“A Freira 2” se difere da própria franquia e deixa a desejar

“A Freira 2” se difere da própria franquia e deixa a desejar

Os cinemas brasileiros receberam, no dia 7 de setembro, o mais recente capítulo do universo cinematográfico de Invocação do Mal, iniciado em 2013 pelo diretor James Wan. A Freira 2 é a sequência da história do demônio Valak, que fez sua primeira aparição em Invocação do Mal 2 (2016) e ganhou tanto protagonismo que se tornou um dos spin-offs mais aguardados da série.

O primeiro filme, lançado em 2018, se passa na Romênia de 1952 e começa com o trágico suicídio de uma freira, que se lança de uma das janelas do convento para escapar da possessão de Valak, uma entidade que assume a forma de uma freira com traços demoníacos em suas aparições.

O enredo de A Freira: uma breve recapitulação

Dadas as circunstâncias, o Vaticano envia o Padre Burke (Demián Bichir) e a Irmã Irene (Taissa Farmiga) para investigarem o caso. À medida que a história se desenrola, eles conhecem Maurice (Jonas Bloquet), o entregador de suprimentos do convento, que se torna seu guia e um aliado crucial no combate ao vilão sobrenatural.

Nos momentos finais do filme, os personagens principais acreditam ter finalmente banido Valak, mas a cena final revela que tudo foi uma ilusão criada pela criatura, insinuando que o demônio está possuindo Maurice. Esse momento estabelece uma das conexões com os outros filmes da franquia, ao reproduzir uma das cenas do primeiro Invocação do Mal (2013).

Nessa parte do filme, Ed (Patrick Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga) apresentam um de seus casos mais assustadores de possessão demoníaca em uma universidade, onde o homem possuído é o supramencionado Maurice.

Na continuação da saga, se passaram quatro anos desde os acontecimentos do primeiro filme, e agora a Irmã Irene está na França e precisa enfrentar Valak novamente quando o falecimento de um padre desencadeia uma série de mortes de religiosos na região.

Taissa Farmiga em "A Freira" (2018)
Taissa Farmiga em “A Freira” (2018) | Foto: Reprodução

A Freira 2: a história possui um potencial não explorado

Ao contrário das narrativas de outros filmes do universo cinematográfico de Invocação do Mal, como Annabelle (2014), A Freira não foi baseada em um dos casos reais analisados e enfrentados por Ed e Lorraine Warren. Contudo, pode-se dizer que há inspiração em pelo menos uma história real vivida pelo casal.

Tony Spera, genro do casal e líder da Sociedade de Pesquisa Psíquica da Nova Inglaterra, afirmou em 2018 em entrevista ao portal Esquire que o fantasma da freira se assemelha a uma presença espectral que os Warren encontraram durante um trabalho na década de 1970 na igreja de Borley, no condado inglês de Essex.

Após ouvirem sobre uma série de eventos estranhos no local, incluindo sinos tocando sem motivo, rumores de um monge decapitado deixando mensagens enigmáticas nas paredes e uma freira fantasma avistada caminhando à noite, os Warren recrutaram fotógrafos para capturar evidências do espírito.

No escuro, sem velas ou luzes, os fotógrafos tiraram fotos com filme infravermelho em uma câmera 35mm. Quando revelaram as imagens, viram o que parecia ser o espectro de uma freira rezando e caminhando pelo corredor. Spera sugere que a freira pode ter sido inspirada por essa experiência, embora Hollywood costume mesclar diferentes histórias para criar os enredos dos filmes de terror. 

Igreja de Borley na época da investigação
Igreja de Borley na época da investigação | Foto: Arquivo da Sociedade de Pesquisa Psíquica da Nova Inglaterra

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James Wan e o sucesso de elementos assustadores

Admiradoras da franquia podem notar um grande potencial desperdiçado pelo diretor Michael Chaves, da mesma forma que Corin Hardy fez no primeiro longa dedicado à personagem.

James Wan elevou o nível dirigindo os dois primeiros filmes de Invocação do Mal. Apesar das histórias reais como base, conseguiu traduzir elementos para a tela que causaram horror nos espectadores, e A Freira é um exemplo.

Na verdade, o que Lorraine Warren viu em sua casa, retratado em Invocação do Mal 2, não foi uma freira, mas sim uma fumaça preta, e Wan trouxe algo ainda mais aterrorizante para a tela.

“Eu senti que queria voltar ao aspecto do personagem, e lembro-me de falar com Lorraine Warren quando ela ainda estava viva, e ela me disse que muitos de seus amigas próximas eram freiras.

