Jessie J: pop que discute a autoestima e busca uma autoimagem positiva

Jessie J: pop que discute a autoestima e busca uma autoimagem positiva

“Eu era uma garotinha frágil, que sofria bullying, com uma doença cardíaca – até que eu cresci para me tornar a Jessie J.” É assim que Jessie J se descreve em uma breve autobiografia. Hoje cantora, compositora e uma das artistas modernas mais bem-sucedidas do Reino Unido, Jessie, por sua música, é muitas vezes referenciada como um dos maiores símbolos de um pop do bem-estar, que preza pela qualidade da autoestima e empoderamento pessoal.

Os primeiros anos de Jessie J

Nascida em 1988 em um distrito de Londres, Inglaterra, Jessica Ellen Cornish frequentou desde muito cedo a Colin’s Performing Arts School e, aos 11 anos, estava no elenco de uma montagem da peça “Whistle Down the Wind, de Andrew Lloyd Webber. Três anos depois, ela entraria para a National Youth Music e participaria da produção de “The Late Sleepers, de Paul James.

Jessie J em suas primeiras apresentações
Jessie J em suas primeiras apresentações (Imagem: reprodução)

Um ano após participar da última peça, em 2003, Jessica Cornish – então aos 15 anos – venceu o prêmio de Melhor Cantora Pop no programa de TV Britain’s Brilliant Prodigies. Em seguida, buscando a música com a sua “coisa” no mundo, ela começou a estudar na BRIT School, logo integrando o grupo “Soul Deep“. Na turma em que se graduou também estavam Leona Lewis e Adele.

Estreia na música pop e “Who You Are”

Assinando com a Gut Records para um disco em 2006, a gravadora decreta falência antes do lançamento. Jessie J, então, encontra sucesso inicial como compositora, escrevendo “Repeat” para David Guetta (e gravando os vocais logo depois) e “Party In The USA” para Miley Cyrus, a exemplo. Em 2008, ainda, Jessie se apresenta como show de abertura para as apresentações no Reino Unido da tour Bring Ya to the Brink de Cindy Lauper – com a já consagrada cantora convidando Jessie para as performances da clássica “Girls Just Want To Have Fun” ao vivo.

Tendo começado a trabalhar em seu álbum de estreia em 2005, Jessie termina o processo de produção apenas em janeiro de 2011. “Who You Are” foi lançado em fevereiro do mesmo ano e rapidamente alcançou as paradas de sucesso, chegando a número 2 no UK Album Charts poucas semanas depois. Com singles potentes ganhando as rádios, “Price Tag” alcançou o número 23 na Billboard Hot 100, número 1 nos charts do Reino Unido, da Nova Zelândia e da Irlanda. O videoclipe do single também é o mais assistido de Jessie J pelo mundo.

Who You Are
Jessie J durante turnê (Imagem: reprodução)

O álbum se espalhou pela América do Norte facilmente. Jessie então foi convidada a se apresentar como show de abertura para a tour California Dreams de Katy Perry, mas acabou precisando cancelar por ter quebrado o pé nos ensaios. Ainda se recuperando da lesão, ela se apresentou no Summertime Ball, no Wembley Stadium, sentada num trono dourado – fato que se repetiu também em sua apresentação no Glastonburry Festival de 2011.

Jessie J no trono dourado de suas apresentações em 2011
Jessie J no trono dourado de suas apresentações em 2011 (Imagem: reprodução)

O sucesso da estreia de Jessie J e sua potência musical foram tão estrondosos que, pouco mais de um ano depois do lançamento do álbum, Jessie se apresenta na Cerimônia de Encerramento dos Jogos Olímpicos de 2012 em Londres, se apresentando com Tinie Tempah e Taio Cruz nas primeiras músicas e finalizando com uma performance lendária de “We Will Rock You” com o Queen. Logo em seguida, Jessie também é escalada como técnica para as duas primeiras temporadas do The Voice UK.

