Até onde vai o amor de um pai por um filho? Por quanto tempo e em quais circunstâncias essas condições se sustentam? Em Menino de Ouro, Clyde Deyalsingh é um pai que tenta ser justo com seus filhos, Peter e Paul. Junto com Joy, a mãe dos meninos, ele cria os dois em meio à violência e à dificuldade em Trinidad e Tobago. No entanto, um dia, Paul sai para uma caminhada e não retorna quando cai a noite. É na instabilidade familiar do sumiço de um jovem de 13 anos que se constrói o livro de Claire Adam, publicado pela editora Todavia no início de 2020 e traduzido por André Czarnobai.
Colocando um pai na corda bamba entre os dois filhos, Menino de Ouro entrega um drama familiar intenso e brutal, mas peca ao exibir-se como thriller.
Semelhantes e diferentes
É em Típaro, na zona rural, que a história do romance vai crescer, assim como os irmãos Deyalsingh. Apesar de serem iguais geneticamente, Peter e Paul não são tão semelhantes nem na aparência. Enquanto o primeiro mantém o cabelo curto, o que combina com a sua personalidade dentro do padrão, o segundo deixa os fios longos e rebeldes.
Peter, portanto, é o pequeno gênio da família, obediente e esforçado. Já Paul é descrito como meio esquisito e “levemente retardado”, tanto por ele quanto por quem o cerca. Fica claro de imediato que essas diferenças entre os meninos reverbera em todos os familiares, mas principalmente em Clyde, quem a narrativa em 3° pessoa acompanha na primeira parte. Com o tempo passando e a preocupação com Paul aumentando, as tensões antes implícitas começam a aparecer.
Após um tempo sem notícias, Clyde sai pelas ruas em busca do “garoto-problema”. No entanto, o que o livro traz de Paul é uma visão bem diferente da que sua família tem dele. Ao não abordar uma patologia que explique sua diferença de Peter, a autora constrói um personagem sensível, preso no seu próprio mundo e constantemente amedrontado devido a crueldade com que é tratado. Tímido, ele parece se encolher ainda mais ao lado do irmão com status de protagonista.
Dinheiro e família em Menino de Ouro
Em sua segunda parte, o romance volta no tempo para o nascimento das crianças. A quebra temporal é necessária em Menino de Ouro para reconstruir a infância dos meninos e abordar dois pontos importantes para a trama: a intensa presença da família de Joy e a dificuldade de viver em Trinidad.
A casa, porém, vive cheia de tios por parte de mãe. A questão financeira é sempre um tópico nessas reuniões, em especial após a morte de um tio de Joy que possuía grande fortuna. Com a não divisão do dinheiro, um dos irmãos da mãe passa a suspeitar que foi Clyde quem recebeu a herança, o que causa certo desconforto.
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Enquanto isso, Claire Adam encarrega-se de localizar o leitor da vida em Trinidad e Tobago. As questões socioeconômicas e a desigualdade ficam cada vez mais em destaque enquanto os gêmeos crescem, assim como a criminalidade e o medo que Clyde tem que seus filhos se envolvam com coisas erradas.
No entanto, próximo ao desaparecimento de Paul, Joy e os garotos são assaltados enquanto Clyde trabalha e uma atitude impensada do filho coloca a mãe na mira do revólver. É mais um artifício utilizado pela autora para evidenciar o plano de fundo da história e que pode ser visto como um prenúncio do que acometerá os Deyalsingh após o sumiço do filho.
O que se espera de um thriller?
Um gênero literário traz consigo uma série de expectativas construídas com base em outras obras que o compõem. Quando um livro é vendido como uma história de suspense, ou um thriller, espera-se mistério, investigações e crimes, o que Menino de Ouro entrega em pequenas doses espaçadas. Com a promessa de “um thriller dos mais eletrizantes”, o romance de Adam cumpre muito pouco em suas duas primeiras partes, concentrando-se muito mais em um drama familiar intenso.
Seus capítulos, portanto, intercalam-se entre partes muito interessantes da dinâmica da família e do crescimento dos irmãos na escola em Port of Spain, com momentos pouco importantes sobre a rotina dos outros personagens. É pouco – ou nada – relevante saber o dia-a-dia de um padre enquanto um menino de 13 anos está sumido numa área onde a violência é crescente. Na terceira e última parte de Menino de Ouro, o foco recai sobre Paul e os elementos de um thriller estão mais presentes. Entretanto, o romance pode já ter perdido seu leitor muito antes disso.
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Menino de Ouro é um livro denso, mas a escolha em defini-lo com um thriller pode ser equivocada. Trazendo uma família embrutecida pelas circunstâncias e um mergulho profundo nos personagens, o livro é chocante pela frieza em muitos momentos, enquanto outros são mornos demais, o que afeta o ritmo da narrativa. Para quem gosta de um drama bem construído, a obra é um prato cheio, mas para aqueles que esperam um pouco mais de ação, pode ser decepcionante.
Menino de Ouro
Autora: Claire Adam
Tradutor: André Czarnobai
272 páginas
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Edição, revisão e arte em destaque por Isabelle Simões.