Você acorda em uma mansão no meio de uma floresta sem memórias. Na sua frente, encontra-se uma mulher de aparência fantasmagórica. Ela afirma conhecê-lo, mas você não consegue se lembrar dela, tendo apenas um sentimento de pertencimento àquele lugar misterioso, como se tivesse vivido ali há muito tempo.
A mulher, que se apresenta como “Maid” (ou “Criada” em português), o identifica como o senhor da casa. Surpresa por você não conseguir se lembrar de quem é, ela decide ajudá-lo a refrescar suas memórias. Ela tem esperado por esse momento de reencontro e tem várias histórias para contar sobre o passado da casa. No entanto, ela lhe dá um aviso: não solte a sua mão, ou você pode se perder nesse mar de memórias e histórias.
Essa é a introdução do romance visual The House in Fata Morgana, um jogo oficialmente descrito como uma história que aborda a tragédia, a natureza humana e a insanidade.
A dramaticidade dos acontecimentos narrados, aliada ao ambiente lúgubre da mansão, proporciona as jogadores uma experiência única de mergulhar em uma verdadeira história gótica que oferece toda a experiência estética típica do gênero.
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Uma mansão que desafia o tempo e espaço
A ambientação é um dos aspectos mais importantes do gênero gótico. Nessas histórias, o espaço é frequentemente transcendido além de uma realidade material e impessoal; ele se torna personificado, podendo até mesmo ser interpretado como um personagem na história.
The House in Fata Morgana explora perfeitamente esse tropo narrativo ao ambientar grande parte da história na misteriosa mansão que dá nome ao título do jogo. A casa não é apenas o pano de fundo para a ação que ocorre em Fata Morgana; ela é fundamental para a compreensão de todos os pontos obscuros apresentados durante o enredo, além de ser uma parte definidora da identidade dos personagens e carregar consigo o passado e as memórias de quem a habitou.
E como qualquer boa casa mal-assombrada, ela está repleta de fenômenos misteriosos e inexplicáveis.
Quando a Maid pega a mão do protagonista principal, ela o conduz até uma porta fechada. Atrás dela, ouvem-se risadas alegres de crianças. São apenas ecos do passado, reverberações de outra época que persistem como fantasmas. A mansão está cheia de quartos assombrados, e ao longo do jogo, somos convidadas a visitar seus habitantes e conhecer suas histórias.
Ao abrir cada porta, não somos apenas transportadas para outra era, mas também para uma localização geográfica completamente diferente.
A história da mansão e de seus habitantes, da forma como é contada pela Maid, abrange desde a Idade Média francesa até os Estados Unidos no século XIX. Isso solidifica ainda mais a mansão como uma entidade sobrenatural que ignora completamente as restrições de tempo e espaço. É quase onipresente, como um fantasma que o assombra onde quer que você vá.
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Criadas, Bruxas e Garotas de Cabelos Brancos
Apesar de cada porta carregar consigo uma história única, marcada por algum tipo de tragédia, alguns temas recorrentes assombram todos os contos em The House in Fata Morgan.
Em primeiro lugar, há a presença da Maid, a fiel serva da casa, que parece existir através dos séculos sem envelhecer um dia. Depois, há uma misteriosa garota de cabelos brancos que mantém sua aparência física atrás de cada porta, porém vive como uma pessoa diferente em cada versão. Por fim, tem-se uma cruel bruxa que reside na casa, apenas aludida por outros personagens, cuja existência pode ou não ser real.
Assim como o protagonista, as jogadoras se veem presas em um perpétuo cabo de guerra entre a realidade e a irrealidade. Quem são todas essas pessoas? Elas realmente existem ou são ilusões criadas pela casa? Por que a Maid insiste em contar suas histórias? O que essas histórias revelam sobre a identidade do protagonista? Elas poderiam ser a chave para desbloquear suas memórias perdidas?
À medida que a história avança, as peças começam a se encaixar, e somos tomadas por um sentimento de estranhamento freudiano. Embora a verdade ainda esteja velada, os elementos recorrentes das histórias vão revelando aos poucos algo que você, como personagem principal, deveria saber, mas não consegue identificar.
A ausência de sua própria história torna-se palpável, onde você começa a tentar se encontrar nas histórias dos outros personagens. Maid, a garota de cabelos brancos e a misteriosa bruxa parecem ser personagens fundamentais para entender sua própria identidade.
Assombrando a sua própria narrativa
The House in Fata Morgana é, sem dúvida, uma história de fantasmas. Não apenas porque se passa em uma mansão assombrada, mas também porque é constituída por pilares edificantes das histórias góticas de fantasmas: o trauma e o eterno retorno da dor e da violência infligidas aos personagens.
Com a revelação do mistério no final do jogo, passamos a entender por que os personagens estão presos no limbo que a mansão representa. Seja porque foram agentes de violência e agora devem sofrer por suas ações passadas, seja porque são espíritos obcecados em busca de vingança pelo sofrimento que passaram, todos são habitantes de um espaço liminar compartilhado, vítimas de sua própria psique. Para encontrar a liberdade, eles precisarão confrontar o passado.
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Por que jogar The House in Fata Morgana?
Embora o jogo não seja de forma alguma uma experiência leve (prepare os lenços, pois haverá lágrimas!), a obra transmite com precisão as complexidades da experiência humana.
E, de forma mais importante, ele é um ótimo veículo para a empatia, pois, como jogadoras, somos confrontadas com diferentes pontos de vista de vários personagens e levadas a compreender o coração humano que existe por trás de ações às vezes questionáveis.
Mas o jogo não é apenas uma tragédia; ele consegue equilibrar seus momentos mais dolorosos com cenas de pura alegria e comédia. Estar exposto a uma visão tão abrangente dos personagens nos faz sentir ainda mais ligadas a eles ao longo de sua jornada.
Por fim, The House in Fata Morgana é um romance visual, o que significa que boa parte de sua história é transmitida por meio de texto escrito. Sua jogabilidade limitada pode não ser muito atraente para um público gamer mais tradicional, mas provavelmente será bem-recebida por um público mais literário.
Os apreciadores do gênero gótico certamente terão uma experiência maravilhosa com o jogo! Mas não se esqueça: nunca solte a mão da Maid, pois a conexão humana é fundamental.
The House in Fata Morgana está disponível para PC (via Steam).
