O novo livro da filósofa e feminista Djamila Ribeiro traz muito mais do que o necessário questionamento que é objeto do título do mesmo. Quem tem medo do feminismo negro? carrega consigo uma profunda reflexão sobre os feminismos e as questões raciais, bem como nos permite conhecer e admirar ainda mais a trajetória da autora.
Com uma introdução visceral, Djamila abre sua vida e nos mostra, através de sua história pessoal, como o racismo é cruel. Esta introdução é de suma importância não só para conhecermos melhor a autora e seu lugar de fala, mas também para desconstruir o mito da meritocracia. Isto porque, sem sombras de dúvidas, quem hoje vê a sua trajetória não sabe o quão árduo foi o seu caminho. Não sabe, inclusive, que este caminho foi aberto por outras mulheres negras que lutaram para que hoje a voz da Djamila tivesse a amplitude que possui. Através dela, ouvimos a sua mãe, sua avó e as suas ancestrais.
“Como negra, não quero mais ser objeto de estudo, e sim o sujeito da pesquisa.” (Djamila Ribeiro)
Com 152 páginas, Quem tem medo do feminismo negro? é um compilado de alguns artigos publicados pela autora, entre os anos de 2014 e 2017, no blog da Carta Capital, além de contar com uma introdução que é um super ensaio autobiográfico. (confiram um trecho aqui)
A seleção dos artigos não poderia ser melhor, visto que aborda desde o racismo cotidiano, aos casos que ganharam a mídia. Mas Djamila não se limitou a isso. Em suas análises, ela traz muitas referências teóricas de mulheres negras incríveis, de vários lugares do mundo. Assim, ela recupera não só o debate racial (em contraponto ao mito da democracia racial brasileira), mas também resgata a própria raiz histórica do Feminismo Negro, que ao contrário do que muita gente pode pensar, não “surgiu” há pouco mais de 4 anos.
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Como bem cita a autora, o Feminismo Negro começa a ganhar força no Brasil em 1980, e junto com ele surge a necessidade da ampliação do debate dentro do próprio movimento feminista, que agora precisaria começar a questionar e pensar as diversas formas de opressão. Sem uma visão interseccional, o feminismo (branco) da época não conseguiria dar conta da pauta das mulheres, pois estas, por sua vez, são plurais e ao mesmo tempo únicas.
“A invisibilidade da mulher negra dentro da pauta feminista faz com que ela não tenha seus problemas nem ao menos nomeados. E não se pensa em saídas emancipatórias para problemas que nem sequer foram ditos.”
Em seus livros e em sua militância, Djamila retira a mulher negra dessa invisibilidade social. Dá nome às opressões e responsabiliza tanto quem oprime quanto quem cala e, por sua vez, perpetua a opressão histórica e social que recai sobre a população negra, e em sua maioria pobre. Além disto, é importante frisar que ao falar em Feminismo Negro para pessoas que se identificam ou não com o(s) feminismo(s) em geral, Djamila rebate o preconceito e aversão que as pessoas possuem dessas duas palavras (feminismo e negro), ainda mais quando colocadas juntas na mesma frase.
“Ao perder o medo do feminismo negro, as pessoas privilegiadas perceberão que nossa luta é essencial e urgente, pois enquanto nós, mulheres negras, seguirmos sendo alvo de constantes ataques, a humanidade toda corre perigo.”
Quando questionamos “quem tem medo do feminismo?” queremos saber a quem interessa a perpetuação do status quo das mulheres e, sobretudo, das mulheres negras. Quem se incomoda em ver mulheres negras no poder? O que é ferido quando temos livros de mulheres negras nas maiores livrarias do Brasil? No fundo, sabemos a resposta, mas mesmo assim nos sentimos na obrigação de questionar: Quem tem medo do feminismo negro?
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Quem Tem Medo do Feminismo Negro?
Djamila Ribeiro
Companhia das Letras
152 páginas