MaXXXine: a mocinha que é o monstro da vez!

MaXXXine: a mocinha que é o monstro da vez!

Um tímido filme B de terror slasher que estreou em 2022 pela A24 e que se tornou um ícone do terror atual: a dobradinha entre o diretor Ti West e a produção e ótima composição de Mia Goth (a famosa neta da Maria Gladys). A trilogia “X” encerra com MaXXXine, onde West novamente brinca com os gêneros de terror, faz referências espertas a vários filmes populares do gênero e também com preceitos morais: promiscuidade, que nos clássicos leva à morte certa, aqui se cria uma personagem forte.

Início da trilogia X

A trilogia se inicia em X: A Marca da Morte, onde somos apresentadas a Maxine Minx (Mia Goth), uma jovem atriz que deseja a fama a todo custo, mesmo que tenha que começar por baixo, com a indústria pornô.

Diferente de franquias como Sexta-feira 13 ou Halloween, em que o sexo torna os “mocinhas” personagens idiotizados e reforça um dos maiores clichês do terror – “quem transa, morre” – aqui, o sexo dá profundidade aos personagens, principalmente, Maxine.

Maxine é uma personagem que destoa das demais mocinhas do terror. Enquanto elas são virginais e inocentes, mas se tornam mulheres fortes e combativas ao sobreviver a várias atrocidades, Maxine já é assim desde que nos é apresentada.

É uma mulher que não renega sua sensualidade e lascividade; pelo contrário, as usa para chegar aonde quer: a fama. Tão claro é o seu objetivo que ela não poupará esforços e não hesita em acabar com qualquer obstáculo.

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Maxine (Mia Goth) está prestes a se tornar uma estrela, mas um serial killer ligado a seu passado pode ser uma ameaça a seus planos
Maxine está prestes a se tornar uma estrela, mas um serial killer ligado a seu passado pode ser uma ameaça a seus planos | Fonte: IMDb

MaXXXine: a conclusão da trilogia X

Na cronologia da trilogia, MaXXXine se passa seis anos após os eventos de X, em 1986, a famosa “década perdida” dos anos 80, auge de muitas franquias de terror e da cultura pop.

Única sobrevivente do massacre que aconteceu na fazenda do primeiro filme, Max está consolidada como atriz pornô, mas não quer ficar apenas nesse circuito: ela já tem 33 anos, idade que nesta indústria já significa “velhice”.

Além disso, seu desejo de ser uma estrela não cabe mais em filmes pornográficos. Ela quer chegar à nata de Hollywood. O filme já começa com uma Maxine bastante segura chegando para fazer um teste para a sequência de um filme de terror.

Paralelo com Pearl

A cena é claramente um paralelo com a cena em que Pearl faz o teste para ser dançarina. Apesar de Pearl ter uma ótima performance, não agrada os jurados, levando aos acontecimentos do final de Pearl (2023).

Aqui, Maxine consegue impactar, tão segura de si que já se considera vencedora em relação às suas concorrentes. Mas ainda assim, após o teste, segue para gravar mais um filme pornográfico.

Mia Goth e Halsey em MaXXXine (2024)
Hollywood em meio a década perdida e assombrada pelo Night Stalker é a ambientação da trama | IMDb

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A ambientação de todo o filme é Los Angeles em 1986, principalmente em Hollywood. West segue com suas referências e homenagens ao gênero do terror, como o cenário do Bates Motel, onde Maxine conversa com a diretora Elizabeth Bender (Elizabeth Debicki). Outra referência importante é que a cidade está justamente vivendo o terror do Night Stalker, um serial killer que realmente existiu.

O papel de Richard Ramirez

Richard Ramirez, o “Night Stalker”, foi um assassino em série conhecido por invadir a casa de suas vítimas durante a noite e pela atrocidade com que as matava. Ramirez chegava até mesmo a marcar suas vítimas com pentagramas desenhados em seus corpos com batom, pois alegava estar sempre acompanhado pelo diabo. Em MaXXXine, Los Angeles está no auge dos ataques do Night Stalker, e a ficção usa esses fatos históricos para compor a trama.

Investigação e ameaças

Algumas mulheres aparecem mortas da maneira em que o Night Stalker deixava suas vítimas. Porém, essas mulheres têm algo em comum: conhecem Maxine. São suas colegas de “profissão”, o que coloca a atriz em ascensão na mira dos detetives William (Michelle Monaghan) e Torres (Bobby Cannavale).

