Em tempos de feminismo e militâncias virtuais, a expressão “lugar de fala“ já foi usada para calar ou legitimar a fala de alguém, principalmente quando estavam sendo discutidas as pautas do feminismo negro ou o próprio movimento negro em si. Mas, afinal, o que é lugar de fala? De onde vem esse conceito e por que ele é importante enquanto pauta política?
Essas e outras questões são abordadas no livro O que é lugar de fala?, escrito pela filósofa e feminista Djamila Ribeiro, que também é coordenadora e organizadora da série Feminismos Plurais, da qual o livro faz parte. Dentro da mesma série, lançada pela Editora Letramento, sob o selo Justificando, temos outros títulos importantes como “O que é encarceramento em massa?“ e “O que é empoderamento?“.
Escolhemos começar com o feminismo negro para explicitar os principais conceitos e definitivamente romper com a ideia de que não se está discutindo projetos. Ainda é muito comum se dizer que o feminismo negro traz cisões ou separações, quando é justamente o contrário. Ao nomear as opressões de raça, classe e gênero, entende-se a necessidade de não hierarquizar opressões, de não criar, como diz Angela Davis, em ‘Mulheres negras na construção de uma nova utopia’, “primazia de uma opressão em relação a outras”. (Djamila Ribeiro)
O livro, que possui formato de bolso e contém 112 páginas, é escrito com uma didática invejável, visto que trata de temas complexos e, muitas vezes, polêmicos. No entanto, nos dedos hábeis e na escrita afiada de Djamila, tais temas parecem ser mais fáceis do que realmente são. Assim, O que é lugar de fala? surge como um livro disposto a abrir o diálogo, pontuar as coisas e, acima de tudo, somar.
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O racismo patriarcal heteronormativo apostou que não teríamos o que dizer. Perdeu! Somos as filhas e filhos da cultura onde a palavra tem muitos poderes. Com ela, narramos o mundo que vemos e vivemos. Expomos as atrocidades. Mas, através dela, somos vozes orquestradas para mudança. Aprender e ensinar são motores – axé – de luta. E, para você, um convite! (Jurema Werneck)
Em O que é lugar de fala? Djamila honra e respeita a sua ancestralidade, não só lembrando mas citando nomeando aquelas que vieram antes e que construíram as bases do que vem a ser o feminismo negro atual.
Na apresentação do livro e no capítulo “Mulher Negra: o outro do outro” nos são apresentadas reflexões fundamentais para entendermos os capítulos seguintes, que vêm com a proposta de discutir não só o que é o “lugar de fala”, mas também a sua diferença com o que chamamos de representatividade.
Saber o lugar de onde falamos é fundamental para pensarmos as hierarquias, as questões de desigualdade, pobreza, racismo e sexismo. (Roseane Borges)
Ler este livro nos situa não só como pessoas mas como sujeitos políticos. Nos faz perceber que precisamos saber quem somos, de onde viemos e onde estamos ((socialmente e culturalmente) inseridos, não só para questionarmos o status quo, mas para fazermos mudanças significativas na sociedade. Precisamos entender o nosso lugar de fala para pensarmos e repensarmos as estruturas sociais e, quem sabe, construirmos em conjunto uma sociedade mais igualitária.
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*Todas as citações foram retiradas do livro “O que é lugar de fala?”