Bottoms: A Geração Z e a Zillennial Cult Comedy

Bottoms: A Geração Z e a Zillennial Cult Comedy

No contexto da recém intitulada “geração de mulheres estranhas produzindo Zillennial Cult Comedy”, Bottoms é uma iniciativa da cineasta Emma Seligman, em conjunto com Rachel Sennott (Shiva Baby), Ayo Edebiri (The Bear) e Molly Gordon (Shiva Baby), com o propósito de contar a história de duas adolescentes lésbicas esquisitas tentando desesperadamente ter suas experiências sexuais.

A geração Z destaca-se por ser a mais nostálgica de todas. Não é incomum encontrar centenas de fotos recriadas ao aesthetic de alguma tendência passada em suas redes sociais. Contudo, dada a natureza dessa geração, nascida no epicentro das evoluções tecnológicas e da comunicação acelerada, compreende-se a necessidade de novos protagonistas adaptados aos moldes dessa época.

Essa atmosfera de recriação nostálgica é, sem dúvida, um dos combustíveis mais fortes na elaboração de Bottoms. Trata-se de uma fusão entre o clube da luta e uma comédia, na qual adolescentes, geralmente meninos, estão desesperados por suas primeiras experiências sexuais. 

Pôster de Bottoms
Pôster de Bottoms | Imagem: Reprodução

A reconstrução aos moldes da GenZ

Para os chamados “nativos digitais”, é comum manter um contato quase constante com diversas tendências do passado. Porém, a nostalgia e o resgate não são exclusivos da Geração Z. Todas as gerações têm sido suscetíveis à incorporação de características das gerações subsequentes, mas é a edição dessas características que define a personalidade de cada grupo.

Durante o auge da Segunda Guerra Mundial, surgiu a geração Baby Boomer, influenciada pela ética do trabalho e pela mentalidade conservadora da geração anterior. Mas essa geração também experimentou as mudanças sociais e culturais dos anos 60, com o movimento hippie, em contraposição à Guerra do Vietnã. Cerca de 10 anos mais tarde, nasceu o movimento Punk, que, por sua vez, influenciou o movimento Grunge nos anos 90.

Comunidades Punk | Imagem: Reprodução

A reconstrução da cultura pela Geração Z envolve a interpretação, redefinição e moldagem da cultura de acordo com suas próprias perspectivas e experiências. Ao mesclar a filosofia niilista com um humor frequentemente obscuro, resulta na renovação de conceitos na política, arte, literatura e cinema. O filme Bottoms é apenas um vislumbre do que pode surgir a seguir no campo das comédias sexuais.

O retorno das comédias sexuais

Embora tenham estado em baixa na última década, ainda há uma quantidade significativa de comédias sexuais no cenário audiovisual. Esses filmes abordam, de maneira cômica, temas relacionados à sexualidade. No entanto, infelizmente, muitas dessas produções acabam por perpetuar estereótipos e contribuir para a objetificação.

A presença frequente de homofobia e misoginia nessas obras torna a experiência de revê-las um exercício difícil para a maioria do público. Já Bottoms busca uma abordagem mais contemporânea dessas perspectivas.

Em seu enredo, “PJ e Josie iniciam um clube da luta como meio de perder a virgindade com líderes de torcida. Surpreendentemente, o plano bizarro delas funciona! O clube da luta ganha força, e em pouco tempo, as garotas mais populares da escola estão se enfrentando em nome da autodefesa. Contudo, PJ e Josie se veem em uma situação complicada e necessitam de uma saída antes que seu plano seja descoberto.”

Josie (Ayo Edebiri) e PJ (Rachel Sennott) em Bottoms
Josie (Ayo Edebiri) e PJ (Rachel Sennott) em Bottoms | Imagem: Reprodução

A premissa do filme segue a tradição das comédias sexuais, compartilhando muitas semelhanças com produções passadas. Porém, alguns detalhes distintos merecem destaque.

Leia também >> 10 quadrinhos para se pensar em visibilidade lésbica

Em primeiro lugar, o protagonismo feminino ganha destaque, rompendo com a narrativa predominante que geralmente se concentra no ponto de vista masculino em questões de sexo, relegando personagens femininas a meras performances do que os homens deveriam desejar.

Em Bottoms, a história é impulsionada pelas personagens femininas, que assumem o controle de suas próprias jornadas e desejos, mesmo que de maneira atrapalhada. O filme brinca com os estereótipos de gênero associados às comédias sexuais, elevando os detalhes mais hilários de maneira leve e não pedante.

PJ (Rachel Sennot), Isabel (Havana Rose Liu) e Josie (Ayo Edebiri) em Bottoms
PJ (Rachel Sennot), Isabel (Havana Rose Liu) e Josie (Ayo Edebiri) em Bottoms | Imagem: Reprodução

Além disso, a abordagem sáfica é explorada de maneira próxima à realidade. O longa retrata relacionamentos românticos e sexuais entre meninas, oferecendo uma perspectiva mais abrangente e positiva dentro do gênero. Destaca personagens que não seguem padrões de feminilidade, mas ainda assim não são deixadas de lado como algo que não desperta desejo.

Ao longo do filme, ricos detalhes serão revelados, adicionando camadas à narrativa. Cada um desses elementos contribui para a singularidade e a qualidade de Bottoms, tornando-o uma comédia sexual que se destaca de outras produções do gênero.

A era do pertencimento e o senso de personalidade

Assim como as gerações anteriores moldaram a cultura de seus tempos, a Geração Z também está deixando sua marca. O filme é um exemplo claro dessa dinâmica cultural, onde a nostalgia serve como porta de entrada para novas perspectivas. Ele apresenta protagonistas femininas em uma comédia que aborda questões da adolescência e a busca por experiências sexuais de maneiras menos sérias, mas mais relevantes.

É importante ressaltar que Bottoms não se passa exatamente em 2023, mas sim no início dos anos 2000, quando a Geração Z estava nascendo. Ainda, é válido questionar se a liberdade social que PJ e Josie desfrutavam por serem lésbicas, com uma baixa performance de feminilidade, era tão bem recebida no início do século como é agora.

Ayo Edebiri, Rachel Sennot e Emma Seligman
Ayo Edebiri, Rachel Sennot e Emma Seligman | Imagem: Reprodução

Emma e Rachel parecem ter realizado uma remontagem das clássicas comédias sexuais da infância da Geração Z, que, acredite ou não, assistiu a muitas delas. Elas transpuseram esse contexto para um ambiente em que a qualidade de vida das protagonistas fosse favorável ao enredo, resultando na criação de um clube feminino de luta livre com o objetivo de conquistar líderes de torcida.

Leia também >> Representação lésbica nos anos 90: categorização da mulher homossexual no audiovisual

Com um roteiro bem costurado, o filme oferece boas piadas, cenas com falas improvisadas e muito humor em torno da excitação quase constante das adolescentes de diversas gerações. Cada segundo de Bottoms é valioso, merecendo cada torcida pela visibilidade que proporciona.

A tendência de quebra de padrões de comportamento, que se torna popular a cada nova geração, manifestou-se com considerável intensidade nos últimos anos. Agora, surge a oportunidade de desfrutarmos de algumas comédias genuinamente divertidas, sem sobrecarregar a consciência, e com desfechos leves para todos, conforme se espera de uma comédia suave.

Escrito por:

7 Textos

Roteirista e Copywriter formada em Produção Audiovisual. Amante de livros, filmes e podcasts.
Veja todos os textos
Follow Me :