How to Have Sex: o que acontece nas férias, (não) fica nas férias

How to Have Sex: o que acontece nas férias, (não) fica nas férias

Para a grande maioria dos jovens, terminar o ensino médio é sinônimo de mudança. A autodescoberta, somada à vivência de novas experiências, regem uma espécie de “ritual de passagem” que começa na adolescência e continua na vida adulta.

Em How to Have Sex, longa-metragem de estreia da diretora Molly Manning Walker, a história nos apresenta elementos básicos de qualquer coming of age. Porém, de forma muito sensível e compreensiva, as situações em que os personagens se envolvem evocam memórias da parte mais eufórica, libertina e inquietante dessa fase.

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Desembarcando em Mália

A jornada de Tara, personagem interpretada pela atriz Mia McKenna-Bruce, se inicia com uma viagem para a cidade costeira de Mália, na Grécia. Junto das amigas Skye e Em (Lara Peake e Enva Lewis), elas têm como objetivo fazer deste o melhor verão de suas vidas.

De fato, quando chegam ao destino final, as três mantém as expectativas elevadas. O curto período de tempo longe da rotina e das incertezas que o futuro trará consigo, promete muitas festas, bebidas e sexo.

O trio Skye, Em e Tara no começo da viagem - cena do filme "How to have Sex"
O trio Skye, Em e Tara no começo da viagem (Imagem: Reprodução)

A princípio, o filme aparenta ser só uma espécie de “mais do mesmo”, onde a protagonista, recebendo apoio das amigas, deseja cumprir a meta de perder a virgindade. Porém, olhando atentamente para as expressões de Tara desde o início, é possível perceber que essa ideia deixa-a um tanto quanto apreensiva, evidenciando o verdadeiro ponto principal que a história quer discutir.

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A pressão social em How to Have Sex

Mesmo após as garotas se misturarem a outros jovens, a sequência exaustiva de festas deixa Tara cada vez mais desconfortável. Badger (Shaun Thomas), Paddy  (Samuel Bottomley) e Paige (Laura Ambler), que chegaram em Mália a mais tempo, rapidamente se enturmam com elas. No entanto, se tornam o motivo pelo qual a viagem toma um novo curso para a protagonista.

Badger, que de início aparenta ser o cara com quem Tara irá se envolver durante a estadia, se torna apenas um bom amigo. Inesperadamente, Tara termina uma das noites ao lado de Paddy nas areias de uma praia deserta. No dia seguinte, todos se dão conta da ausência de Tara, deixando a pior das hipóteses trabalhar na mente do espectador.

O incômodo da cena, onde a personagem apenas aceita a vulnerabilidade na qual está exposta, nos instiga a pensar na pressão social que sentimos durante a transição de fases da vida. Essa ideia de atraso em relação a outras pessoas, e a pressa para evitarmos o julgamento, resultou em uma experiência abusiva, criminosa e decepcionante. Se Tara esperava garantir sua primeira relação sexual de forma recíproca, infelizmente ela recebeu o contrário.

A sensação indigesta, causada pelo olhar que Tara transmite, somada à sequência de cenas onde a personagem ainda se sente aflita após o ocorrido, permanece até o desfecho da história. Mesmo quando ela se junta com outro grupo, que aparenta estar genuinamente se divertindo, é alarmante ver como Tara precisa suportar as memórias do momento anterior sozinha.

O sofrimento silencioso de Tara é pungente durante diversas cenas - cena do filme "How to have Sex"
O sofrimento silencioso de Tara é pungente durante diversas cenas (Imagem: Reprodução)

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Consentimento e amizades femininas

Quando Tara retorna para junto das amigas, naturalmente o alívio se instaura. No entanto, o sentimento de preocupação que as garotas transmitem sobre o sumiço da noite passada não é suficiente para convencê-la a se abrir sobre o acontecimento.

Enquanto Skye está certa de que Tara sumiu apenas porque estava com Paddy, Em percebe que há algo além de meias-verdades. O mesmo pode ser dito de Badger, que é um dos primeiros a notar o comportamento distante da personagem.

O desempenho da atuação de Mia McKenna-Bruce é suficiente para causar desconforto - cena do filme "How to have Sex"
O desempenho da atuação de Mia McKenna-Bruce é suficiente para causar desconforto (Imagem: Reprodução)

A viagem, que teve um início festivo e alegre, chega ao fim com uma atmosfera completamente diferente para Tara. Na última noite das garotas em Mália, ela não consegue aproveitar a festa da maneira que imaginava. Como se a situação já não estivesse ruim o suficiente, Tara ainda acorda na manhã seguinte sendo vítima de mais uma violação sexual por parte de Paddy.

Atormentada, Tara se prepara para embarcar carregando o peso de ter sido abusada. O fato de não ter comentado nada deixa um gosto amargo na despedida do trio e dos novos colegas.

Já no aeroporto, Em consegue arrancar a verdade de Tara, e, embora esse não seja o foco principal da trama, o vínculo entre as duas destaca o quão importante e essencial é uma amizade feminina. A compreensão mútua que somente outra mulher pode oferecer nos motiva a refletir sobre a significância desse laço.

Em e Tara representam, naturalmente, a confiança e o companheirismo que uma boa amizade entre mulheres deve ter.
Em e Tara representam, naturalmente, a confiança e o companheirismo que uma boa amizade entre mulheres deve ter (Imagem: Reprodução)

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Consentimento sobre sexo no cinema

É interessante como a diretora não impede que o espectador responsabilize a vítima pelo ocorrido. Embora saibamos quem é o culpado, ainda assim, nos encontramos pensando em como poderíamos evitar estar na mesma situação que Tara.

Fora das telas, a realidade é semelhante, pois não é necessário adentrarmos um ambiente hostil para estarmos alertas em relação às pessoas ao nosso redor; por exemplo, basta sair vestindo uma roupa mais curta para que a preocupação se eleve ao mesmo nível.

A conclusão pode parecer óbvia, mas a forma como conversa com o público jovem é atrativa. O consentimento sobre relações sexuais no cinema é algo que deve ser projetado com responsabilidade e também ser discutido além das entrelinhas.

Tanto Tara como o filme em si, relembram aspectos das séries Euphoria e Skins.
Tanto Tara como o filme em si, relembram aspectos das séries Euphoria e Skins (Imagem: Reprodução)

How to Have Sex está disponível no catálogo da MUBI.

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Graduanda em Jornalismo com síndrome de Lady Bird. Criadora de conteúdo literário no @sohmagio, têm como filosofia de vida as obras da Ai Yazawa. Nas horas vagas, é fã e apreciadora da profundidade nas músicas do My Chemical Romance e da Taylor Swift.
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