As referências literárias de “The Tortured Poets Department”

As referências literárias de “The Tortured Poets Department”

Talvez você nunca tenha se perguntado o que acontece quando se mistura uma máquina de escrever, sentimentos conflitantes e um milhão de referências. Bem, Taylor Swift fez esse experimento, e o resultado foi um álbum duplo aclamado pelo público e pela crítica. The Tortured Poets Department estreou quebrando recordes mundiais: rendeu à cantora norte-americana o topo da Billboard 200 pela 14ª vez, além do recorde de maior semana de streaming para um álbum, com mais de 890 milhões de reproduções. O décimo primeiro trabalho de estúdio de Taylor se tornou, também, o álbum mais rápido a ultrapassar 1 bilhão de streams globais da história.

Capa de "The Tortured Poets Department", de Taylor Swift
Capa de The Tortured Poets Department, de Taylor Swift

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Em The Tortured Poets Department, Taylor aborda as fases de um relacionamento tanto no âmbito conjugal quanto individual, desde a paixão avassaladora até a compreensão de que quem antes parecia a pessoa perfeita apenas está causando danos emocionais profundos no narrador.

Em meio a tantas referências da própria vida, Swift abre brecha para a influência de um fator externo sempre muito presente em suas composições: a literatura.

Diretamente da diretoria do Departamento dos Poetas Torturados, aqui está um guia para as obras literárias referenciadas no 11º álbum de Taylor Swift, faixa por faixa:

The Tortured Poets Department: Dylan Thomas e Patti Smith

Na faixa-título do álbum duplo, Swift não se refere a uma obra literária em específico, mas sim a dois autores: Dylan Thomas e Patti Smith.

Dylan Thomas foi um poeta galês, conhecido por sua poesia intensamente emotiva e lírica. Sua primeira publicação, “Eighteen Poems“, lançada em 1934, reflete as influências do romantismo inglês, da cultura celta, bíblica e do surrealismo. Infelizmente, sua vida foi marcada por problemas de saúde decorrentes do abuso de álcool e drogas, o que levou à sua morte prematura em novembro de 1953.

Patti Smith, por outro lado, é uma renomada cantora, compositora e poetisa. Seus trabalhos abrangem performances musicais desde o lançamento de seu primeiro álbum, Horses, em 1975. Em 2007, Smith foi incluída no Rock and Roll Hall of Fame em reconhecimento ao seu impacto musical.

Como escritora, ela é conhecida por sua prosa evocativa e introspectiva. Sua obra Só Garotos (2010) ganhou o Prêmio Nacional de Literatura dos Estados Unidos na categoria de não ficção. Entre suas outras obras destacam-se Linha M (2016) e O Ano do Macaco (2019). A escrita de Smith explora temas como arte, amor e perda, e é profundamente conectada à boemia e ao movimento punk.

Dylan Thomas e Patti Smith, mencionados em "The Tortured Poets Department"
Dylan Thomas e Patti Smith, mencionados no álbum

Na composição de Swift, a personagem principal compara a si mesma e a seu par romântico com Thomas e Smith, sublinhando o quão diferentes são desses icônicos escritores e como sua relação pode parecer boba às vezes.

A canção também faz referência ao Chelsea Hotel, localizado em Nova York, um famoso local de moradia de escritores e artistas durante décadas. Apesar de viverem em épocas diferentes, tanto Thomas quanto Smith passaram algum tempo no Chelsea Hotel, imortalizando o lugar em suas obras.

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So Long, London: “O Grande Gatsby” – F. Scott Fitzgerald

Em uma canção que pode ser considerada o desfecho triste de London Boy” (Lover, 2019), Taylor Swift aborda a experiência de um relacionamento que está se findando de maneira dolorosa. A narradora descreve seus esforços exaustivos para manter a relação viva, mesmo enquanto enfrentava repetitivos momentos de frustração e tristeza.

A protagonista da canção se sente abandonada e traída, refletindo sobre a quantidade de tristeza que já suportou. Eventualmente, ela decide deixar o relacionamento, mesmo que isso a deixe ressentida e zangada, especialmente porque investiu tanto de sua juventude e doou tanto de seu sentimento para algo que estava desmoronando aos poucos.

As referências a uma das principais obras de F. Scott Fitzgerald, O Grande Gatsby, estão marcadas principalmente na antiga visão irrealista da personagem principal por um futuro muito específico e idealizado. Quando menciona “ferry lights through the mist” (“luzes da balsa através da neblina”, em tradução), para falar sobre enxergar uma espécie de relacionamento dos sonhos em meio a um período tempestuoso, ela referencia a luz verde escrita por Fitzgerald como simbologia do relacionamento de Jay Gatsby e Daisy.

Capa do livro "O Grande Gatsby", de F. Scott Fitzgerald
Capa do livro “O Grande Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald

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loml: “Apenas Garotos” – Patti Smith

A supramencionada Patti Smith retorna aos holofotes de The Tortured Poets Department na faixa “loml”. Sua obra Just Kids (Só Garotos, em português) conta sobre o relacionamento da autora com o fotógrafo Robert Mapplethorpe entre as décadas de 1960 e 1970, enquanto os dois viviam no também já mencionado Chelsea Hotel.

Swift faz alusão a esse livro ao descrever a relação dos protagonistas da canção, que eram “apenas crianças”. Tanto a música de Taylor quanto o livro de Smith falam sobre um romance que um dia foi incrível.

