[CINEMA] Festival de Cannes 2017: Jessica Chastain questiona a representação das mulheres nos filmes do Festival

[CINEMA] Festival de Cannes 2017: Jessica Chastain questiona a representação das mulheres nos filmes do Festival

O júri do 70º Festival de Cannes 2017 fez história – ou talvez deveria se dizer “uma história delas” (no original em inglês, o texto faz um jogo de palavras entre ‘history’ e ‘herstory’). Eles não só premiaram a honraria de melhor direção do festival para Sofia Coppola por The Beguiled” (O Estranho Que Nós Amamos), sendo a primeira vez que uma mulher venceu nesta categoria em 50 Anos, como concederam o prêmio de melhor roteiro (num empate) para Lynne Ramsay por You Were Never Really Here. Apesar disso, as mulheres do júri Jessica Chastain, Agnès Jaoui, Maren Ade e Fan Bingbing falaram na conferência de imprensa pós-cerimônia sobre suas preocupações sobre como as mulheres foram retratadas nos filmes exibidos durante o festival.

“Esta é a primeira vez que assisti 20 filmes em 10 dias, e o que eu realmente tirei dessa experiência é como o mundo vê as mulheres”, diz Chastain. “Foi muito perturbador para mim, para ser honesta. Houve algumas exceções. Fiquei surpresa com a representação de personagens femininas no cinema”.

Ela continua:

“Acho que se incluirmos mais mulheres contando histórias, podemos esperar por mais mulheres como as que vejo na minha vida cotidiana. Elas simplesmente não reagem aos homens ao seu redor. Elas têm seu próprio ponto de vista”.

Jaoui, a cineasta francesa mais conhecida por dirigir The Taste Of Others (O Gosto dos Outros”), concordou completamente: É um grande problema. Precisamos de mais filmes de mulheres”.

Maren Ade, cujo célebre Toni Erdmann (Leia AQUI nossa crítica) foi esnobado no ano passado, queria garantir que o público percebesse que não deram esses prêmios a mulheres só por serem mulheres. 

“Eu realmente tenho que dizer que eu sempre fiquei muito feliz em encontrar outras diretoras mulheres. Descobri depois de um tempo estar sempre cercada de homens, e a impressão que passa é de que [o cinema] não seria um bom trabalho para uma mulher, e eu acho que essa impressão é completamente equivocada”, diz Ade. “Acho que precisamos de mais mulheres fazendo filmes, porque todos queremos que a indústria do cinema reflita a sociedade moderna. Acho que também concordo que estamos perdendo muitas histórias que elas [as mulheres] podem contar. Para além de personagens femininas, eu também muitas vezes acho que a visão delas sobre os homens pode ser muito interessante. Não que os homens não possam fazer esses filmes, mas eu concordo que mulheres têm uma visão própria”.

Will Smith brincou-mas-não-brincou: “Um pouco mais de negros também não machucaria ninguém. Mas falaremos sobre isso em outra ocasião”.

A famosa atriz chinesa Fan Bingbing também falou, observando: “Primeiro, eu quero dizer que estou muito feliz em apresentar este prêmio à Sofia Coppola porque ela fez um trabalho incrível para o público. Nós só queremos advogar para nos concentrarmos em mais cineastas mulheres no futuro. Isso não é algo que eu queira julgar; Eu quero defender, e queremos incentivar cineastas a apresentar mais personagens femininas. Eu tenho que dizer que Sofia ganhou este prêmio não porque ela é uma cineasta mulher, mas por causa do filme em si”.

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Foi algo chocante ver os membros do júri criticar abertamente a seleção dos filmes, mas respondendo a outra pergunta, Smith comentou sobre como a falta de representação era um tema de conversa recorrente. Mais intrigante, alguns deles querem fazer algo sobre isso:

“Este júri é composto de uma comunidade global e na grande parte do tempo fomos tomados pela preocupação de como fazer parte do futuro do Festival de Cannes a fim de abrir vias para trazer mais mulheres e pessoas de cor, comunidades que não têm tanto acesso a esta vibrante comunidade”, diz Smith. “Na verdade, esta manhã, tivemos conversas sobre como poderíamos abrir essas vias. Nós temos algumas ideias. O diretor Park Chan-wook e eu estamos formando um conselho e uma coalizão capazes de encontrar filmes e apresentá-los mais efetivamente à comunidade de Cannes – e quando se refere à comunidade de Cannes, quer dizer Thierry Frémaux e Pierre Lescure. Basta abrir os caminhos. Este júri foi muito focado e muito empenhado em ir além de hoje para ser uma parte da solução para algumas dessas dificuldades”.

É curioso como a indústria francesa, a mídia, o diretor de Cannes, Fremaux, e o presidente Lescure pensarão nisso. Há sempre uma ampla crítica sobre as seleções a cada ano, mas os pontos do júri são muito válidos. Comparado aos outros grandes festivais do mundo, Cannes tem pontos fortes em sua representação do cinema asiático. Mas este ano em particular, a falta de personagens e filmes africanos e afro-americanos foi tão impressionante quanto o ponto de Chastain sobre a representação de mulheres em até mesmo alguns dos “célebres” filmes. Mudanças podem até não acontecer em Cannes tão rápido, mas este júri certamente parecia empoderado para fazer mudanças em seus próprios cantos do mundo.

Artigo traduzido pelo CineClube Delas, da matéria de Gregory Ellwood, para o site The Playlist.

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Aquariana, mora no Rio de Janeiro, graduada em Ciências Sociais e em Direito, com mestrado em Sociologia e Antropologia pelo PPGSA/UFRJ, curadora do Cineclube Delas, colaboradora do Podcast Feito por Elas, integrante da #partidA e das Elviras - Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema. Obcecada por filmes e livros, ainda consegue ver séries de TV e peças teatrais nas horas vagas.
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