“Eu nunca…” – 2ª temporada: a volta da adolescente probleminha mais amada

“Eu nunca…” – 2ª temporada: a volta da adolescente probleminha mais amada

Depois do sucesso da primeira temporada, chegamos à muito aguardada continuação da série adolescente “Eu Nunca…” (Never Have I Ever, no original) da Netflix

AVISO: o texto abaixo contém spoilers da 1ª temporada

A season finale nos deixou a todas engatilhadas de curiosidade para saber o que a nossa protagonista, Devi (Maitreyi Ramakrishnan), faria depois de beijar e perceber que poderia estar a fim de ninguém mais ninguém menos que seu nêmesis, Ben (Jaren Lewison). No mesmo dia, ela se depara com o seu sonho de consumo, Paxton (Darren Barnet) e seu jipe descolado, a esperando em frente a sua casa. E tudo isso ocorre após o funeral de seu pai. 

Cena da segunda temporada de "Never Have I Ever"
Devi entre Paxton e Ben na sala de aula | Imagem: reprodução

Voltando um pouco, vamos relembrar que Devi começa a mostrar a sua história narrada de maneira esquisita e cômica pelo tenista aposentado Joe McEnroe. No piloto da série, ela está com as pernas paralisadas pelo que seria uma resposta psicossomática por presenciar a morte do pai, o amor de sua vida. Quando consegue se recuperar, a adolescente não mede esforços para fazer acontecer seus últimos anos do ensino médio, encerrando todo um ciclo acadêmico de muito estudo e notas brilhantes. Devi, então, procura o garoto mais popular da escola, Paxton, e pede para transar com ele.

Dali em frente acompanhamos a aproximação meio torta desta nerd com o dream boy da equipe da natação, enquanto Devi segue em embates intelectuais divertidíssimos com Ben, o outro número 1 da sala. 

AVISO: o texto abaixo contém spoilers da 2ª temporada

Os primeiros episódios podem ser considerados como a exaltação da protagonista humilhada. Devi, que na temporada anterior havia passado por alguns maus bocados como ficar paraplégica e ser atacada por um coiote, decide namorar Ben e Paxton ao mesmo tempo. E o seu plano até que dá certo no início, graças a ajuda de suas grandes amigas Eleonor (Ramona Young) e Fabiola (Lee Rodriguez) – que até faz uma análise aprofundada de como Devi poderia ser bem sucedida neste plano pelo fato de ninguém nunca reparar nela, sendo praticamente invisível. 

Aqui é interessante pensar nas sutilezas de raça que a criadora da série, Mindy Kaling, vai adicionando ao roteiro. Ela nunca precisa exatamente explicitar o que se passa ou perder o timing do humor, mas a crítica social nunca deixa de fazer parte dos acontecimentos da série. O racismo fica ainda mais explícito quando a escola recebe uma nova aluna indiana, que Devi descreve como sendo ela mesma, só que mais bonita e descolada.

A entrada de Aneesa (Megan Suri), explicita o lado competitivo de Devi, principalmente em relação ao ciúme que sente da aproximação de Aneesa com Ben. É muito legal como não existe uma idealização da sororidade entre mulheres, mas sim o caminho que se constrói nesta desconstrução que é, tantas vezes, desencorajada pela sociedade. O tema dos transtornos alimentares também é abordado na segunda temporada com a personagem de Aneesa.

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Eleanor, Fabiola e Devi na segunda temporada de "Eu Nunca...", série de Mindy Kaling
Eleanor, Fabiola e Devi na segunda temporada de Eu Nunca…| Imagem: reprodução

Namoros paralelos em “Eu nunca…”

Quanto à trama dos dois namorados, é Devi quem acaba furando seu disfarce respondendo a uma das garotas populares que jurava que estava namorando Paxton. Ela grita assumindo que era ela a namorada oficial ao lado de um Ben perplexo. Paxton, que estava chegando próximo a cena, sai correndo nervoso pela briga com Devi, resultando em seu atropelamento ao atravessar a rua sem olhar. 

