Beyond: Two Souls é um daqueles jogos que consegue misturar drama, ação, suspense e mistério perfeitamente. A jogadora encontrará muito mais que respostas para os acontecimentos misteriosos que cercam a protagonista Jodie Holmes, interpretada pela incrível Ellen Page, ao lado de Aiden, uma entidade sobrenatural que a acompanha desde o nascimento. A medida certa entre inocência e doçura quase infantis, com a força descomunal para enfrentar uma vida inteira de desafios e todo tipo de violência, faz de Jodie uma heroína incansável! Acredite, desistir de encontrar a verdade sobre sua origem para, enfim, conquistar a tão sonhada liberdade, não faz parte do vocabulário da personagem, uma inspiração para qualquer um que luta para (apenas) ser quem é.

Lançado em 2013 pela Quantic Dream exclusivamente para Playstation 3 e remasterizado em 2015 para o Playstation 4, Beyond: Two Souls é um drama interativo de ação-aventura. Recheado com sequências de fuga alucinantes, momentos de exploração e muito suspense e mistério, pode ser jogado solo ou em dupla: na primeira opção é necessário alternar entre Jodie e Aiden; na segunda, cada jogadora deve assumir um personagem. Como Jodie, é possível interagir com objetos e com outros personagens com quem a jogadora interage para desencadear ações e prosseguir na história. Outro detalhe legal é que a perspectiva, ao controlar Jodie, é sempre em 3ª pessoa, enquanto que com Aiden, joga-se em 1ª pessoa – um recurso muito inteligente, visto que a entidade não possui um corpo físico.
Jogar com Aiden é muito divertido! Ele pode movimentar e quebrar objetos, explodir lâmpadas e câmeras, atravessar paredes e até possuir personagens, ajudando Jodie com seu “corpo etéreo” de um jeito que não conseguiria se fosse de “carne e osso”. Além disso, Aiden também pode curar, canalizar memórias e asfixiar inimigos, se for necessário para a segurança de sua parceira. O único porém (e que existe justamente para tornar o jogo mais balanceado) é que a entidade não pode se afastar muito de Jodie, ou então a tela ficará escura e não será possível continuar.

Beyond: Two Souls é voltado para tomada de decisões e repleto de Quick Time Events (QTE), ações que precisam ser executadas repetidamente e em momentos específicos para que algo aconteça no enredo do jogo (como apertar X repetidamente para escapar de um agressor, por exemplo). No entanto, apesar de insinuar que há muitas opções e liberdade de escolha, a história “original” permanece a mesma independente dos rumos que a jogadora tomar. Basicamente, se você escolher ser mais calma ou uma assassina fria, o desfecho será o mesmo ao fim de cada capítulo.
Apesar disso, a narrativa é simplesmente incrível e você vai terminar o jogo com um “OMG que plot twist foi esse?!”. A jogadora assumirá o controle de uma Jodie criança (com apenas 8 anos em um laboratório para estudos de atividades paranormais), passando por uma adolescência difícil (meio rebelde, mas no fundo, ela só quer ser normal), e até como uma jovem adulta (dividida entre o treinamento militar, a busca por relacionamentos saudáveis e a fuga para manter-se viva e segura). Aiden também parece ter esse amadurecimento ao longo do jogo, mas o destaque fica para a relação entre eles, que vai de uma cumplicidade fraternal até um ciúme um tanto doentio. Mas acredite, mesmo assim você não vai terminar o jogo odiando o Aiden!

