Imagine um lugar sereno, onde o aroma de café e livros permeia o ambiente, as pessoas são acolhedoras na medida certa, e as discussões são profundas e interessantes. Sem dúvida, existem alguns lugares assim por aí, mas este, em particular, não é um espaço físico, mas sim um livro. Bem-Vindos à Livraria Hynam-Dong, o primeiro romance da escritora sul-coreana Hwang Bo-reum, é uma história feita sob medida para os amantes da leitura.
Guiada por Yeongju, uma mulher recém-divorciada na casa dos trinta, a trama oferece uma leitura fluida e calorosa, perfeita para dias que pedem conforto.
Diferentes personagens são apresentados ao longo dos capítulos, todos conectados por esse lugar-comum e pela proprietária Yeongju. Cada um deles vivencia eventos rotineiros no estabelecimento, sem grandes acontecimentos, mas repleto de reflexões.
A Livraria Hyuna-Dong nasce de um antigo sonho da protagonista. Após sofrer um burnout em seu antigo emprego e se separar do marido, Yeongju vê na abertura da livraria o início de seu processo de cura.
Bem-Vindos à Livraria Hynam-Dong e a forma como encaramos o trabalho
Um tema recorrente na narrativa é a relação dos personagens com o trabalho. A frustração de Yeongju em sua carreira anterior deu origem à livraria, mas não demorou para ela perceber que, apesar de estar realizando um sonho, ser proprietária de um negócio ainda é uma grande responsabilidade.
Inclusive, há um debate sobre como trabalhar com o que se gosta não é garantia de felicidade, ao mesmo tempo em que é possível ter qualquer tipo de emprego e encontrar a felicidade em outros lugares.
Além de Yeongju, que enfrentou dificuldades na vida profissional, Minjun, o barista da livraria, carrega o peso de não saber onde se encaixar. O personagem é apresentado como um jovem que concluiu os estudos e transitou por trabalhos informais desde então, tudo isso com muita insegurança e pressão da família.
Em um dos capítulos, o livro The Refusal of Work: The Theory and Practice of Resistance to Work (em tradução livre: A Recusa ao Trabalho: A Teoria e a Prática da Resistência ao Trabalho), de David Frayne, é o escolhido para um booktalk.
Nele, o autor apresenta o conceito de downshifting, estilo de vida que promove o equilíbrio entre lazer e trabalho. Na discussão ainda é possível ver o assunto do ponto de vista de Mincheon, um adolescente que não sabe o que fazer da vida, e da artesã Jeongseo.
“Agora, vejo o trabalho como uma refeição que preciso fazer todos os dias. A comida que alimeta o meu corpo, meu coração, minha mente e minha alma.
Existe a comida que comemos apressadamente e a que saboreamos com cuidado e atenção. Eu quero me tornar alguém que saboreia a refeição com cuidado e atenção. Quero fazer isso por mim.”
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Hynam-Dong aborda como uma livraria deve ser
Os personagens que atravessam Hynam-Dong estão perdidos em busca de se encontrar, assim como qualquer criança descobrindo o mundo, qualquer adolescente experimentando uma avalanche de sentimentos de uma vez só ou um adulto que repensa toda a trajetória de vida em busca de algo novo.
Todos eles, eventualmente, se acalentam por meio da livraria, seja pelos livros, pelas conversas ou pelo café servido lá. É possível sentir as histórias lidas e compartilhadas impactando a vida dos personagens e a forma como eles enxergam a si e aos outros.
Da sua maneira, cada um descobre que ao ler a dor de alguém, é possível reconhecer um sofrimento que talvez passasse despercebido.
“Os livros que li me levaram fazer as escolhas que fiz ao longo da vida.
Eu não e lembro de todos os livros que li, mas mesmo assim esses livros continuam me influenciando.”
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Desde o início a protagonista se questiona sobre como uma livraria deve ser. Certamente há um padrão que envolva vender livros, mas para ela não basta. Yeongju quer vender e contar histórias que gerem empatia e identificação. Não só identificação por espelhamento, mas por pertencimento.
Apesar de pequeno, Bem-Vindos à Livraria Hynam-Dong é, ao mesmo tempo, um livro para ler gradualmente e para ser processado quando finalizado a leitura. Como a própria autora diz no posfácio, é “uma história de cura que abraça e oferece um ombro amigo para aqueles que se cobram demais na vida e já não sentem mais alegria em viver”.