8 livros para mergulhar no melhor do horror contemporâneo

8 livros para mergulhar no melhor do horror contemporâneo

Aproveitando a última semana de outubro, no clima de terrorzinho, montamos essa lista com oito indicações de livros para mergulhar no melhor do horror literário contemporâneo. Apreciem!

Por Laís Fernandes

O Corpo Dela e Outras Farras – Carmen Maria Machado

O Corpo Dela e Outras Farras - Carmen Maria Machado

A primeira obra da autora norte-americana Carmen Maria Machado a ser publicada no Brasil chegou a ser chamada de “Black Mirror feminista”, por tratar de temas parecidos com os da série de ficção científica da Netflix, porém a escrita da autora é originalíssima e vai muito mais além do que a comparação: as representações femininas são, de fato, o que nos norteiam pelos oito contos da obra, histórias carregadas de sentimentos, sendo o medo aos quais somos submetidas pelo fato de sermos mulheres o principal deles.

Em “O Corpo Dela e Outras Farras“, Carmen utiliza a imagem do corpo feminino como ponto de partida. Cada conto possui algo em estreita relação à uma das partes do corpo da mulher, a iniciar pela história “O Ponto do Marido”, que além de falar sobre a violência obstetrícia em que a mulher é submetida à uma costura na entrada da vagina para tornar a passagem mais “apertada”, fala sobre o ponto de vista, as influências e a falta de limites que o marido da protagonista exerce ao tentar a qualquer custo arrancar uma fita verde que a esposa possui no pescoço, desrespeitando constantemente o desejo dela de manter aquele artefato intocado.

Os demais contos da coletânea abordam, ainda, o apagamento que a mídia e a moda exercem no corpo das mulheres, silenciando-as e colocando-as em um panorama invisível perante quem realmente são; métodos alimentares autodestrutivos em busca de um corpo perfeito; as dificuldades decorrentes de relacionamentos em uma sociedade literalmente doente; traumas do passado que com frequência voltam para nos assombrar, dentre outros temas importantes e que nós, mulheres, mais do quaisquer outras pessoas, entendemos muito bem o quão aterradores podem ser.

Cada conto é protagonizado por mulheres bem diferentes entre si. Por ser lésbica, Carmen Maria Machado visibiliza mulheres lésbicas e bissexuais em suas tramas, o que torna a obra ainda mais relevante para as discussões em nosso cenário atual. Sem contar que a escrita da autora é envolvente, consegue manter o suspense em certas narrativas e deixa o final em aberto em algumas outras, as quais nos pegam pelo coração e continuam conosco muito após o final da leitura.

Pássaros na Boca – Samanta Schweblin

Horror Contemporâneo: Pássaros na Boca - Samanta Schweblin

Premiada autora argentina, e uma das escritoras mais elogiadas de sua geração, Samanta Schweblin aborda as estranhezas que podem derivar das relações familiares nos contos de “Pássaros na Boca“. Insólito e realidade andam de mãos dadas em sua obra, desde uma situação que envolve a separação dos pais de um garotinho perto do Natal, o que deixa marcas na lembrança dele, até de pais precisando lidar com a filha que passa a se alimentar apenas de pássaros, conto que dá título ao livro.

Por ser formada em Cinema, Samanta trabalha em suas histórias com um ritmo cinematográfico; os contos, compostos em poucas páginas, são dinâmicos e instigam leitoras e leitores a avançarem rapidamente na leitura, desfrutando de tramas originais, apesar da simplicidade e objetividade do texto da autora. Algo muito interessante na narrativa de Samanta é a construção psicológica de suas personagens.

Dentro de seu tema central, que é o desdobramento que as relações humanas podem acarretar na vida das pessoas, podemos observar claramente quais papeis desempenham os personagens de cada uma das tramas, suas profundidades e tridimensionalidades, que, de tão ricas, podem ser facilmente trazidas para nosso cotidiano.

A Fúria – Silvina Ocampo

Horror Contemporâneo: A Fúria - Silvina Ocampo

Silvina Ocampo foi uma das grandes e importantes autoras do realismo fantástico latino-americano. Nascida na Argentina, a autora tem sua primeira obra publicada no Brasil, “A Fúria“, na qual temos contato com toda a criatividade dela através de contos que evocam o misticismo, as intrigas entre familiares e amigos, e as angústias internas de personagens capazes de fazerem atrocidades para saírem por cima de qualquer situação.

É interessante reparar em como a autora trabalha as personalidades de suas personagens, expandindo conflitos para acontecimentos inimagináveis. A prosa de Silvina é dotada de lirismo, o que acrescenta ainda mais beleza ao caos que cada um dos contos se propõe a mostrar.

Por Nathalia de Morais

Sempre Vivemos no Castelo – Shirley Jackson

Horror Contemporâneo: Nós Sempre Vivemos no Castelo - Shirley Jackson

Nós Sempre Vivemos No Castelo” é um daqueles livros na sessão clássica. Página após página, somos envolvidas pela narrativa sufocante de Shirley Jackson, cujo fio condutor é Merricat Blackwood: uma protagonista que não temos plena confiança, mas confiança é apenas um ponto de vista.

