Malalai Joya: a mulher mais corajosa do Afeganistão

Malalai Joya: a mulher mais corajosa do Afeganistão

A guerra nunca é boa, principalmente para as crianças e mulheres. Recentemente, o Talibã se instalou em Cabul, capital do Afeganistão, gerando muito medo e incertezas, principalmente para as mulheres. Com as retiradas das tropas estadunidenses, o plano do grupo se concretizou de forma ainda mais rápida. Além do Talibã até então ser contra ao acesso de mulheres à educação, existem muitos relatos das formas irreversíveis de silenciamento que sofrem, como, por exemplo, policias afegãs que são mortas simplesmente por fazerem seus trabalhos. Porém, mesmo com tantas mortes, tristezas e violações em geral, ainda existem pessoas que lutam por um Afeganistão melhor e livre. Iremos conhecer a seguir uma delas, a história da mulher que tem sido chamada de “a mulher mais corajosa do Afeganistão”, Malalai Joya.

Malalai Joya: ativista, feminista e política afegã

Malalai Joya com seguranças, em Kabul | Foto: Jason Motlagh

Malalai Joya é uma ativista e política nascida em 1978 em Farah, no Afeganistão, onde reside até os dias atuais. Criada nos campos de refugiados do Irã e do Paquistão, ela se tornou professora em escolas secretas para meninas e mulheres, escondendo seus livros sob a burca para que não pudesse ser pega pelo Talibã.

Além de ter sido escolhida pela Wolesi Jirga (17ª casa do povo afegão), Joya adquiriu a atenção internacional pela primeira vez em 2003, quando falou abertamente sobre ser contra o domínio dos senhores da guerra no Afeganistão, denunciando os crimes ordenados por comandantes militares. Ela também criticou o governo afegão de Karzai e seus apoiadores ocidentais, assim como o Talibã, que atualmente domina o país mais uma vez desde 2001.

Malalai foi eleita em 2005, onde se tornou uma das 68 mulheres presentes na Assembleia Nacional com 249 assentos, e era a mais jovem membro do parlamento afegão. Porém, ela foi expulsa por denunciar mortes e violações de direitos humanos, onde expressou seu desejo de ver todos aqueles que estão nos comitês constitucionais e em cargos governamentais sendo punidos pelos seus inúmeros crimes. Além disso, ela já recebeu inúmeras ameaças que refletem na sua vida até hoje.

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No filme dirigido pelo brasileiro Rodrigo Guim, Em nome do meu povo, sobre os últimos 40 anos de guerras do ponto de vista de suas vítimas, a ativista conta que muda de casa constantemente por conta das ameaças, e acrescenta que também sofreu sete tentativas de assassinato.

A questão da ocupação norteamericana no Afeganistão

Malalai Joya de mãos dadas com suas apoiadoras. Ela passa a maior parte dos dias cercada por apoiadoras e guardas armados em vários esconderijos no Afeganistão | Foto: reprodução

Nas diversas vezes que Joya se expôs ao mundo para denunciar os abusos que mulheres e crianças sofrem no Afeganistão sob o comando do Talibã, ela frisa que os Estados Unidos se aproveitaram da vulnerabilidade do grupo extremista para invadir o país junto à OTAN. Malalai ainda aponta que o regime misógino do Talibã foi substituído pelo regime dos senhores da guerra e que eles recebem muito apoio do Parlamento, pois há uma troca de poder. Portanto, segundo ela, não há diferença entre eles e o Talibã, pois ambos fazem com que a população sofra da mesma maneira.

Quando o expresidente George W. Bush ordenou o ataque ao Talibã no Afeganistão em 2001, ele assegurou que um dos objetivos da ocupação era de “libertar” as mulheres afegãs da repressão aos senhores da guerra. Todavia, não foi o que de fato aconteceu.

A ativista comenta em seu livro Raising My Voice e no filme citado anteriormente, Em nome do meu povo, que a população afegã enfrenta diversos inimigos. Além dos senhores da guerra, há o Talibã e seus padrinhos: os Estados Unidos, a Otan, além dos países vizinhos, Irã e Paquistão. Portanto, os problemas da nação se agravam cada vez mais. Além disso tudo, a falta de acesso às coisas essenciais é uma das maiores preocupações de Malalai.

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A maior parte da população feminina afegã, por exemplo, não tem acesso à educação, logo não sabem ler ou escrever. Malalai luta para que essas mulheres possam ser educadas e atuem na formação de suas identidades para que as mudanças ocorram. Outro problema grave no Afeganistão é a fome junto com a falta de remédios. Não há médicos especializados em cuidados com as mulheres e bebês. Além disso, também existe a violência doméstica.

Malalai prestando atendimento para mulheres afegãs em um dos hospitais criados por ela | Foto: divulgação

Nos últimos anos, Malalai Joya expressou sua preocupação com as mulheres que viviam fora de Cabul sob o domínio do Talibã. Em entrevistas ela relatou que a situação delas era extremamente grave. Do mesmo modo, tudo o que Joya não quer é que o mundo esqueça o Afeganistão. A ativista clama por mais apoio educacional e humanitário para toda a população, principalmente para as crianças, incluindo seu filho, que tem meses de vida e no qual não vive com ela por medo das ameaças que a mesma sofre.

Ao mesmo tempo, Malalai sempre rejeitou a “ajuda” oferecida pelos militares norteamericanos. Em seu livro, ela relata: “Sintome confiante de que se os países estrangeiros pararem de se intrometer no Afeganistão e se ficarmos livres da ocupação, então surgirá uma forte força progressista e democrática”. A afegã acredita que enquanto as tropas estrangeiras continuarem, o sofrimento será prolongado, pois a história mostra que apenas a própria nação é capaz de se libertar.

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Atualmente, com a ascensão do Talibã ao poder, o povo afegão passa por um momento bastante delicado e desesperador. Todos buscam uma saída do país, acampamentos provisórios estão sendo montados em outros países para recebêlos, mães estão jogando seus filhos para militares no avião, crianças e mulheres estão correndo risco de vida.

A última vez que o grupo governou o Afeganistão foi entre 1996 e 2001, período onde as meninas não podiam frequentar escolas, mulheres não podiam trabalhar e para saírem de casa eram obrigadas a cobrir seus rostos acompanhadas de um parente do sexo masculino. Aquelas que infringiam tais regras sofriam espancamentos e humilhações em público pela polícia religiosa do grupo sob a interpretação rígida da lei islâmica a sharia.

Nos últimos dias os líderes do Talibã garantiram ao ocidente que as mulheres teriam direitos iguais, de acordo com o que foi concedido pelo Islã, incluindo a capacidade de trabalhar e o acesso à educação. Mas, infelizmente, esse não é o cenário visto nas cidades já ocupadas. A situação atual do Afeganistão, portanto, é desastrosa. Há milhares de famílias em perigo.

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Autora convidada: Raquel Castro é futura internacionalista, viciada em música e apaixonada por pessoas inspiradoras e suas histórias. Escreve sobre o que lhe inspira.

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