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CINEMA

Sexy Por Acidente: falso empoderamento para vender produtos

por Carol Lucena · 27 de junho de 2018
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Sexy Por Acidente tem uma premissa interessante. Renee Bennett (Amy Schumer) vive seus dias como qualquer mulher comum: martirizando-se por estar “acima do peso” e não ser bonita o bastante para os padrões de beleza impossíveis da sociedade. Porém, após bater a cabeça na aula de spinning um dia, ela começa a se achar linda. Com isso surge uma enorme auto-confiança que lhe abre todas as portas, tanto profissionais quanto amorosas. A mensagem pretendida é aquela velha falácia que já ouvimos inúmeras vezes: “o que importa é o que você é por dentro”. 

Infelizmente este filme não foi escrito pela própria Amy Schumer, que costuma trazer um material muito mais ácido e crítico em suas obras cômicas, mas sim pela dupla Abby Kohn e Marc Silverstein, roteiristas de comédias românticas formulaicas e machistas como Ele Não Está Tão Afim de Você. Assumindo aqui pela primeira vez a direção, os dois pretendem fazer de Sexy Por Acidente um filme “””feminista””” e empoderador, mas acabam, ao contrário, reforçando os mesmos estereótipos que visam combater.

O filme é por vezes genuinamente engraçado e sensível graças à ótima atuação de Amy Schumer. Quando ela se olha no espelho extremamente decepcionada com seu corpo, é impossível toda mulher que habita esse planeta machista não se identificar. O padrão de beleza atual é tão limitado e inalcançável que uma pessoa como Schumer, que mal os viola (ela é branca, loira, bonita e está longe de ser obesa) já sofre coerções o suficiente para se sentir péssima consigo mesma, que dirá a imensa maioria que passa mais longe ainda desse “ideal”. Schumer também é muito habilidosa na comédia, e várias cenas funcionam apesar do gosto duvidoso das piadas. 

Há várias chacotas do amigo de trabalho de Renne, o colocando no cenário familiar de gordos fazendo coisas “nojentas”, associando uma coisa à outra (e minando a pretensa mensagem positiva do filme). Seu namorado meio nerd/afeminado também é ridicularizado levemente por tais trejeitos. E, durante a maior parte do filme, espera-se que riamos do fato de Renne se achar linda sem ser linda. Essa é a grande piada do filme, a “feia” com seu senso de ridículo alterado, entrando em situações constrangedoras por causa disso.

O próprio título evidencia tal situação, que ela é sexy apenas por acidente. Em inglês, o título original é “I Feel Pretty” ou Eu Me Sinto Bonita. Fosse realmente uma celebração da beleza fora do padrão, o título seria Eu Sou Sexy, ou Eu Sou Bonita. Um exemplo de título afirmativo é o do excelente filme Uma Mulher Fantástica, que fala sobre uma mulher transsexual. Nesse título, há reconhecimento e legitimação da força e do status de sua protagonista. Palavras importam.

Sexy Por Acidente

O padrão de beleza atual é tão distorcido que uma mulher dessa é classificada como fora dele!

Mas, claro, apesar de zombar bastante das características consideradas “ruins” pela sociedade que os personagens carregam, o filme eventualmente nos convidará a “não ligar para o que os outros dizem”, e “resgatar nossa confiança interior”. Renne consegue mudar sua vida apenas sendo confiante e por conseguinte tendo mais ousadia. Como se os outros fossem finalmente aceitá-la se ela o fizesse primeiro, pois assim ela estaria mostrando seu “verdadeiro eu” para o mundo, suas melhores qualidades.

Esse argumento de “mostrar seu verdadeiro eu” é algo cada vez mais usado pelas marcas de produtos femininos, seja lingerie, maquiagem, ou o que for. A propaganda da Dove nos fala sobre a “real beleza”, que você pode despertar, claro, se usar os produtos da marca. Há uma enorme preocupação das empresas em distorcer o feminismo (ou qualquer movimento social) para algo que seja palatável às novas exigências sociais, mas ainda dê lucro a seus cofres. A luta para que mulheres não sejam obrigadas a usar salto alto se transforma em “mulher pode usar o que quiser, inclusive esse sapato da marca x que lhe deixará glamourosa e mostrará sua verdadeira beleza ao mundo”. Ou a ênfase na “maquiagem natural” que procura emular como seria seu rosto sem maquiagem, mas COM maquiagem!