A jovem de apenas dezoito anos mora isolada na mansão que, outrora sua família, tomada por uma tragédia, viveu em toda sua glória privilegiada. Agora apenas Merricat, sua irmã Constance e seu tio Julian, vivem no casarão, sobreviventes do episódio que levou todos os outros. 

Os três são ferrenhamente odiados pelos moradores da cidade e aos poucos, página após página, somos levadas por especulação, suspense e a presença constante do mistério pairando em nossos ombros. A população culpa aqueles que residem dentro da casa deixada pelos mortos, e os que nela vivem habitam em harmonia entre si, mas em conflito com o mundo.

Leia também:
>> A Balada do Black Tom: O universo Lovecraftiano pelo olhar de um homem negro
>> Final Girl: a discussão de gênero nos filmes de terror
>> Cat Person e Outros Contos: o horror que decorre das relações humanas

Merricat abraça a raiva e amargura como seus únicos amigos além de Constance, e quem há de falar que a menina não pode se defender, quando a cidadezinha onde cresceu fomenta o ódio crescente em seu coração? Merricat cresce, introspectivamente, já seus pensamentos progridem em velocidade perigosa quando um jovem charmoso entra em sua vida e ela desconfia que a intenção dele não é aquela que ele diz ser; mas ao mesmo tempo, precisa da convivência. Entre o visitante, Merricat, o mistério e os moradores da cidade, o que acontecerá? Ninguém sabe dizer, apenas o gato de estimação da protagonista, que tem comportamento estranho e parece que anda em todo lugar.

Essa obra não aparece pela primeira vez aqui no Delirium e provavelmente não será sua última aparição, visto sua leitura prazerosa, que te envolve dentro do fascinante universo macabro que é a mente de Merricat. A escrita especulativa de Shirley Jackson sempre foi um reflexo de sua vida pessoal, e aqui, a agorafobia se apresenta no centro da trama. 

As Sobreviventes – Riley Sager

Horror Contemporâneo: As Sobreviventes - Riley Sager

Com o título original de “Final Girls”, o livro de Riley Sager (pseudônimo do autor Todd Ritter) não recai propriamente no “horror” mas é uma dica de leitura repleta de protagonismo feminino e cujo gênero thriller e suspense acaba despertando alguns sentimentos: é terror ou não?. Muitos consideram, outros não. O fato é que o gênero de sobrevivência é sim uma constante do horror e esse livro entrega muito bem em sua sinopse sobre o que ele é:

“Há dez anos, a estudante universitária Quincy Carpenter viajou com seus melhores amigos e retornou sozinha, foi a única sobrevivente de um crime terrível. Num piscar de olhos, ela se viu pertencendo a um grupo do qual ninguém quer fazer parte: um grupo de garotas sobreviventes com histórias similares. Lisa, que perdeu nove amigas esfaqueadas na universidade; Sam, que enfrentou um assassino no hotel onde trabalhava; e agora Quincy, que correu sangrando pelos bosques para escapar do homem a quem ela se refere apenas como Ele.” 

Descrito por Stephen King como o melhor thriller de 2017, “As Sobreviventes” fala sobre trauma, navega por relações humanas e nos mostra as consequências que um episódio de horror pode ter na vida de alguém, não apenas através da  construção de um massacre e tragédia coletiva, como na cicatriz que surge na vida da protagonista desta história. 

O elemento psicológico da trama é de bastante fluido e contribui muito para a leitura, onde a protagonista nos leva entre alternadas linhas do tempo de sua vida em suas memórias. Fica aqui a sugestão de algo que flerta com as obras de Gillian Flynn, ao mesmo tempo remete ao conceito da “final girl” presente inicialmente nos filmes de terror. 

“As Sobreviventes” entrega uma trama coesa, que vai te querer deixar de lado o que está fazendo para voltar ao mundo das sobreviventes.

Coraline – Neil Gaiman

Horror Contemporâneo: Coraline - Neil Gaiman

Um daqueles livros que ficam em todas as listas! Não por acaso. “Coraline” vive no imaginário popular desde seu lançamento e existe até mesmo uma grande mística ao seu redor: certa geração que viveu sua pré-adolescência nos anos 2000, se orgulha bastante em ter lido essa obra de Neil Gaiman no período onde era muito debatida. Quem nunca leu, não pode perder a oportunidade, e quem já se debruçou nas páginas desse terror fantástico, com certeza consegue fazer uma releitura sem muita dificuldade. Para aqueles que se preocupam com o público-alvo sendo infanto-juvenil, devem deixar o franzir do cenho de lado: o elemento fantasia, a escrita e a personagem são incríveis.

Além disso, a consternação com a determinação etária não tem de ser determinante em todas as obras. Dê uma chance para um dos maiores clássicos de Neil Gaiman junto com a menina título e protagonista, que nos abre portas para seu universo repleto de… Solidão.

Páginas são atravessadas numa aventura de horror, ambientação inventiva e uma narração bastante fluída. A premissa de “Coraline” é simples: a jovem, que vive negligenciada por seus pais dentro de casa, acha uma porta para um universo alternativo. Sua primeira noite nele é assustadora, porém curiosa e bem sucedida. No dia seguinte, descobre que seus pais se foram. Ela precisa trazê-los de volta e descobrir sozinha que nem sempre as aparências te entregam a realidade.

