Clara Bow: quem foi a atriz que inspirou a nova canção de Taylor Swift?

Clara Bow: quem foi a atriz que inspirou a nova canção de Taylor Swift?

Taylor Swift surpreendeu seus fãs ao anunciar seu novo álbum de estúdio, intitulado The Tortured Poets Department, na noite da premiação do Grammy Awards. O disco, que tem lançamento previsto para o dia 19 de abril, já teve sua tracklist oficial anunciada nas redes sociais da cantora. Entre as canções que compõem o álbum, uma faixa chamou a atenção do público pelo título – a música de encerramento do disco, intitulada Clara Bow.

É certo que todas as canções do novo álbum são aguardadas pelo público com certa expectativa, mas Clara Bow é possivelmente uma das mais antecipadas por fazer referência a uma figura histórica.

No entanto, não é a primeira vez que Taylor escreve uma música que retrata a vida de uma celebridade. No álbum folklore, a história da socialite norte-americana Rebekah Harkness é o tema da canção the last great american dynasty.

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Capa de “The Tortured Poets Department”, novo álbum de Taylor Swift
Capa do álbum “The Tortured Poets Department” | Imagem: divulgação

Na música, Taylor traça um paralelo entre a vida de Rebekah e a sua, ambas repletas de polêmicas, muitas delas associadas a estereótipos sexistas. Tal antecedente leva os fãs a especularem que a faixa Clara Bow abordará temáticas similares.

Se a canção fará comparações entre as jornadas de Taylor Swift e Clara Bow pelo universo da fama, os fãs terão de esperar até 19 de abril para descobrir.

Mas afinal, quem foi a atriz que inspirou a faixa do novo álbum de Taylor?

Clara Bow: fantasias despedaçadas na velha Hollywood

Em retrospectiva, Clara Bow entrou para a história como a primeira “It Girl” de Hollywood. Na verdade, o próprio termo “It Girl” (utilizado para descrever celebridades que conquistam grande favoritismo do público e lançam tendências) só existe por causa dela.

Em 1927, Clara atuou em um filme chamado “It”, pelo qual passou a ser popularmente conhecida. No entanto, os registros de sua vida revelam uma jornada bastante amarga pelo universo da fama.

Clara Bow no pôster do filme "It" (1927)
Clara Bow no pôster do filme “It” (1927) | Imagem: Divulgação
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Tendo enfrentado diversas tragédias familiares durante sua infância, a atriz encontrou no cinema um refúgio para suas angústias.

Clara Bow começou a atuar muito cedo, e ascendeu rapidamente ao estrelato, se tornando um dos nomes mais famosos do cinema mudo nas décadas de 1920 e 1930. Ela atuou em 57 filmes, entre eles “Além do Arco-íris” (1922) e “Asas” (1927), o primeiro vencedor do Oscar de melhor filme da história.

Uma das poucas atrizes que conseguiu fazer a transição do cinema mudo para o cinema falado

No contexto em questão, muitos artistas que faziam sucesso em filmes mudos tiveram suas carreiras destruídas por não conseguirem se adaptar às novas exigências dos estúdios.

Portanto, atores e atrizes perderam o apreço do público, visto que os espectadores haviam construído um imaginário sobre esses artistas e se decepcionaram ao ouvirem suas vozes reais.

Em meio a esse cenário, o brilho de muitas estrelas aparentemente consolidadas se apagou e novas surgiram, mas Clara Bow permaneceu.

O começo de sua queda não foi ocasionado pela falta de talento, e sim por polêmicas relacionadas à sua vida pessoal e amorosa. A artista passou a ser criticada pela sociedade da época por ser considerada “promíscua” demais.”

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Clara Bow foi descartada pela misoginia de Hollywood

Clara Bow era acusada de ser uma mulher “fria”, que preferia se envolver apenas sexualmente com homens, sem cultivar relacionamentos duradouros. Por conta da pressão social da época, a atriz se casou cinco vezes em quatro anos.

Como resultado de tantas polêmicas, a saúde mental da artista foi gravemente afetada. Nos últimos anos de sua carreira, Clara enfrentou problemas relacionados à depressão e ideação suicida, sendo diagnosticada com esquizofrenia mais tarde – diagnóstico que não foi aceito pela atriz, e com o qual alguns biógrafos não concordam, afirmando que Bow nunca apresentou sintomas da doença.