E então me ocorreu que – uau, se uma entidade maligna mexesse com ela, uma das coisas que isso faria para corromper sua fé e crença seria assumir a aparência icônica de algo que é próximo e querido para ela.

E foi assim que surgiu a ideia de uma freira demoníaca.”

– James Wan em entrevista ao portal Cinema com Rapadura

A mudança de diretores é um dos fatores principais para a diferença entre os filmes

A genialidade de Wan, aliada à aura misteriosa da personagem, foram os principais motivos que empolgaram o público com a notícia de mais um spin-off da saga.

Nos dois filmes da freira, os novos diretores exploraram a história de Valak, suas conexões com os Warren e elementos sobrenaturais, mantendo o legado de James Wan. No entanto, escolheram uma abordagem mais focada na ficção e abusaram de jumpscares que assustam momentaneamente, mas não deixam um medo duradouro.

Apesar do apelo religioso ainda presente, a narrativa parece se concentrar mais em Irene, que ganha um protagonismo maior como heroína do que a própria personagem que dá nome aos filmes.

Falta de exploração das origens de Valak 

Não há uma exploração aprofundada das origens do demônio com o qual estão lidando, diferentemente de produções como Annabelle, onde, além da investigação dos personagens sobre o espírito obsessor, também há um esforço da equipe de produção para contar a história de origem de uma das figuras mais conhecidas do cinema de terror.

Cena de "A Freira 2"
Cena de “A Freira 2” | Reprodução

A importância da atmosfera do terror sobrenatural

Observa-se também um certo desconhecimento em relação aos espectadores. Aqueles que continuam assistindo aos filmes da franquia o fazem porque apreciam a sensação de arrepio e assombro que o terror sobrenatural proporciona de forma sorrateira. Não há necessidade de sustos repentinos, monstros com dentes afiados ou cenas típicas de filmes de terror slasher.

A adrenalina esperada é aquela gerada ao testemunhar um objeto inanimado movendo-se lentamente por conta própria, um brinquedo interagindo com uma criança ou uma rajada de vento que revela uma forma humana sob um lençol estendido em um quintal vazio.

É esse tipo de cena que cria tensão progressiva e aumenta a expectativa para o desfecho, pois sabemos que algo está prestes a acontecer, mas a condução lenta dos eventos aumenta a apreensão do espectador. Essa abordagem que parece estar faltando nos filmes centrados em Valak.

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Apesar de os atores desempenharem bem os papéis designados, seus personagens não conseguem sustentar plenamente a história em que estão inseridos. A mudança de direção parece ter alterado o conceito da franquia, não se limitando apenas aos spin-offs.

Ao dirigir Invocaçãodo Mal 3: A Ordem do Demônio (2021), Michael Chaves (o mesmo diretor de A Freira 2) também parece não abraçar os elementos sobrenaturais da mesma forma que James Wan costumava fazer.

O futuro da franquia e a esperança por um retorno às origens

Porém, apesar das limitações, assistir a um filme de terror nos cinemas continua sendo uma experiência única. Mesmo sem um roteiro excepcional, A Freira 2 conseguiu causar o mesmo impacto que seus predecessores durante as cenas de suspense. Houve um silêncio quase palpável na sala, onde ninguém parecia respirar devido à tensão de não saber o que aconteceria em seguida.

Bonnie Aarons e Taissa Farmiga em "A Freira"
Bonnie Aarons e Taissa Farmiga em “A Freira” | Reprodução

A próxima produção do Universo Cinematográfico de Invocação do Mal foi confirmada durante o painel da Warner Bros. Discovery na convenção CinemaCon, em Las Vegas, em abril deste ano. The Conjuring: Last Rites (Os Últimos Rituais, em tradução livre) ainda não possui uma data de estreia definida, mas contará novamente com Vera Farmiga e Patrick Wilson nos papéis do casal Warren.

O roteiro será escrito por David Leslie Johnson-McGoldrick, responsável por adaptar o caso das famílias Hodgson e Glatzel para o cinema. Até o momento, não há informações sobre o diretor, embora Patrick Wilson tenha demonstrado interesse em dirigir após sua estreia como diretor em Sobrenatural: A Porta Vermelha (2023).

Independentemente das escolhas futuras da equipe de produção, espera-se que o que pode ser o último filme da saga resgate a essência arrepiante dos primeiros filmes, completando o ciclo de uma das franquias de terror mais notáveis do cinema.

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Uma jornalista apaixonada por música, literatura e cinema. Seus maiores hobbies incluem criar playlists para personagens fictícios e falar sobre Taylor Swift nas redes sociais.
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