Um livro ideal para aquelas leitoras e leitores que carregam uma coragem mais razoável, fraquinha, para quem não gosta de ler livros de terror pela noite ou simplesmente deixa de ler qualquer conto do gênero. Como um extra, vemos ilustrações feitas por Dave McKean, nos entregando mais do clima sombrio que Gaiman tenta – e consegue – construir em seu feito para todas as idades, para os mais corajosos e para os que gostam de abraçar o cobertor enquanto leem. Não que os bravos ou amantes rotineiros do terror não gostem de abraçar um bom cobertor enquanto tomam um susto vez ou outra! É comum, não se preocupe, segure na mão de Coraline e vá atrás da porta.

Por Jéssica Reinaldo

A Sombria Queda de Elizabeth Frankenstein – Kiersten White

A Sombria Queda de Elizabeth Frankenstein - Kiersten White

Frankenstein, ou O Prometeu Moderno” foi uma das primeiras histórias de ficção científica e horror, ajudando a definir as estruturas de ambos os gêneros como conhecemos hoje. A criatura de Frankenstein, que foi posta nesse mundo sem nenhum auxílio, após seu criador perceber que teria cometido uma loucura, se tornou um grande símbolo para compreendermos a humanidade e tantas outras questões. E, não raro, dada sua importância para a literatura mundial, encontramos algumas releituras da obra por aí. Nem sempre elas fazem justiça à obra publicada em 1818 por Mary Shelley, mas algumas chegam muito perto.

A Sombria Queda de Elizabeth Frankenstein” é uma dessas obras, narradas a partir da visão de Elizabeth, uma personagem que não tem tanta importância assim na obra original, mas que neste livro ajuda a subverter algumas questões do romance de Shelley. Se você é daquelas leitoras de Frankenstein que acha que Victor era um pobre cientista, e que fez o que poderia para evitar tragédias maiores, esse livro pode mudar sua visão sobre isso.

Kiersten White nos apresenta uma protagonista que possui um desejo de sobrevivência muito grande, ousada para os costumes da época. Ela não se abate de forma alguma e não é somente uma personagem passiva diante da história. A autora altera alguns fatos da história original, mas isso não chega a ser um problema, pois são alterações atraentes para a leitura.

Lançado no Brasil pela Plataforma 21, com tradução de Lavínia Fávero, é um livro delicioso de ler, onde acompanhamos Elizabeth e Victor Frankenstein desde a infância. Outros trabalhos da autora também podem instigar a curiosidade da leitora, como a obra “Caçadora“, livro baseado no universo da série “Buffy, A Caça Vampiros”, que se passa após alguns anos do último episódio, com personagens novos.

Príncipe Drácula – Kerri Maniscalco

Príncipe Drácula - Kerri Maniscalco

O século XIX foi um século de descobertas, com diversas obras literárias e transformações. Também foi um período de dificuldades para questões da representação feminina na literatura. Algumas das histórias mais lembradas neste período acabaram criando péssimos estereótipos, utilizados exaustivamente nos anos seguintes, como é o caso da “dama em perigo” e da “femme fatale”.

Mas a partir de um trabalho incrível de ressignificação e releitura, alguns personagens de histórias antigas e conhecidas estão ganhando novas camadas, como o já citado “A Sombria Queda de Elizabeth Frankenstein”. No caso da série “Rastros de Sangue“, de Kerri Maniscalco, temos a magnífica Audrey Rose, uma personagem que possui falhas e paixões irrefreáveis que acabam a transformando, por vezes, em uma pessoa pouco racional, mas com um forte senso de justiça e vontade de estar onde deseja.

Audrey Rose, no primeiro livro da série Rastros de Sangue: Jack, O Estripador, nos deu um vislumbre inicial de uma mulher extraordinária que planeja seguir a carreira forense, mas que sofre com as dificuldades decorrentes do seu gênero. Participando das aulas de seu tio ao mesmo tempo que esconde sob o disfarce de um homem, a personagem fica entre a cruz e a espada ao descobrir quem realmente é o vilão da história, no entanto ela sempre opta pelo melhor a ser feito.

Em “Príncipe Drácula“, lançado pela DarkSide Books, com tradução de Ana Death Duarte, Audrey retorna com seu parceiro, o charmoso e irritante Thomas Cresswell, em uma narrativa mais assustadora pelos castelos da Romênia e uma ambientação de tirar o fôlego!

Rose é uma personagem encantadora. Quando o livro termina, ficamos com aquele gostinho de quero mais; fascinadas por ler outras histórias da protagonista. O livro é uma excelente narrativa para o mês de outubro, ou para qualquer mês do ano, se você se interessa por histórias ambientadas em outros períodos históricos.


Edição realizada por Isabelle Simões.

Escrito por:

231 Textos

Site sobre cultura e entretenimento com foco em produções feitas e protagonizadas por mulheres.
Veja todos os textos
Follow Me :