Jessie J e o Queen se apresentam no encerramento das Olimpíadas de 2012 em Londres
Jessie J e o Queen se apresentam no encerramento das Olimpíadas de 2012 em Londres (Imagem: reprodução)

“Alive” e “Sweet Talker”

O segundo álbum de Jessie J, “Alive”, foi lançado em 2013, com várias participações de artistas diversos a longo das faixas – Becky G, Big Sean e Dizzee Rascal são alguns. Como “Who You Are”, “Alive” trouxe a excelência vocal de Jessie num mix de pop e R&B cheio de influências, mantendo as composições fortes e marcantes, maioria em parceria com Claude Kelly, que também foi co-autor de “Price Tag”. Alcançando terceiro lugar no UK Album Charts pouco após seu lançamento, uma parceria interessante do álbum é a faixa “Breathe”, escrita em parceria com a cantora e compositora Sia Furler.

Jessie J
Jessie J (Imagem: reprodução)

Seguindo os lançamentos de “Who You Are” e “Alive”, Jessie J lança seu terceiro álbum, “Sweet Talker” em 2014, pouco mais de um após o segundo. Novamente, o álbum traz diversas parcerias ao longo das canções – de cantores, compositores e produtores. O single principal do álbum, “Bang Bang” é lançado conjuntamente com Ariana Grande e Nicki Minaj e alcança aclamação da crítica, chegando a primeiro lugar nos charts do Reino Unido e ao top 10 de diversos outros países. O single “Masterpiece” do mesmo álbum marcou o quinto lugar na Billboard Hot 100.

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A era “R.O.S.E”

Após o lançamento de três discos em pouquíssimo tempo, Jessie J experimenta um hiato rápido na produção de novas músicas. Em 2015, ela participa como mentora no The Voice Australia e lança o single “Flashlight“, como parte da trilha sonora de “A Escolha Perfeita 2“. No ano seguinte, ela integra a equipe de dubladores de “A Era Do Gelo: O Big Bang“.

Somente em 2017 a cantora britânica lança um novo single e dá indícios da produção de um novo disco. “R.O.S.E.” é lançado em quatro etapas, cada uma representando uma etapa de um relacionamento – com o outro ou consigo mesma: “R (Realisations)”, “O (Obsessions)”, “S (Sex)” e “E (Empowerment)”.

Jessie J
Jessie J (Imagem: reprodução)

Com um total de 12 músicas, foram lançados quatro singles para o álbum, “Think About That”, “Real Deal”, “Not My Ex” e “Queen”, cada um representando uma parte da construção. O disco foi considerado uma expressão de Jessie J levando sua música ainda a um nível mais pessoal, trazendo letras ainda mais significativas subjetivamente e consideradas por alguns críticos ainda mais poéticas.

Após esse último lançamento em moldes não tão usuais, Jessie J lança em 2018 um disco de músicas natalinas intitulado “This Christmas Day”. No mesmo ano, ela participa e se torna a primeira ganhadora estrangeira do “Singer 2018”, uma competição musical chinesa, e também como técnica do The Voice Kids UK. Em 2019, Jessie sinaliza que está buscando escrever novas canções, utilizando seu instagram para sinalizar que tem buscado proximidade com o que chama de “new pop/soul”, e volta a participar de festivais de música ao redor do mundo.

O pop em defesa da autoestima saudável

Conhecida pela voz potente e por performances de palco cheia de energia que prendem o público e trazem aclamação, Jessie J – que afirma não ter nenhum grande motivo para o J de seu nome artístico – também é conhecida como uma cantora pop que traz outros elementos narrativos para suas músicas. Para além das histórias românticas e batidas clássicas do ritmo, Jessie coloca, desde seu primeiro lançamento, a busca pelo bem-estar e pelo autocuidado em suas letras.

Still do videoclipe de "Who You Are"
Still do videoclipe de “Who You Are” (Imagem: reprodução)

Dois de seus três primeiros grandes singles, ainda em seu álbum de estreia, torna-se nítido seu discurso humano e empoderado. “Who You Are” é uma das produções que tem mais orgulho e uma das apresentações mais emocionais da cantora em suas turnês. Na letra, Jessie reflete sobre a autoimagem que possui de si mesma e sobre como nos forçamos frequentemente a ser uma coisa que não somos. “É sobre ser verdadeiro a você mesma. Não perder quem se é em qualquer situação de provação”, diz em uma entrevista, paralelamente à letra da música: “Por que estou fazendo isso comigo mesma? (…) Eu quase deixei meu eu verdadeiro de lado. Não perca quem você é na luz borrada das estrelas”.

