“DC’s Legends of Tomorrow” é uma série de TV exibida nos Estados Unidos pelo canal CW desde janeiro de 2016, com a sua quarta temporada sendo exibida atualmente. Originada como um spin off de “Arrow” e “The Flash”, Legends uniu alguns dos heróis e vilões recorrentemente vistos nessas duas séries em um mesmo time incumbido de salvar o mundo.
Rip Hunter (Arthur Darvill) é um Time Master, ou seja, membro de um conselho de indivíduos que têm como missão proteger a integridade da linha do temporal, que viaja no tempo para reunir um grupo de pessoas capazes de ajudá-lo a derrotar o vilão Vandal Savage (Casper Crump), que assassinou a família de Hunter e lidera, no ano de 2166, uma forte investida de dominação do mundo.
O time original era formado por Sara Lance/White Canary (Caty Lotz), Ray Palmer/Atom (Brandon Routh), Kendra Saunders/Hawkgirl (Ciara Renée), Carter Hall/Hawkman (Falk Hentschel), Leonard Snart/Captain Cold (Wetworth Miller), Mick Rory/Heat Wave, Martin Stein (Victor Garber) e Jefferson Jackson (Franz Drameh), que se fundem para formar o herói Firestorm. Comandados por Rip, o grupo inicia sua missão a bordo da aeronave Waverider, capaz de viajar no tempo e equipada com uma super Inteligência Artificial chamada de Gideon (Amy Louise Pemberton).
Não apenas mais uma série de super-heróis
Desde o princípio, “Legends of Tomorrow” se mostrou uma série um pouco diferente de “Arrow” e “Flash”. Contando com um grande elenco de personagens centrais, a história não gira em torno de um herói e seus companheiros, mas sim de um grupo bem diverso. Pessoas de diferentes origens, histórias, motivações e até mesmo dois personagens que eram vilões – embora estejam lutando ao lado dos mocinhos, não se pode dizer que o caráter de ambos foi completamente reformado.
Outro ponto central é a viagem no tempo. Embora esse recurso seja bastante explorado em “Flash”, aqui não se trata de uma pessoa com capacidade de se locomover pelo tempo, mas há uma aeronave desenhada com esse objetivo, o que faz com que as viagens no tempo sejam a atividade primária desse grupo, que raramente permanecem em única cidade ou em um único ponto da história por muito tempo.
O recurso da viagem temporal permite que “Legends of Tomorrow” transite por uma infinidade de cenários, muito maior do que costumamos ver em outras séries com temática de super-heróis, e proporciona a telespectadora a possibilidade de ver personagens históricos como Marilyn Monroe, Helena de Troia, Elvis Presley, Júlio César, entre vários outros, em situações muitas vezes inusitadas. Nem sempre as pessoas envolvidas são tão ilustres, mas ainda é extremamente interessante ver um grupo de pessoas do século XXI se infiltrando em locais como um vilarejo viking, a França absolutista, Guerra do Vietnã, o festival de Woodstock, etc.
Isso não quer dizer que a série sempre tenha utilizado bem as ferramentas que tem a seu dispor ou que todos os personagens sempre tenham sido interessantes e bem explorados. Na verdade, a composição de tripulantes da Waverider se modificou bastante ao longo das temporadas, mas ainda conserva alguns dos personagens originais. “Legends of Tomorrow” é um dos poucos casos em que há uma melhora considerável com o passar do tempo. Outras séries do gênero costumam decair, ou pelo menos passar por momentos de instabilidade na trama e na receptividade do público.
Um dos maiores acertos por parte dos roteiristas, e o que faz a série ficar cada vez melhor, foi a progressiva aceitação da estranheza da série e a utilização dos recursos narrativos que tinham ao seu dispor, sem tentar se levar a sério demais e até mesmo sem o receio de se expor ao ridículo. “Legends of Tomorrow” pode e faz coisas que não caberiam em nenhuma outra série e é justamente isso que a torna tão querida aos seus fãs. A certeza que a espectadora pode ter ao assistir um de seus episódios, principalmente a partir da terceira temporada, é de que se deparará com as situações mais insólitas possíveis, mas que vai, acima de tudo, se divertir.
