Sia: há mais de 25 anos cantando como um pássaro livre

Sia: há mais de 25 anos cantando como um pássaro livre

Cantora, compositora, produtora e diretora, Sia já carrega mais de 25 anos de carreira com diversos hits que ganharam o mundo e vários recordes musicais. É considerada uma das maiores e mais consistentes artistas da atualidade. Mas entre suas letras bem construídas, sua voz potente e os ritmos dançantes e marcantes, alguns ainda não sabem que, para conseguir ganhar o mundo, Sia precisou salvar a si mesma.

Nascida em Adelaide, na Austrália, em 1975, Sia Kate Isobelle Furler gostava de cantar e imitar Aretha Franklin e Stevie Wonder quando criança. Hoje, ela é conhecida por hits como “Chandelier”, “Cheap Thrills” e “Titanium”, pela composição de hits de outras cantoras e pela forma única como evita mostrar seu rosto, quase sempre encoberto por uma enorme peruca loira.

Crisp e Healing Is Difficult: o início da carreira de Sia

A carreira musical de Sia teve início entre 1994 e 1995, quando a cantora começou a contribuir com a banda de acid jazz Crisp, junto com a qual lançou um disco, “Word and The Deal” (1995), e um EP, “Delirium” (1997). A banda acabou pouco após o lançamento do EP. Porém, no mesmo ano, Sia assinou com a Flavoured Records e lançou seu primeiro álbum, “OnlySee“, ainda sob o nome Sia Furler.

Após isso, Sia mudou-se para Londres e começou a trabalhar como backing vocal para a banda Jamiroquai e, depois, contribuindo para os vocais dos três primeiros discos da banda Zero 7. Em 2001, ela assinou com a Dance Pool, parte da gravadora Sony Music, um contrato de gravação que resultou no single “Taken for Granted” entrando rapidamente no top 10 do UK Singles Chart.

Healing Is Difficult
Healing Is Difficult (Imagem: reprodução)

O segundo álbum de Sia veio no mesmo ano. “Healing Is Difficult” trouxe misturas de jazz e soul com letras potentes nas quais a cantora lidava com a morte do seu primeiro amor. Apesar do sucesso e da consistência do álbum, após o disco, Sia acabou rompendo com a Sony Music por desgostar da forma como a produção havia sido promovida, assinando para seu segundo disco com a Go! Beat, parte da Universal Music Group.

Colour the Small One e Some People Have Real Problems

Em 2004, com a nova gravadora, vem “Colour the Small One“, álbum que alavanca de vez Sia para o reconhecimento da qualidade de sua música. Com uma pegada diferente dos álbuns anteriores ao combinar notas acústicas com batidas eletrônicas, o disco teve quatro singles, incluindo “Breath Me” e “Where I Belong“.

O disco, entretanto, apesar do reconhecimento de sua qualidade, também causou incômodo em Sia por seu marketing pouco focado e divulgação escassa, o que acarretou nova mudança da cantora, desta vez para Nova York em 2005. Na mesma época, a canção “Breathe Me” fez parte da última cena da série da HBOSix Feet Under“, colocando a cantora nos holofotes e promovendo maior busca por seu nome e seu trabalho musical.

Sia em concerto
Sia em concerto (Foto: Kris Krug/reprodução)

Em 2008, era lançado mundialmente “Some People Have Real Problem“, quarto álbum de Sia. Com um estilo mais próximo do pop, o disco alcançou disco de ouro na Austrália e o número 26 no top 200 da US Billboard, seu primeiro disco a entrar nos charts. Três singles do álbum – “Day Too Soon, The Girl You Lost to Cocaine” e “Soon We’ll Be Found” – chegaram a marcas históricas nos charts ao redor do mundo.

A carreira de Sia como compositora e a pausa dos palcos

As baladas bem trabalhadas e potentes do quarto disco chamaram a atenção de Christina Aguilera e a cantora convidou Sia a compor músicas para seu próximo disco. Três músicas de “Bionic”, sexto disco de Aguilera, foram lançadas em colaboração com Sia – e, mais tarde, Sia também participou da composição de “Bound to You“, para o filme “Burlesque” (2010) estrelado por Christina e performado num dueto com Cher.

