentos entre si.
As dores precedentes do amadurecimento
Quando somos mais jovens, precisamente adolescentes, tudo parece ser mais intensificado: medos, inseguranças, paixões. Horimiya ainda busca ser bem mais otimista em sua narrativa, isto é, não foca nos quadros mais intensos pela tristeza, mas prioriza a avaliação de seus personagens com o seu passado.
Por exemplo, ainda que Hori nunca tenha sofrido alguma perseguição escolar direta – envolvendo agressões e similaridades -, ele passou por alguns episódios de colegas fazendo piadas incômodas, em razão de sua quietude. E isso o afetou bastante, contribuindo para ele mesmo se mantivesse mais recluso, quieto e focado na própria existência.
Além desse afastamento de todos, Miya se culpava muito por não ter amigos. Seja através do comportamento, gostos ou aparência: tudo isso é fruto da insegurança que todos nós, pelo menos em algum momento da adolescência, possamos já ter vivenciado.
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Ao passo que ele conhece Hori, também descobre novas pessoas e, finalmente, cria amigos e restabelece antigos laços. Assim, ele se liberta do medo e da insegurança que um dia lhe consumiu e aceita com orgulho os seus piercings e tatuagens.
A cena que Miya se reencontra com o seu eu mais novo é emocionante. Além de compreender seus sentimentos com o passado, a telespectadora poderá se ver espelhada nessa situação.
Já em Words bubble up like soda pop, Smile, desde muito novinha, sempre fez vídeos na internet, expondo sua espontaneidade, alegria e seu lindo sorriso – o que lhe entregou o “nome artístico”. Mas quando chegou a certa idade, passou a rejeitar seu sorriso. Ela não aceitava os próprios dentes – mesmo que todos amassem – e passou a se esconder.
Quando somos pré-adolescentes ou adolescentes (ou mesmo adultos, quem sabe?), ainda que não tenhamos quem nos apontem dedos ou críticas, nós não perdemos a oportunidade de nos compararmos com os outros, aumentando nossas inseguranças e até mesmo o “ódio próprio”. Entretanto, Smile lê um haiku de Cherry que, com o uso de metáforas em seus curtos versos, a faz refletir um pouco sobre como ela mesma permite se enxergar.
Na adolescência, tudo é uma primeira vez
Primeiro amor, primeiro beijo, primeira declaração, primeira vez, ou o primeiro coração partido. Tudo experimentado na adolescência se potencializa. E isso se concentra nas boas e, principalmente, más experiências. Observando tudo isso enquanto telespectadoras adultas, vemos o quanto a inexperiência e a ansiedade pode contribuir para que tudo torne-se ainda pior nessa fase de amadurecimento.
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O medo de não ser aceita, a expectativa do primeiro beijo, a atrativa vontade do toque inicial, além da dor do primeiro coração partido: todas essas sensações são nostalgicamente exploradas nesses dois animes citados. E tudo isso é retratado não apenas para quem já viveu tais acontecimentos, mas também para quem ainda viverá, servindo como uma boa introdução aos temas.
Compreender que somos protagonistas da nossa história
Além disso, as narrativas de Horimiya e Words Bubble Up like Soda Pop não são restritas aos protagonistas. Vemos também capítulos onde as dores de outros personagens são exploradas e buscam expor perspectivas do nosso próprio universo. Trata-se, portanto, de recortes para compreendermos outras histórias docemente vivenciadas.
Já que Horimiya buscou estabelecer um relacionamento beirando à perfeição entre os protagonistas, com os personagens secundários vimos cenários que fogem a isso. Temos os que experimentam a rejeição – diante a um amor platônico não declarado e aquele que é cuidadosamente dispensado -, e aqueles que vivem a deslealdade de uma relação, mostrando como os dois lados encararam isso.
Ousamos subestimar a maturidade que crianças e adolescentes conseguem ter, mas todas essas passagens de vida citadas foram digeridas por quem era imaturo e inexperiente e teve de enfrentar isso, de um jeito ou de outro.
Em Words Bubble Up não temos cenários amplamente desenvolvidos como no anime, mas presenciamos a dor de um coração partido pelo luto e sua impossível superação. Já o filme nos mostra como isso, uma tentativa possibilidade de superação, é possível a partir de lembranças, sendo estas mantidas ou construídas a partir de novas experiências.
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Histórias adolescentes podem soar bobas para adultos que julgam ter vivido tudo que a vida lhes ofereceu até então. Contudo, ver a construção de personagens, em novos capítulos da vida, pode ser tão animadora quanto acolhedora para o público de todas as idades.