No fim, Clara Bow seria descartada por Hollywood, boicotada pelos estúdios e colegas de trabalho, e morreria esquecida pelo universo da fama. Ela entrou para a história como uma artista extremamente influente, mas seu final de vida foi marcado pela obsolescência.

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Clara Bow
Clara Bow | Imagem: reprodução

O departamento das mulheres torturadas 

A canção de Taylor Swift não é a única menção recente a Clara Bow no universo das artes. A personagem de Margot Robbie no filme “Babylon” (2022) também foi inspirada em Clara. A atriz foi revisitada e reimaginada ao longo dos anos em diversas obras da cultura pop, seja através de menções diretas ou de referências sutis.

Talvez seja inevitável fantasiar a respeito de uma figura histórica tão enigmática como Clara Bow. Sempre exposta ao olhar público e, ao mesmo tempo, com um universo inteiro de subjetividades ignoradas, artistas como ela se tornam espectros de uma Hollywood fantasmagórica, que visitamos com os recursos possíveis, mas ainda assim, sempre terrivelmente distantes da pessoa real por trás da máscara da fama que lhe é imposta.

No entanto, vale questionar o quanto esse distanciamento também não se aplica às celebridades da atualidade. Taylor Swift, em sua vida tão documentada e repleta de registros, está tão distante de nós quanto Clara Bow. E certamente o icônico batom vermelho não é a única similaridade entre as duas.

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Mulheres imorais e homens boêmios

Clara Bow sofreu profundamente os males de um sistema que condenava mulheres e endeusava homens pelo mesmo comportamento. Algumas condutas só são perdoáveis quando aparecem em narrativas masculinas.

A mesma boemia que consagrou alguns homens como ícones de Hollywood, foi para Clara um sinônimo de imoralidade. A liberdade outrora louvável se torna motivo de depreciação.

Quem foi a atriz que inspirou a nova canção de Taylor Swift?
Clara Bow | Imagem: reprodução

É compreensível que Taylor Swift, constantemente criticada por seus relacionamentos românticos, veja um paralelo entre a sua carreira e a de mulheres como Clara Bow, e até mesmo de sua avó, Marjorie Finlay, cantora de ópera cuja vida também foi tema de uma canção de Taylor.

Ao tentar alcançar essas histórias de décadas atrás, ela também cria uma espécie de departamento de mulheres torturadas, que muitas vezes despejam suas angústias na arte.

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Taylor Swift e Clara Bow revelam o quanto a misoginia ainda está presente no universo da fama

Mais do que uma denúncia, essas menções a mulheres do passado que sofreram dificuldades semelhantes às de Taylor, criam uma atmosfera de familiaridade entre esses dilemas e aflições.

Ela pinta um quadro de poetas, atrizes, cantoras, mulheres torturadas, alcançando umas às outras através da história, em uma solidariedade que nós, público feminino, também sentimos por essas artistas e umas pelas outras.

Taylor Swift e Clara Bow revelam o quanto a misoginia ainda está presente no universo da fama
Clara Bow | Imagem: reprodução

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Talvez o refúgio que Taylor encontra nessas histórias de mulheres do passado, por mais trágicas que pareçam ser, seja o mesmo que nós encontramos com nossas artistas favoritas.

Clara Bow, Marjorie Finlay, e até mesmo outras mulheres que marcaram a história, como Virginia Woolf, Sylvia Plath, Clarice Lispector, Carolina Maria de Jesus, mulheres que registraram na arte suas angústias profundas, algumas das quais eram muito próprias da realidade de ser mulher, nos alcançam em uma dor que, mesmo amarga, faz com que a melancolia não pareça tão solitária.

Relembrar histórias trágicas de mulheres que vieram antes de nós é lembrar que podemos usar a arte para transportar nossas subjetividades e coletividades através do tempo, denunciar a violência sem permitir que sejamos definidas por ela, de modo que ser poeta também é uma forma de resistência.

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Formada em Jornalismo. Gosta muito de cinema, literatura e fotografia. Embora ame escrever, é péssima com informações biográficas.
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