Sia com Christina Aguilera (Imagem: reprodução)
Sia com Christina Aguilera (Imagem: reprodução)

Logo em seguida, Sia lança “We Are Born“, seu quinto álbum, novamente alcançando disco de ouro na Austrália e sendo indicada no APRA Music Awards para Música do Ano pelo single “Clap Your Hands“. O sucesso dos dois últimos álbuns e das colaborações com Aguilera trouxeram duas principais situações na vida da cantora: a fama intensa e a procura para novas colaborações como compositora.

Com a fama e os holofotes incomodando o seu desejo de ter uma vida privada, Sia decidiu se aposentar temporariamente de novas gravações e focar no trabalho como produtora e compositora pelo período de 2010 a 2013, colaborando com artistas como Beyoncé, Kylie Minogue, Flo Rida, Rihanna e David Guetta. Com o último, em 2011, Sia entrou novamente nos top 10 dos charts pelo single “Titanium“, originalmente escrito para Alicia Keys.

100 Forms of Fear
Capa do álbum 100 Forms of Fear (Imagem: reprodução)

100 Forms of Fear e a volta às gravações

No final de 2013, após três anos de pausa, o single “Elastic Heart” estourou nas paradas como uma parceria de Sia com The Weeknd e Diplo para a trilha sonora de “Jogos Vorazes: Em Chamas“. No ano seguinte, a australiana produziu o primeiro EP de Brooke Candy, “Opulence“, e co-escreveu três músicas do disco.

Posteriormente, seu sexto álbum de estúdio, “100 Forms of Fear” foi lançado ao mundo e alcançou, ainda na semana de estreia, o número 1 no top 200 da US Billboard e, ao longo do ano seguinte, disco de prata pela British Phonography Industry, primeiro nos charts da Austrália e top 10 dos charts europeus. No começo de 2016, o álbum já passava 1 bilhão de cópias vendidas.

Além de “Elastic Heart”, o disco abrigou “Chandelier“, colocando Sia pela primeira vez na lista de Hot 100 da Billboard e vendendo 2 milhões de cópias em um ano, o que rendeu à cantora quatro nomeações no Grammy Awards de 2015, “Eye of The Needle” e “Big Girls Cry“.

Foi nas performances ao vivo das músicas do disco que Sia optou por não mostrar seu rosto, ou evitando diretamente olhar a plateia ou se escondendo com a enorme peruca loira que se tornou sua marca. Também neste disco começou a parceria de Sia com Maddie Ziegler, dançarina infantil que desde então aparece em quase todos os clipes da cantora.

Maddie Ziegler (Imagem: reprodução)

This Is Acting

Mantendo suas baladas potentes e evoluindo para letras ainda mais pessoais, Sia lança em 2016 seu sétimo álbum, “This Is Acting“. O disco foi uma surpresa inclusive para a cantora, que havia dito em entrevistas que “100 Forms of Fear” seria sua última gravação para focar-se apenas em escrever para outros artistas, mas a repercussão dos singles e o reconhecimento a fizeram resgatar o gosto pela gravação e produção de novas músicas.

Músicas como “Unstoppable“, “Bird Set Free“, “Reaper” e “Cheap Thrills” ganharam as paradas e cimentaram a marca de Sia de letras potentes, pessoais e necessárias em instrumentais muito bem produzidos e compassados. Com a aclamação do disco, a cantora se apresentou no Coachella Festival em uma performance épica que se tornou viral online e agregou críticas positivas. Era seu primeiro show completo desde 2011.

A partir do Coachella, Sia performou em mais série de shows pelo mundo e lançou um novo single, “The Greatest“, novamente com Maddie como parte do videoclipe. Sua turnê seguinte, Nostalgic for the Present Tour, foi performada inteira com a parceria da dançarina.

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Everyday is Christmas e LSD

Em 2017, já na Atlantic Records, Sia lançou o disco “Everyday Is Christmas“, composto apenas de músicas originais. Os singles “Santa’s Coming For Us” e “Snowman” foram performados na final da 13ª temporada no The Voice USA e ao vivo no The Ellen DeGeneres Show com Maddie Ziegler.