Representatividade feminina e diversidade
Esses temas são outro exemplo de características abraçadas pelos roteiristas da série, de forma mais clara com o passar do tempo. Já na segunda temporada, a série teve uma grande melhora quando Sara Lance se torna a capitã da Waverider. Desde então, seu papel de liderança e a enorme influência que exerce na tripulação são inquestionáveis.
Sara não tem apenas um título de capitã, ela é de fato a estrutura que mantém a equipe funcionando. Isso não quer dizer que a personagem não cometa erros ou não tenha momentos de dúvidas diante de tanta responsabilidade – é inclusive extremamente enriquecedor quando esses momentos são mostrados – mas é igualmente incrível vê-la superar as adversidades, não só pela enorme força interior que possui, mas também com o apoio do grupo que notoriamente a admira muito.
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Outras personagens femininas marcantes passaram pela série, tanto como membros da equipe ou como aparições especiais relevantes apenas à trama de um episódio específico. Atualmente em sua quarta temporada, a tripulação base da Waverider conta com a presença de três mulheres e dois homens, mas há outros núcleos de personagens recorrentes e a maioria é também formada por mulheres. Não é raro haver cenas apenas com mulheres ou em que elas estão em maior número que os homens. É claro que a questão numérica não é tudo quando se trata de representatividade, mas a série tem primado pela qualidade das histórias de suas personagens, apresentando diferentes problemáticas e situações, algumas delas muito inovadoras e relevantes para o momento político norte-americano.
Não é, no entanto, apenas na questão da representatividade feminina que a série se destaca. Há também uma clara preocupação da parte dos roteiristas com a diversificação étnica e sexual dos personagens. Sara Lance, por exemplo, é uma mulher abertamente bissexual e isso é amplamente mostrado, inclusive porque a maior parte de seus interesses amorosos são mulheres.
Há, entre personagens recorrentes e principais, pelo menos quatro membros da comunidade LGBTQ+, mas a sexualidade de outros membros da equipe ainda não foi abertamente estabelecida, deixando espaço para que esse número seja ainda maior. Infelizmente, é extremamente raro que uma série, ainda mais do gênero de super-heróis, tenha tantos personagens LGBTQ+ e principalmente que tenha essa identidade respeitada e incorporada de forma natural e positiva na narrativa. “Legends of Tomorrow” é, sem dúvidas, um dos raros casos em que isso acontece de forma bem sucedida.
Finalmente, merece comentário a questão da diversidade étnica na série. Considerando os atores que fazem atualmente ou já fizeram parte do elenco, são pelo menos seis pessoas de diferentes grupos étnicos, entre eles negros, árabes e leste asiáticos. Em alguns desses casos, a etnia do personagem é um ponto importante e explorado na história. Apenas para citar um exemplo, há uma mulher muçulmana de origem árabe que atualmente faz parte da equipe central de “Legends of Tomorrow” e levanta questões relacionadas ao banimento oficial da imigração de muçulmanos para os Estados Unidos, um acontecimento político muito recente do governo Trump.
De forma alguma é possível dizer que “Legends of Tomorrow” é uma série que nunca errou em sua abordagem de alguns desses assuntos tão complexos e delicados, mas é uma das poucas que abraça de forma tão central essas questões de diversidade e representatividade tão discutidas atualmente. Seus roteiristas certamente ousam mais que os outros, de séries semelhantes da mesma emissora, e talvez por isso a CW não invista tanto em seu marketing ou tente expandir seu público, já que a série não conta com uma audiência tão grande. Porém, de forma alguma a falta de uma maior popularidade do seriado reflete sua qualidade e capacidade de proporcionar entretenimento a telespectadora.
Aos que buscam uma série majoritariamente divertida, que não se leva a sério, mas nem por isso deixa de emocionar e trazer à tona importantes discussões, e que oferece representatividade feminina, étnica e sexual em número e qualidade maiores que a média, “Legends of Tomorrow” está disponível pelo streaming da Netflix Brasil e pode se provar uma grata surpresa!
Autora convidada: Lorena Macedo é estudante de Letras, Corvinal com ascendente em Sonserina (e acha que isso diz tudo sobre sua personalidade), apaixonada por cultura pop e aficionada por literatura inglesa do século XIX.
Edição realizada por Gabriela Prado e revisão por Isabelle Simões.