“We embroidered the memories of the time I was away

Stitching, ‘We were just kids, babe’”

“Nós costuramos as memórias do tempo que estive longe,

Bordando ‘éramos apenas garotos, amor’”

Capa de "Só Garotos", de Patti Smits
Capa de “Só Garotos”, de Patti Smith

The Albatross: “A Balada do Velho Marinheiro” – Samuel Taylor Coleridge

The Rime of the Ancient Mariner (A Balada do Velho Marinheiro, em português) é considerado um dos poemas mais importantes do poeta inglês Samuel Taylor Coleridge, além de ser um dos marcos do início da Literatura romântica na Inglaterra. No poema, Coleridge discorre sobre um marinheiro que, como punição por ter atirado em um albatroz, precisou andar com o animal morto pendurado em seu pescoço.

Na faixa “The Albatross”, Swift faz referência ao poema The Rime of the Ancient Mariner (A Balada do Velho Marinheiro, em português) de Samuel Taylor Coleridge. Este poema é um dos marcos da Literatura Romântica inglesa. Nele, Coleridge narra a história de um marinheiro que, como punição por ter matado um albatroz, é condenado a carregar o animal morto pendurado em seu pescoço.

Capa de "A Balada do Velho Marinheiro", de Samuel Taylor Coleridge
Capa de “A Balada do Velho Marinheiro”, de Samuel Taylor Coleridge

Na canção, Swift se compara ao albatroz, sugerindo que sua associação com seu amado poderia arruinar a vida dele.

“She’s the albatross

She is here to destroy you.”

“Ela é o albatroz

Ela está aqui para te destruir”

I Hate It Here: “O Jardim Secreto” – Frances Hodgson Burnett

A referência literária na música está praticamente escondida, mas é clara para os fãs de Swift. Quando Taylor escreve sobre os “jardins secretos” para os quais foge quando não se sente confortável em alguma situação, ela se refere diretamente à obra de Frances Hodgson Burnett, The Secret Garden (O Jardim Secreto, em português). Swift já declarou que lia este livro durante sua infância, e cita novamente esse fato nos versos da música.

Capa de "O Jardim Secreto", de Frances Hodgson Burnett
Capa de “O Jardim Secreto”, de Frances Hodgson Burnett | Imagem: Darkside Books

“I hate it here so I will go to secret gardens in my mind

People need a key to get to, the only one is mine

I read about it in a book when I was a precocious child”

“Eu odeio aqui, então eu vou para jardins secretos na minha mente

Pessoas precisam de uma chave para ir até lá, e a única é minha

Eu li sobre isso em um livro quando eu era criança”

Cassandra: O mito de Cassandra

Talvez a referência mais explícita do álbum, a faixa “Cassandra” tem influência direta da mitologia grega. Cassandra era uma profetisa que recebeu seu dom do deus Apolo, porém, com uma condição: deveria ceder a todos os desejos dele. A jovem, no entanto, rejeitou as investidas da divindade que a agraciou, e foi amaldiçoada para que suas profecias nunca fossem acreditadas. 

A faixa “Cassandra” tem influência direta da mitologia grega. Cassandra era uma profetisa que recebeu seu dom do deus Apolo, mas com a condição de ceder a todos os desejos dele. Quando rejeitou as investidas de Apolo, ela foi amaldiçoada para que suas profecias nunca fossem acreditadas.

Em sua composição, Swift fala sobre momentos em que suas argumentações a favor, em meio a desentendimentos públicos, foram confirmadas posteriormente. A canção aborda a tendência recorrente de sua imagem pública e como a mídia, que costumava condená-la, agora está interessada em ouvir sua versão dos fatos.

Cassandra pintada por Evelyn de Morgan
Representação de Cassandra pintada por Evelyn de Morgan | Imagem: Wikipédia

“So, they killed Cassandra first ‘cause she feared the worst

And tried to tell the town

So, they filled my cell with snakes, I regret to say

Do you believe me now?”

“Então, eles mataram Cassandra primeiro, porque eles temiam o pior

E tentaram contar à cidade

Então, eles encheram minha cela de cobras, lamento dizer

Você acredita em mim agora?”

The Bolter: “A Procura do Amor” – Nancy Mitford

A faixa 29, intitulada “The Bolter”, narra a história de um romance destinado ao fracasso, visto da perspectiva de uma garota que gosta de se arriscar, mas sempre foge dos relacionamentos. Seus amigos a chamam de “the bolter” (a fujona) por sua tendência de escapar dessas situações.

Uma história semelhante se encontra nas páginas de The Pursuit of Love (traduzido como A Procura do Amor), de Nancy Mitford. No livro, a personagem Fanny é apelidada de “The Bolter”, por conta de sua tendência a abandonar tudo por um novo parceiro. Tal característica pode também ser considerada um flerte com a reputação criada e alimentada pela mídia acerca dos relacionamentos de Taylor.

Capa de "A Procura do Amor", de Nancy Mitford"
Capa de “A Procura do Amor”, de Nancy Mitford”
Ao analisar as letras das músicas, é possível compreender porque Taylor Swift se tornou uma das maiores artistas da atualidade. Ela entrelaça sua vida real com histórias de ficção que marcaram sua vida, criando composições que ressoam profundamente com seus ouvintes fiéis.

Incorporando elementos literários em suas letras, Swift cria novos universos, onde os ouvidos e corações dos ouvintes se conectam com as melodias e narrativas criadas pela cantora.

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Uma jornalista apaixonada por música, literatura e cinema. Seus maiores hobbies incluem criar playlists para personagens fictícios e falar sobre Taylor Swift nas redes sociais.
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