E sim, são a clássica dupla de “Policial Bom, Policial Mau”: William quer que Maxine colabore para evitar mais mortes e se mostra preocupada com ela, enquanto Torres suspeita de Maxine, é fanfarrão e um ex-ator frustrado.

Mesmo com um serial killer à solta atacando pessoas conhecidas, Maxine está focada em atuar no filme da diretora Bender. Ela não está nem um pouco com medo ou preocupada: qualquer engraçadinho que queira abordá-la na rua à noite se arrepende imediatamente. Para quem sobreviveu ao massacre de um slasher, um tarado à espreita em uma viela escura não é páreo para Maxine.

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O grande empecilho de Maxine é o seu passado. Não que ela se arrependa das coisas que fez. O problema é que o detetive particular de caráter duvidoso John Labat (Kevin Bacon) está em sua cola, com provas do que aconteceu na fazenda de Pearl em 1979. E Labat não está sozinho. Alguém está por trás dele e quer que Maxine pague caro por tudo o que fez.

John Labat (Kevin Bacon) em MaXXXine (2024)
O decadente Labat acha que Maxine é alvo fácil… vai ter uma péssima surpresa! | IMDb

Uma mocinha de terror nada convencional

Em três filmes, Mia Goth conseguiu se tornar um marco entre as protagonistas femininas no gênero do terror. Seja como a perturbada Pearl ou como a gananciosa e implacável Maxine, Goth foge da convencional final girl, isto é, a protagonista que começa frágil e amedrontada no início do filme e termina como a última sobrevivente, se fortalecendo ao longo da trama e enfrentando o vilão.

Ah, e o importante: são virgens, puras, como Sidney Prescott (Neve Campbell) de Scream ou Laurie Strode (Jamie Lee Curtis) da franquia Halloween. Aliás, nesta extensa franquia de filmes, os três últimos mostram uma Laurie idosa, mas extremamente bad ass, que não hesita em querer acabar com Michael Myers de uma vez por todas e salvar sua família.

Mas Maxine é forte desde o momento em que é apresentada em X. Até mais do que Pearl, que enlouqueceu ao ter que se submeter aos padrões de comportamento feminino na década de 20, o que acabou com seus sonhos de se tornar uma estrela. Maxine não aceita que as rígidas normas sociais atrapalhem seus planos e não poupa esforços, até mesmo os questionáveis, para conseguir o que quer.

A complexidade de Maxine

Seria então Maxine má, um monstro? A indústria do entretenimento, seja a mainstream ou adulta, é uma selva para mulheres. Quantos exemplos, tanto fictícios quanto reais, de mulheres que tiveram suas vidas destruídas, reputações arruinadas ou acabaram com transtornos mentais nas tentativas de se tornarem estrelas neste meio temos?

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Maxine (Mia Goth) em MaXXXine (2024)
Ai de quem se atrever a mexer com a Maxine! Pra quem sobreviveu um massacre, o que é serial killer? | IMDb

Maxine conhece a podridão e a busca pelo poder desde cedo. Como revelado em X, Maxine cresceu em uma família cristã fundamentalista, cujos preceitos incisivos e furiosos sobre moralidade e habilidade de manipular e cativar a protagonista incorporou para si, mas seguiu pelo caminho exatamente oposto.

Se no primeiro filme Maxine já era uma moça bem ciente dos seus interesses e preparada para o que for necessário para conquistá-los, seis anos depois ela se torna uma mulher que sobreviveu ao pior e que não será um detetive decadente, dois tiras e um serial killer que vão pará-la, não agora que ela está tão perto de ser uma estrela.

A diretora Elizabeth Bender e Maxine
A diretora Elizabeth Bender e Maxine são duas mulheres dispostas a encarar o horror de Hollywood para terem sucesso | IMDb

Uma anti-heroína ou uma sobrevivente?

Uma anti-heroína? Um produto do meio em que vive? Uma mulher gananciosa e egoísta? Ou é o monstro que sobreviveu a vários monstros? Talvez, uma mulher simplesmente decidida. Pegue um personagem masculino e lhe dê a mesma personalidade de Maxine. Com certeza entraria para o clube Bolinha do “Literalmente Eu”.

