Lover: os recomeços sagrados de Taylor Swift

Lover: os recomeços sagrados de Taylor Swift

Lover é o sétimo álbum de estúdio da cantora Taylor Swift, lançado em 23 de agosto de 2019. Totalizando 18 faixas, a obra é um dos trabalhos mais completos e interessantes da artista. Além disso, é o primeiro álbum cujos direitos autorais pertencem completamente à Taylor, visto que os direitos dos seis álbuns anteriores foram perdidos pela cantora em seu processo de saída de sua antiga gravadora.

Além de canções românticas, Lover é repleto de composições que mais parecem cartas de amor escritas por Taylor para sua família, trabalho, parceiro e, por fim, ela mesma. 

Posicionamentos políticos no álbum Lover

Marcando uma nova fase na carreira de Taylor, o álbum apresenta posicionamentos políticos explícitos da cantora. Um dos pontos mais interessantes do álbum é a música The Man, cuja crítica é complementada por seu respectivo clipe. Nela, a compositora denuncia diversas formas de machismo na sociedade. Embora Taylor projete, de forma implícita, muitas de suas experiências pessoais, qualquer ouvinte pode se identificar facilmente com o eu lírico da canção.

The Man retrata a frustração das mulheres que, em todas as áreas, sentem que alcançariam seus objetivos mais rápido se fossem homens. A letra fala sobre como as mesmas características, como liderança, assertividade, confiança, etc. são vistas como positivas quando associadas a um homem e negativas quando associadas a uma mulher. 

Uma das canções mais pertinentes do álbum, The Man é complementada por um clipe recheado de exemplos do machismo do dia-a-dia. Desde manspreading, hipersexualização e objetificação feminina até um homem sendo parabenizado apenas por atitudes básicas como pai, o clipe desenha ‘’O Cara’’, o padrão que a sociedade aprova e estimula. 

Dirigido por Taylor, o clipe não chega a ser abrangente dentro das diversas pautas das discussões de equidade de gênero (apesar da grande quantidade de assuntos que aborda), visto que ainda é o olhar de uma mulher branca e privilegiada. Ainda assim, é um grande avanço para uma artista que, alguns anos atrás, não se posicionava politicamente. 

Cena do clipe "The Man", escrito, dirigido e protagonizado pela Taylor Swift.
Cena do clipe The Man, escrito, dirigido e protagonizado por Taylor. (Imagem: reprodução)

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‘’Every conquest I had made would make me more of a boss to you/I’d be a fearless leader/I’d be an alpha type/When everyone believes ya/What’s that like?’’

(Cada conquista me faria mais uma chefe para você/Eu seria uma líder destemida/Eu seria um tipo alfa/Quando todos acreditam em você/Qual a sensação?)

Outra música abertamente política do álbum é You Need To Calm Down, cuja mensagem vai contra discursos de ódio. Com uma pegada irônica, a letra fala sobre a obsessão dos grupos extremistas em atacar pessoas apenas por serem elas mesmas. O clipe, que conta com a presença de um grande grupo de artistas LGBTQ (como Hayley Kiyoko, Rupaul e Adam Lambert), traz mensagens de ativismo, união e defesa das pautas LGBTQ e feminista

You Need To Calm Down tem um tom semelhante ao lead single do álbum “1989, Shake it Off, agora em uma perspectiva mais ampla. A Taylor que se apresenta ao público não age mais como se todo o ódio do mundo estivesse voltado para ela. Pelo contrário, ela usa sua voz para falar sobre grupos que sofrem preconceito dia após dia. 

A música também fala sobre rivalidade feminina e, no clipe, Taylor faz as pazes publicamente com Katy Perry, artista com quem teve uma longa rixa. O vídeo termina com uma mensagem pedindo para que os espectadores assinem uma petição apoiando o Equality Act, que deve proteger a população LGBTQ de discriminação (a petição pode ser acessada aqui

‘’And we see you over there on the internet/Comparing all the girls who are killing it/But we figured you out/We all know now we all got crowns’’

(E nós vemos você na internet/Comparando todas as garotas que estão arrasando/Mas nós descobrimos você/Agora nós sabemos que todas nós temos coroas).

Katy Perry e Taylor Swift em "You Need To Calm Down"
Katy Perry e Taylor Swift no clipe You Need to Calm Down. (Imagem: reprodução)

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É muito positivo, tanto para a imagem de Taylor Swift como artista (visto que impulsiona sua relevância) quanto para o público, que a cantora passe a usar sua arte e influência para se posicionar a favor de minorias. O fato de que esse posicionamento está se tornando cada vez mais básico e essencial (a ponto de levar uma das artistas mais neutras do mundo da música pop a levantar diversas bandeiras) mostra que, lentamente, essas pautas estão sendo entendidas cada vez menos como privilégios e mais como discussões humanitárias.

Na música Miss Americana & The Heartbreak Prince, Taylor revela algumas indignações e medos em letras como ‘’My team is losing/Battered and bruising/I see the high fives/Between the bad guys’’( Meu time está perdendo/Ferido e machucado/Eu vejo as comemorações/Entre os caras maus). Muitas teorias associam outros trechos da música à referências às eleições de 2016 ー já que Taylor se posicionou contra uma senadora republicana no período da candidatura da mesma. 

