And In The Darkness Hearts Aglow: a complexidade da existência humana por Weyes Blood

And In The Darkness Hearts Aglow: a complexidade da existência humana por Weyes Blood

Ser humano é uma experiência de descobertas, incertezas e, acima de tudo, esperança. A cantora Natalie Mering, sob o nome artístico Weyes Blood, destaca-se como uma das artistas que melhor explora o tema. Em seu lançamento mais recente, o álbum And In The Darkness, Hearts Aglow, ela eleva o patamar de seu romantismo por meio de mensagens envolventes e uma sonoridade etérea, construindo um projeto digno de exploração.

No mês de novembro, o álbum completou um ano de seu lançamento. Pensado como uma sequência para o disco anterior de Weyes, Titanic Rising (2019), And In The Darkness mantém algumas características estéticas do projeto anterior. A artista já anunciou a promessa de um novo LP para concluir a trilogia.

Capa do álbum "And In The Darkness, Hearts Aglow", de Weyes Blood.
Capa do álbum And In The Darkness, Hearts Aglow, de Weyes Blood.

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Inspirado pelas incertezas trazidas pela pandemia, o álbum de Natalie explora as complexidades da experiência humana. Nesse sentido, a cantora navega de questionamentos internos às grandes indagações da vida, refletindo sobre sua existência em relação aos outros, seja na solidão ou em relacionamentos complexos.

Estar solitária, mas não sozinha

Não sou só eu, é todo mundo“. Weyes Blood inicia And In The Darkness, Hearts Aglow transmitindo, desde o princípio, um profundo sentimento de solidão. Ela se percebe isolada, incapaz de estabelecer relações profundas, e, acima de tudo, não se sente verdadeiramente amada ou compreendida por ninguém.

As mudanças são constantes e desafiadoras, tornando difícil lidar com o acúmulo de novas questões sem perder um pouco de si no processo.

Nós todos nos tornamos estranhos,

até para nós mesmos.

– Trecho de It’s Not Just Me, It’s Everybody.

Natalie Mering e seu coração brilhante em photoshoot do último álbum.
Weyes e seu coração brilhante | Fotografia: Neil Krug

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Apesar disso, Natalie consegue vislumbrar algo maior. As dificuldades não são exclusivas dela: a abrupta mudança na realidade, as incertezas sobre si e sobre o mundo, e, acima de tudo, a esperança, são reflexões compartilhadas por todos os humanos. Assim, ela percebe que, mesmo em sua solidão, não está sozinha em seus sentimentos: uma percepção tanto trágica quanto reconfortante.

A humanidade em constante conflito

Às vezes, observar o mundo ao redor gera desespero. A exploração do ser humano sobre si mesmo e a natureza ao seu redor tem levantado questões cada vez mais evidentes a serem abordadas. Contudo, é desafiador saber por onde começar para consertar um planeta em crise e uma sociedade desigual e injusta.

Com isso em mente, Weyes Blood pede para que as novas gerações trabalhem para promover mudanças positivas. Em Children of the Empire, a cantora ressalta as consequências das atitudes desenfreadas da humanidade no passado, que, com as “eras de ouro do capitalismo”, causaram danos intensos refletidos nos prejuízos atuais.

As crianças entendem que pagam por seus pecados

Assuma o controle do que eles fizeram

Antes que todos nós desapareçamos

Filhos do império querem mudar.

– Trecho de Children of the Empire.

Assim, ela acredita que as gerações mais jovens serão responsáveis por mitigar esse cenário, uma vez que reconhecem o estado atual e possuem o poder de promover mudanças.

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Photoshoot do álbum "Weyes Blood And in the Darkness, Hearts Aglow"
Photoshoot de divulgação do álbum | Fotografia: Neil Krug

Já em The Worst Is Done, Natalie aborda um conflito mais urgente e eminente, refletindo sobre como as mudanças causadas pela pandemia e pelo isolamento a afetaram. De repente, após dois anos intensos de distanciamento social, as pessoas foram obrigadas a retomar suas vidas de onde pararam, sem um manual de instruções.