A narrativa da canção conversa diretamente com o single lançado dois álbuns depois, “Masterpiece”: “Às vezes eu estrago tudo, eu miro e erro, mas tudo bem, estou bem com isso porque eu ainda quebro a cara algumas vezes e eu não consigo fazer tudo certo. Eu sou perfeitamente incompleta, ainda estou trabalhando na minha obra-prima”.

Still do videoclipe de "Masterpiece"
Still do videoclipe de “Masterpiece” (Imagem: reprodução)

Ainda em “Who You Are”, Jessie também reflete a noção que temos na sociedade sobre se sentir mal, sobre o choro e sobre nossos erros: “Está tudo bem em não estar bem (…) Às vezes é difícil seguir o próprio coração. Lágrimas não significam que você está perdendo”. Questionamento parecido continua no single “Nobody’s Perfect”, em que a cantora reflete sobre um erro cometido, assume que foi a causadora de dor, mas também pensa sobre a necessidade do perdão e da noção de perfeição de que nunca erramos que temos em sociedade: “Não me diga que não pode me perdoar, porque ninguém é perfeito.”

No seu álbum mais recente, “R.O.S.E”, Jessie lança o single “Queen”. Na letra, a britânica vai ainda mais a fundo no reforço a uma autoestima e autoimagem saudável, focando a música principalmente em questões do movimento body positive e na quebra de estereótipos. “O mundo diz que a beleza está mudando, dane-se isso, é falsa expectativa e não é a coisa real.” Em seguida, Jessie J entoa a tentativa de um mantra para o amor próprio: “Eu amo meu corpo, eu amo minha pele, eu sou uma deusa, eu sou uma rainha”.

Jessie J no videoclipe intimista de "Not My Ex"
Jessie J no videoclipe intimista de “Not My Ex” (Imagem: reprodução)

Ainda nessa fase, Jessie J também lança a música “Not My Ex”, que reflete de certa forma sobre um relacionamento abusivo que a machucou e deixou marcas – e da dificuldade de entrar em um novo relacionamento que se propõem saudável por conta das sombras do anterior. Levando o instrumental intimista e pessoalíssimo da canção inclusive para o videoclipe, Jessie canta num tom mais suave de sua voz conhecida por fortes agudos: “Não posso prometer que não vou me machucar, só posso prometer que não seremos como eles.”

Quem é Jessie J hoje?

Desde criança, a cantora enfrenta a síndrome de Wolff-Parkinson-White, que causa batimentos cardíacos irregulares, falta de ar intensa e a levou a ter um pequeno AVC aos 18 anos – desde então, Jessie precisa cuidar minuciosamente do próprio corpo e a fez entender que não pode levar nada de graça para a vida. A canção “Big White Room“, lançada em versão ao vivo no seu primeiro disco, é um produto de uma de suas longas estadias no hospital para tratar a síndrome.

Com esse entendimento precoce do valor que sua vida possuía, ela descobriu a própria voz e o hobby de cantar em todo os lugares pelo qual passava – decidindo mais tarde que o hobby podia se tornar sua carreira e que a garotinha “frágil e doente” poderia chegar muito mais longe do que as cama de hospital.

o pop que discute a autoestima e busca uma autoimagem positiva

Jessie J também é vegana e bissexual, falando sobre a sua sexualidade abertamente e sobre como é importante a sua postura para inspirar garotas mais novas. Hoje, Jessie J é isso: uma potência musical por seu talento, seu alcance vocal e sua capacidade de encantar milhões de pessoas num show, mas, principalmente, por seu foco em produzir música que empodere e que fortaleça a autoestima e o amor próprio de quem ouve.


Edição realizada por Isabelle Simões.

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Jornalista, fotógrafa, feminista e lésbica cearense. Ariana torta e viciada em qualquer série, filme ou livro que tenha mulheres amando mulheres, tem voltado sua atuação à defesa dos direitos humanos e à luta por visibilidade e representatividade lésbica. Não dispensa uma pizza ou uma balinha de gengibre das que vendem no ônibus. Nas horas vagas se atreve a escrever ficção científica.
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