MaXXXine é um bom filme, no final de contas?

Em X Ti West se inspirou bastante em O Massacre da Serra Elétrica, Pearl é praticamente uma releitura non-sense e macabra de O Mágico de Oz. Já MaXXXine traz muitas referências a filmes dos anos 80, como A Hora do Pesadelo. Se a essência da trilogia X é o subgênero slasher, aqui temos uma boa dose de whodunnit do suspense. Embora esse seja o norte da trama, o desfecho talvez seja a falha do filme.

Seja quem já viu os filmes anteriores da trilogia ou quem já está calejado de suspense, tem boas chances de adivinhar quem é o tal serial killer que está parafraseando o Night Stalker para chegar até Maxine. Dá para chutar ainda no segundo ato e decepciona um tanto quando o chute é certeiro.

Leon (Moses Sumney) em MaXXXine (2024)
Leon é praticamente a única pessoa que Maxine parece se importar de verdade | IMDb

Fãs já especulavam quem seria o tal stalker assassino de MaXXXine e alguns realmente acertaram. O próprio começo do filme é um foreshadowing (antecipação de pontos relevantes da narrativa) para quem for mais atento.

Fora o final, MaXXXine se equipara bastante a Pearl em qualidade: se o anterior é a história de origem e colapso da vilã do primeiro filme, o terceiro da trilogia é o “e se” bom de Pearl, onde Maxine consegue de fato o estrelato após todos os obstáculos, tendo que praticamente se tornar um “monstro” para combater todos os “monstros” no caminho.

O filme traz nomes como os cantores Halsey e Moses Sumney, este último interpretando Leon, amigo de Maxine e a única pessoa com quem ela parece se importar, mesmo que um pouco. Lily Collins faz uma breve participação, como mostra em um dos trailers do filme, como a atriz Molly Bennet, que irá contracenar com Maxine no filme da diretora Bender.

Personagens marcantes

A diretora Elizabeth Bender
A diretora Elizabeth Bender | Fonte: IMDb

Fora Maxine, Elizabeth Bender é outra personagem bem interessante, uma mulher que é diretora de filmes de terror em uma época em que esse mercado cinematográfico era dominado majoritariamente por homens. É uma personagem tratada como fria, insensível e durona, mas que mulher não tem que ser assim em meio a um mundo masculino para conseguir o mínimo de respeito? Com Maxine, Elizabeth Bender forma uma dupla bastante interessante.

Além do veterano Kevin Bacon, Giancarlo Esposito vive Teddy Knight, o empresário de Maxine. E como se trata de Esposito, temos um ótimo personagem, infelizmente, com pouco tempo de tela, mas bem marcante nos momentos em que aparece.

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Teddy Knight (Giancarlo Esposito), o empresário de Maxine
Para ter sucesso na indústria da fama, tem ser tão brutal quanto o meio | Fonte: IMDb

Cenas gore, referências e originalidade em MaXXXine

De todos os filmes, MaXXXine é o que tem menos cenas gore, mas todas as cenas que possuem gore são muito bem executadas. Não é o gore escrachado que se tornou tão comum no cinema atual, West as coordenou muito bem para chocar.

E com suas claras referências ao cinema de terror e aos filmes dos anos 80 no geral, Ti West, juntamente com a atuação e produção de Mia Goth, conseguiu criar uma obra bastante original e intensa para colocar a personagem Maxine Minx no hall da fama das final girls. Ou seria das femmes fatales?

Fãs da trilogia devem gostar bastante do último filme, mas alguns talvez não curtam devido à resolução do mistério. De fato, é algo que tira pontos da performance de MaXXXine, mas que não deixa de ser um bom filme no geral, principalmente no quesito de protagonista feminina forte.

MaXXXine estreia dia 11 de julho nos cinemas.

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10 Textos

Carioca e jornalista de formação, mas escritora de coração. A escrita começou como uma brincadeira de infância, com papéis sulfite dobrados ao meio, uns grampos, um estojo de canetas, lápis e giz coloridos e muita imaginação para criar os primeiros livrinhos. Escolheu o jornalismo porque queria viver a história além de ajudar a registrá-la. Mas com a realidade cruel, retornou para os mundos dentro de sua cabeça, finalmente dando vida no papel.
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