Em 2018, Sia formou parceria com o britânico Labirinth e com o americano Diplo, formando o grupo LSD, inicialmente para o lançamento de quatro canções produzidas pelos três, mas que acabou se desdobrando em um álbum completo – “Labirinth, Sia & Diplo Presente… LSD” – com mais seis músicas além das quatro iniciais, incluindo o single “No New Friends“.

Sia em lançamento do LSD
Sia em lançamento do LSD (Imagem: reprodução)

A saúde mental nas produções de Sia

Para além dos ritmos potentes, Sia é uma das maiores embaixadoras pelo cuidado com a saúde mental e pela quebra dos preconceitos que sufocam as pessoas que convivem diariamente com uma saúde mental atípica. Desde o lançamento do álbum “Healing Is Difficult“, em 2001, a cantora começou a usar o espaço que possuía na música e em suas formas de arte para falar abertamente sobre os obstáculos que enfrentou com a própria saúde mental, buscando conseguir ajudar outros em situações semelhantes.

Sia passou por problemas graves com o abuso de álcool e de medicamentos. Algumas de suas músicas mais famosas falam sobre a questão e sobre a dualidade de tentar apaziguar este problema. Em “Chandelier“, ela diz “Garotas de festa não se machucam, não sentem nada”, e, logo após, conta “um, dois, três, beba, bebo todas até perder a conta”, ilustrando a forma sem controle com que o abuso se forma. No refrão, a frase “I’m gonna fly like a Bird through the night, feel my tears as they dry” é uma referência ao uso do álcool como uma forma – errada – de fugir de outros sentimentos que precisariam ser confrontados.

Sia
Sia (Imagem: reprodução)

Também há, ao se analisar as letras de Sia, duas fases nas composições que evidenciam a sua jornada em busca de ajuda e de estar bem consigo mesma. “Breathe Me“, lançada em 2004, é a que melhor desenha a primeira fase, ilustrando o sufocamento que problemas como a depressão e, para Sia, a convivência com o transtorno bipolar podem acarretar para a autoestima e o autoconhecimento. Na música, ela pede ajuda: “Socorro, eu fiz novamente (…) eu me machuquei novamente hoje”. Na sequência, na continuação do pedido de ajuda, ela pede por um amigo, por alguém que a acolha e a conforte, um dos maiores obstáculos de quem convive com instabilidade na saúde mental.

A segunda fase se inicia com “Elastic Heart“, quando a cantora começa a inserir em suas letras mais força e mensagens direcionados à forma como se vê e se sente. “Você não me quebrou. Ainda estou lutando por paz porque eu tenho uma pele grossa e um coração elástico.”

Em seguida, com a canção “Bird Set Free“, Sia deixa de forma mais explícita e primorosa a mensagem que busca enviar ao se abrir desta forma em sua arte sobre seus obstáculos pessoais: “Há um grito preso que todos tentamos esconder, nós seguramos firme, mas eu não quero morrer (…) Eu não me importo se canto fora do tom, eu me encontro nas minhas melodias. Eu canto por amor, eu canto por mim. Eu vou gritar como um pássaro livre”.

SiaSia (Imagem: reprodução)

Sia faz parte de diversos grupos ativistas pelos cuidados com a saúde mental e pelos direitos dos animais. Falando abertamente sobre como é conviver com a depressão, o transtorno bipolar e, sempre com delicadeza, sobre os abusos de substâncias que a levaram a uma tentativa de suicídio, Sia busca enviar apoio àqueles que também lutam diariamente contra depressão, ansiedade e outras formas de atipicidade na saúde mental.

A sociedade tende a estigmatizar e a tratar de forma preconceituosa e ignorante tais pessoas, no entanto, a forma como Sia torna pública a sua história e a insere na sua arte e formas de expressão trazem uma representação extremamente necessária para que possamos, finalmente, levar a saúde mental à importância que merece.


Edição realizada por Isabelle Simões.

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Jornalista, fotógrafa, feminista e lésbica cearense. Ariana torta e viciada em qualquer série, filme ou livro que tenha mulheres amando mulheres, tem voltado sua atuação à defesa dos direitos humanos e à luta por visibilidade e representatividade lésbica. Não dispensa uma pizza ou uma balinha de gengibre das que vendem no ônibus. Nas horas vagas se atreve a escrever ficção científica.
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