Este acontecimento faz com que ele tenha que repensar toda a sua trajetória acadêmica, que antes estava completamente segurada pelo esporte. Há um episódio voltado para a história do nadador, narrada por Gigi Hadid, onde eles falam sobre as expectativas em relação às pessoas super bonitas versus seu conteúdo. O mesmo foi feito na temporada anterior em um episódio dedicado a Ben e narrado pelo incrível Andy Samberg

Paxton em "Never Have I Ever"
Paxton, o galã, em Eu Nunca… | Imagem: reprodução

O arco de Paxton é bem interessante nesta segunda temporada, deixando claro como é possível sair da superficialidade em um formato de humor adolescente com episódios de apenas 20 minutos. Na história dele conhecemos a realidade de um campo de concentração para japoneses imigrantes no pós-guerra estadunidense, onde seu avô teria ficado quando criança. 

As minorias não saem do holofote

Neste sentido é interessante pontuar como todos os personagens principais de “Eu Nunca…” fazem parte de alguma minoria social. Devi e Aneesa são asio-americanas, assim como Eleanor, Fabiola é negra, Ben é judeu e Paxton  é nipo-americano além de ter uma irmã badass com síndrome de Down. Dessa forma, Never Have I Ever pode ser considerada um estudo de caso bem sucedido sobre como colocar minorias na linha de frente de forma totalmente orgânica e sem demagogia.

Importante ressaltar também os percursos de Eleanor e Fabiola, que recebem uma atenção maior nesta temporada, Eleanor se envolvendo em um relacionamento abusivo, enquanto Fabiola tenta encontrar a sua identidade queer de forma padronizada, pensando que teria que abrir mão de sua própria identidade de mulher apaixonada por tecnologia. 

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Fabiola na série "Eu Nunca....", da Netflix
Fabiola percebe que pode ser queer e uma fera em robótica | Imagem: reprodução

Os altos e baixos de Devi

Nossa protagonista vai do céu ao inferno. No início, Devi se apaixona por dois caras, em seguida passa a ser odiada e exposta ao ter iniciado um rumor por ciúmes sobre sua compatriota Anessa. E tem sido discutido na internet sobre como ela pode ser odiável e egoísta, no entanto, não vemos muitos comentários como esses sendo levantados em relação a personagens masculinos e pessoas brancas. Devi é completamente imperfeita, intensa e reativa. Mas ao mesmo tempo a personagem vive um luto profundo e está em busca de sentido. 

Devi aprende muito ao longo da série. Aprende sobre si mesma, suas origens, sua família, e principalmente mais para o final, ela aprende sobre seu valor ao não aceitar seguir em um relacionamento às escondidas com Paxton. Dessa maneira, é reconfortante assistir a essa menina indiana de personalidade forte dançando em um clichê estadunidense com seu namorado popular. Sim, ele acaba voltando atrás quanto a tornar o relacionamento deles público. 

Aneesa na segunda temporada de "Eu Nunca...."
Aneesa, a versão “melhorada” de Devi, na segunda temporada de Eu Nunca… | Imagem: reprodução

Precisamos falar sobre a atuação sensacional da jovem de 19 anos, Maitreyi Ramakrishnan. Até mesmo para atores e atrizes experientes é difícil encontrar o timing no humor, e Maitreyi faz isso pulando do humor para o drama como se fosse simples como respirar. Uma gênia que ainda veremos brilhar muito nas telinhas!

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Vale mencionar a família de Devi. Primeiramente, sua mãe (Poorna Jagannathan), que pensa em voltar para a Índia para estar com a família, é praticamente ignorada e acaba encontrando conforto onde menos imagina, com a sogra. Já a vó de Devi acaba voltando para morar com elas na Califórnia, rendendo algumas das cenas mais hilárias da temporada. Por último, a prima de Devi, Kamala (Richa Moorjani), também vive um dilema no seu trabalho e se reafirma como autora de um artigo científico que tinha descobertas suas e do qual estava sendo apagada por machismo do seu chefe.

O final de “Eu nunca…”

Muitas pessoas torceram o nariz para o final da segunda temporada de “Eu Nunca….” com Paxton, pois o ship com Ben é real e quase majoritário na internet. Agora, no entanto, precisaremos aguardar a próxima temporada, que apesar de não ter sido oficialmente confirmada pela Netflix, espera-se que seja no próximo mês.

Devi (Maitreyi Ramakrishnan) na segunda temporada
Devi segue com seu arco de maturidade em “Eu Nunca…”| Imagem: reprodução

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Jacu metropolitana com mente abstrata, salva da realidade pelas ficções. Formada em comunicação social, publicitária em atividade e estudante de Filosofia. Mais de trinta anos sem nunca deixar comida no prato.
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