Taylor Swift sobre ser definida pelas coisas que ama

Taylor Swift sobre ser definida pelas coisas que ama

“Lover” lembra outros álbuns de Taylor em diversos aspectos. A influências do synthpop, que também estão presentes em “1989″, não são a única similaridade entre “Lover” e outros trabalhos da cantora. 

Apesar das músicas muito animadas e da identidade visual iridescente e positiva, o álbum possui músicas intimistas sobre solidão, amor e maturidade. Uma delas é Daylight, que acaba por definir toda a essência do álbum com a fala de Taylor no final; I want to be defined by the things that I love. Not the things I hate, not the things I’m afraid of, the things that haunt me in the middle of the night. I just think that… you are what you love.”  (Eu quero ser definida pelas coisas que eu amo. Não as coisas que eu odeio, não as coisas que eu tenho medo, as coisas que me atormentam no meio da noite. Eu só acho que… você é o que você ama).

“Lover” é exatamente um compilado de cartas de amor de Taylor, que aparecem de muitas formas em músicas como Soon You’ll Get Better ー cuja letra lembra o fato de que a mãe da cantora enfrentou uma batalha contra o câncer recentemente ー ou ME! ー lead single do álbum, cujo clipe une várias coisas que Taylor ama e que a definem. 

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Em um trecho de Daylight há uma referência à música Red, do álbum homônimo, ‘’I once believed love would be burning red/But it’s golden’’ (Eu um dia acreditei que o amor seria vermelho ardente/Mas é dourado’’). Essa referência vai além da música, e fala sobre a temática do álbum “Red”, que é abordada no prólogo do mesmo:

‘’Minhas experiências com o amor me ensinaram lições difíceis, especialmente minhas experiências com amor louco. Os relacionamentos vermelhos (…) há algo a ser dito sobre ser jovem e precisar de alguém tão desesperadamente, que você pula de cabeça sem olhar. (…)

E há algo para se orgulhar ao superar e entender que o amor verdadeiro brilha dourado como a luz das estrelas, e não desaparece ou combusta espontaneamente. Talvez eu escreva um álbum inteiro sobre esse tipo de amor se eu um dia encontrá-lo.’’ ー Prólogo do álbum “Red”‘.

Seja na política ou no amor, Taylor Swift está mudando sua paleta de cores e deixando mais vermelhos para trás. 

Um amor que leva a recomeços

Taylor Swift

Muitas músicas do “Lover” soam bem parecidas, especialmente se o álbum for ouvido distraidamente. Canções como Death By a Thousand Cuts parecem muito características da cantora, algo que o ouvinte esperaria ouvir de Taylor e que poderia estar em qualquer álbum dela. 

A música que carrega o nome do álbum, Lover, é uma canção romântica que fala de um amor muito gentil e natural. O clipe conta a história de um relacionamento através de cômodos de uma casinha em um globo de neve. Toda a obra termina por traduzir a narrativa de um amor forte o suficiente para entrar no ‘’aquário’’ que é a vida de Taylor, sujeita à uma fama muitas vezes nem um pouco saudável. 

Outras canções muito fortes do álbum e que merecem destaque são The Archer e Cruel Summer. A primeira, muito intimista e sincera, expõe uma Taylor bastante vulnerável. Novamente muitas referências aparecem tanto no título (uma possível alusão ao signo da cantora, sagitário) quanto na letra, novamente usando simbologias que já apareciam em outros álbuns. The Archer é definitivamente uma das melhores músicas de “Lover”, com uma melancolia poderosa que renderia um álbum inteiro. Não é a primeira vez que, nas músicas mais sombrias e taciturnas, Taylor entrega uma honestidade que acaba sendo ignorada pela forma discreta como se apresenta. 

‘’I wake in the night, I pace like a ghost/The room is on fire, invisible smoke/And all of my heroes die all alone/Help me hold onto you’’

(Eu acordo no meio da noite, eu pairo como um fantasma/O quarto está em chamas, fumaça invisível/E todos os meus heróis morrem completamente sozinhos/Me ajude a me segurar em você)

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Cruel Summer é o possível próximo single do álbum. Uma música bastante interessante, narra um amor proibido que se desvela em trechos como ‘’I don’t wanna keep secrets just to keep you’’ (Eu não quero manter segredos só para manter você). Cruel Summer é outro exemplo definitivo da capacidade de Taylor de escrever músicas incríveis e fortes, com letras que sempre guardam significados e possíveis interpretações a mais do que aparentam.

No fim, a cantora apresentou um material que, ao não se esforçar tanto para se reinventar (como aconteceu com seu antecessor, o “Reputation), mostrou muita maturidade e qualidade. Sem tantas explosões, lutas com robôs e ostentações em iates, Taylor mostrou grandes mudanças em músicas que parecem muito com o que o público já está acostumado. 

Taylor Swift no clipe "Lover"
Taylor Swift no clipe “Lover”. (Gif: reprodução)

Lover convence muito mais que Taylor realmente esteja fazendo uma arte pelas coisas que ela ama e, como diz na música I Forgot That You Existed, esquecendo as coisas que odeia e que lhe fazem mal. E esse amor é o que a leva para muitos recomeços, especialmente em sua nova gravadora. No fim, os recomeços sagrados dos quais Taylor fala na música Cornelia Street parecem ser a melhor constante nas histórias escritas a cada nova obra da cantora. 

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Formada em Jornalismo. Gosta muito de cinema, literatura e fotografia. Embora ame escrever, é péssima com informações biográficas.
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