Talvez mais do que qualquer outro programa, os reality shows de makeover como “Esquadrão da Moda” sempre utilizavam esse argumento falacioso de que, ao seguir as regras deles, a mulher transformada estaria aí sim revelando seu “verdadeiro eu” para o mundo. Repare: uma mulher que se vestia como queria, mas era considerada inadequada por seus amigos ou familiares, era “denunciada” ao programa, cujos gurus da moda iam ensiná-la a mostrar seu “verdadeiro eu” por meio das regras que eles impuserem. Ela não mostra quem é se vestindo como ela mesma escolheu, mas apenas por meio do que os apresentadores dizem que é melhor pra ela. É apenas uma versão mais sofisticada e complexa do “faça o que eu mando, é pro seu bem”, mas agora transferindo a responsabilidade para a vítima.

No filme, Renne incialmente vai à aula de spinning para emagrecer e ficar bonita, mas depois continua indo como um ato de “auto-cuidado”, ou o equivalente atual do argumento “pela saúde”. No meio disso, o filme também inclui diversas propagandas de lojas reais dentro da trama. Além de, claro, a narrativa se passar dentro de uma companhia de cosméticos. A mensagem do filme jamais é “você não precisa de maquiagem ou aulas de ginástica”, mas sim “você é bonita do jeito que é, mas use maquiagem e faça ginástica mesmo assim, como forma auto-cuidado”, exatamente como denunciado na paródia escrita pela própria Amy Schumer em seu programa. 

Leia também:

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O pior ponto dessa mensagem distorcida é ainda o de focar no indivíduo como fonte do problema, e fugir de analisar a cultura que impõe toda essa estrutura opressiva. Em Sexy Por Acidente, o problema está apenas na percepção de Renee sobre si mesma, e não no preconceito dos outros que a rejeitam, a dizem que ela não é desejável, ou que não é bonita o suficiente para trabalhar na indústria da moda. Quando Renne muda de atitude, ela consegue basicamente tudo que sempre quis, como se bastasse apenas sua força de vontade. Uma mentira deslavada que sempre é empurrada pelos contos de fada de Hollywood, encontrando paralelos no mito da meritocracia, no qual os americanos (e praticamente todo o mundo ocidental) acreditam piamente. “Você é plenamente capaz de mudar sua vida, basta querer, basta se esforçar”, nos dizem. Mas nada poderia estar mais distante da realidade.

Sexy Por Acidente

Nessas ficções de Hollywood, entretanto, isso é possível. O que parece impossível é haver qualquer reconhecimento ou responsabilização por estruturas sociais que devem ser mudadas. Ensina-se o indivíduo a cobrar respeito, mas não os outros a respeitá-lo. Ensina-se a mulher a ter auto-confiança, mas não aos outros a parar de importuná-la por não aderir a um padrão de beleza impossível. Ensina-se a não ligar para o que os outros dizem, mas isso implica em se isolar em uma bolha individual, algo que significaria total solidão, algo impraticável para uma espécie social como os seres humanos.

Dependemos totalmente uns dos outros (basta ver o que acontece quando a coleta de lixo entra em greve, ou os caminhoneiros, por exemplo) mas nossa sociedade atual pós revolução industrial acredita que podemos ser totalmente independentes. Isso gera apenas culpa individual – se você não atinge determinado patamar de sucesso, seja no que for, a culpa é sua, e não das suas circunstâncias, não dos outros, ou nem mesmo do acaso, mas apenas sua, nos dizem. Quanto mais inalcançável o modelo de sucesso vigente, mais culpadas e doentes as pessoas ficam, porque dirigem a indignação e revolta a si mesmas, ao mesmo tempo em que se esgotam de tanto esforço para tentar atingir tal modelo impossível. Seria bom se um dia Hollywood reconhecesse isso em seus filmes. Eles, afinal, ajudam muito a moldar o pensamento da sociedade.

https://www.facebook.com/ParisFilmesBR/videos/1875765662484979/?hc_ref=ARSFCJq3BWN5Ns5ZVCM8SKadbyxjijlSgFh0Xqt1W_4QqNAIt_TXZM2JTK0d_eufqRo

 

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Carol Lucena

Cineasta, musicista e apaixonada por astronomia. Formada em Audiovisual, faz de tudo um pouco no cinema, mas sua paixão é direção de atores. Vocalista da banda Noite e compositora nas horas vagas. Também escreve sobre cinema em seu site Cine Medusa.

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