Eles dizem que o pior já aconteceu,

mas acho que o pior ainda está por vir

Agora, eu ouço isso de todos

Estamos todos tão destruídos depois disso.

– Trecho de The Worst Is Done

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Assim como a adaptação ao digital representou um desafio, o retorno ao presencial exigiu uma nova força, tema que Weyes explora em sua música. Ela se culpa por não ter estado presente com a família e por ter escolhido um estado de isolamento completo, expondo suas dificuldades durante esse período marcante para a humanidade.

Tecnologia versus ser humano

Uma das consequências da pandemia foi a intensificação do uso da tecnologia. Se anteriormente a internet e as conexões online já ameaçavam formar uma realidade distópica e alienada, agora esse cenário parece ainda mais latente, com o uso constante e integrado de novas formas de comunicação.

Com isso em mente, Natalie escreve God, Turn Me Into a Flower, o mais recente videoclipe da era And In The Darkness, dirigido pelo documentarista Adam Curtis.

 

Na música, Weyes Blood se inspira no mito de Narciso, um personagem que, fascinado por seu reflexo, morreu de sede à beira do lago onde se admirava. Aqui, a artista antagoniza a vaidade provocada pelo uso intenso das redes sociais e tecnologias.

Diante de todos esses pensamentos e incertezas, Natalie pede a Deus que lhe conceda o mesmo destino de Narciso: a transformação em uma flor.

Enquanto, na ficção, essa conclusão veio por motivações negativas, na canção, tornar-se uma flor a salvaria da dureza de ser humano. Flores são associadas à delicadeza, o oposto do homem conflituoso desenhado por Weyes ao longo do álbum.

É bom ser suave quando eles te empurram para baixo

Oh, Deus, me transforme em uma flor.

– Trecho de God, Turn Me Into a Flower

A ilusão das almas gêmeas

Os conflitos da artista também se manifestam nos relacionamentos próximos. Parte do álbum explora o amor romântico e as desconexões que podem surgir dentro desse contexto.

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A faixa Grapevine relata uma relação difícil, cheia de nostalgia e sentimentos mal resolvidos. Em uma entrevista para a Rolling Stone, Natalie expressa que “estar apaixonada não significa necessariamente estar junto“, relacionando a canção a amores passados que não foram bem-sucedidos.

Grapevine é um vilarejo estadunidense conectado à estrada interestadual. Weyes Blood compara seu relacionamento a esse lugar, destacando a solidão e o distanciamento entre eles.

Agora somos apenas dois carros de passagem.

– Trecho de Grapevine

Weyes Blood em photoshoot de "Weyes Blood And in the Darkness, Hearts Aglow"
Photoshoot para divulgação do álbum | Fotografia: Neil Krug

Em Twin Flame, a artista retoma a ideia popular de almas gêmeas e a observa com ansiedade, uma vez que ela e seu amor mantêm uma conexão complicada. Natalie se esforça para manter a proximidade, porém, se desaponta a cada vez.

Porque você é minha outra metade

Você é minha outra metade

e você me deixa tão fria

quando você se afasta.

– Trecho de Twin Flame

É na escuridão que os corações brilham

Photoshoot do último álbum de Weyes Blood
Photoshoot para divulgação do álbum | Fotografia: Neil Krug

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Apesar das desconexões e conflitos, And In The Darkness, Hearts Aglow também passeia entre o lado mágico da existência humana.

O álbum se encerra com A Given Thing, que concretiza a visão da cantora sobre as passagens da vida. As relações podem ser simples ou dolorosas, mas, no final das contas, o amor pelo outro ainda é algo divino e precioso.

E eu te quero mais, meu amor, isso pode ser bom o suficiente

É uma coisa dada.

– Trecho de A Given Thing

Weyes Blood entrega, assim, um resumo de incertezas e esperanças sobre a vida. Tal qual Titanic Rising, o disco And In The Darkness, Hearts Aglow ilumina um espaço da música ocupado pelos amantes da poesia, da vida e dos grandes questionamentos, criando uma grande expectativa para o futuro encerramento da trilogia.

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Jornalista/comunicóloga, com amor pela arte e pela escrita. Do fofo ao aterrorizante, falar do que eu gosto é minha maior motivação!
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