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Em 26 capítulos a jogadora vai ficar emocionada com a história de Jodie e Aiden, o profundo envolvimento entre os dois e a busca por respostas para essa ligação misteriosa. Vai passar raiva por saber como Jodie foi treinada para controlar Aiden e, mais tarde, usar seu poder para fins políticos. E vai se solidarizar ao ver suas tentativas incessantes para ser “normal” e aplacar a enorme solidão que sente por não ser. Mas Jodie também encontrará boas pessoas pelo caminho, entre aqueles que querem usá-la ou simplesmente eliminá-la (por não ser mais necessária ou por ser poderosa demais para ser contida). Em cerca de 10 horas de gameplay, a jogadora fará uma viagem no tempo e a muitos locais no mundo tentando resolver essa trama misteriosa, e não há um momento em que não sintamos empatia por Jodie.

Isso porque ela sofre, e muito! Desde violência física até psicológica e emocional: no Departamento de Atividades Paranormais (DPA) ou com sua família e aqueles que não conseguem compreendê-la; quando é perseguida e encurralada; ou em todas as vezes que foi usada para alcançar objetivos imorais, sob a bandeira da segurança nacional, sem nem desconfiar. Se pensarmos que Jodie apenas queria viver uma vida normal, é impossível não ficar angustiada ao saber o quanto as pessoas podem ser cruéis e mesquinhas para satisfazer desejos egoístas e alcançar poder. E se, ao ler isso, você consegue fazer um paralelo com a nossa realidade, esse jogo é sim para você, querida leitora.
Usando uma alegoria cheia de eventos paranormais, Beyond: Two Souls é mais do que o tema sugere: o jogo é sobre aceitar o que é diferente, sobre ser empático, sobre não tentar se dar bem em cima do sofrimento alheio ou das vantagens que alguém pode oferecer. E é claro, se considerarmos o histórico de luta e militância de Ellen Page, temos a certeza de que não poderiam ter escolhido atriz melhor para representar uma personagem que sofre tanto com o preconceito e a discriminação por ser apenas diferente.

Falando agora sobre termos técnicos, Beyond: Two Souls revolucionou em muitos sentidos, a começar por não seguir uma linha temporal contínua. É preciso avançar e voltar no tempo, como se assistíssemos a partes desconexas de um filme fragmentado, mas que juntas formam uma obra coerente e incrível. Na edição remasterizada é possível jogar linearmente, mas a narrativa fica melhor como apresentada na primeira versão. E os gráficos são sensacionais, mesmo! O que já era esperado, considerando a produção super cuidadosa de Heavy Rain e também da Quantic Dream (aliás, o título mais recente, Detroit Become Human, apenas reiterou a preocupação da desenvolvedora com a qualidade de seu trabalho).
Em alguns momentos, a movimentação parece um pouco engessada, mas as feições, a captura de movimentos faciais e as expressões dos atores impressionaram logo no lançamento. Beyond: Two Souls foi considerado um jogo para a próxima geração de consoles – e é importante destacar que, na versão remasterizada, a qualidade manteve-se praticamente a mesma, com uma ligeira melhora no polimento e iluminação, reiterando as primeiras impressões de 2013. A sincronização entre animação e dublagem também é destaque, além da participação de Willem Dafoe como o cientista Nathan Dawkins. Os efeitos e a trilha sonora são muito imersivos e deixam a jogadora ligada em tudo o que pode acontecer, às vezes até preocupada com a possibilidade de Jodie ser pega por agentes federais ou entidades malignas.

E o jogo todo é muito imersivo. Todos os recursos, e principalmente a história, fazem com que a jogadora queira desvendar os mistérios que rondam esta dupla sobrenatural super querida. Se tiver tempo livre e disposição, dá para terminar o jogo em apenas um dia facilmente, já que a cada capítulo fica aquela sensação de “e agora, o que vai acontecer com Jodie e Aiden?”. E com 6 finais possíveis, não dá para reclamar de conteúdo! Se você quiser conhecer os outros futuros possíveis, ou simplesmente sentir falta de Beyond: Two Souls, é só voltar a jogar com calma, prestar atenção nos detalhes desta narrativa sensacional e, é claro, nas escolhas que podem mudar a vida de Jodie Holmes, nossa heroína doce, forte e inspiradora!